As contas portuguesas continuam a não apresentar números nada animadores. A culpa é da pandemia. Os dados mais recentes foram apresentados esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e revelam que a pandemia levou o país a um défice de 5,4% do produto interno bruto (PIB) nos primeiros seis meses deste ano.
Ainda no segundo trimestre, em termos homólogos, foi verificado um aumento de 6,5% da despesa total e uma diminuição de 10,5% da receita total. O gabinete de estatística diz que, no lado da despesa, foi registado um crescimento de 5,8% da despesa corrente, «resultante de acréscimos nas prestações sociais (1,9%), nas despesas com o pessoal (2,6%), nos subsídios pagos (470,2%), traduzindo as medidas excecionais de apoio à atividade económica tomadas no contexto da pandemia covid-19, e na outra despesa corrente (14,1%)».
Já do lado da receita, o comportamento está relacionado com «a diminuição na maior parte das suas rubricas, nomeadamente nos impostos sobre a produção e a importação (-18,7%), nas contribuições sociais (-7,7%), nas vendas (-21,7%) e na outra receita corrente (-18,2%), explicadas pelo impacto negativo da pandemia de covid-19 sobre a economia, tendo os impostos sobre o rendimento e património aumentado 12,6%».
O Ministério das Finanças reagiu aos valores apresentados pelo INE e explica que estes ainda não refletem os efeitos do desconfinamento. «O segundo trimestre de 2020 é, aliás, o primeiro período completo que reflete o efeito da pandemia na atividade económica e nas contas públicas e que incorpora as medidas de combate à pandemia no desempenho da economia nacional. Por outro lado, os meses de abril a junho ainda não refletem a melhoria da atividade económica associada ao desconfinamento».
Agravamento da dívida
No mesmo dia, e com base em informação disponibilizada pelo Ministério das Finanças, o INE revelou também a previsão de um agravamento da dívida portuguesa para 133,8% do PIB. No entanto, este é um valor inferior em 0,6 pontos percentuais ao valor inscrito pelo Governo no Orçamento Suplementar.
Face a estes valores, Francisco Alves lembra que «a situação não está fácil». E defende que, «neste momento, o foco principal é controlar a expansão do coronavírus pois uma segunda vaga seria um cenário assustador para a economia portuguesa. Enquanto Portugal não regressar à normalidade, a dívida irá permanecer nestes valores».
No entanto o analista defende que os dados não são surpresa e já eram «algo previsto» uma vez que «a fragilidade da nossa economia se fez sentir nestes últimos meses».
A opinião é partilhada por Henrique Tomé, analista da corretora XTB. «Todas as economias estão a sofrer com as consequências do impacto que a pandemia trouxe, provocada pela covid-19 e não houve nenhum país que não saísse prejudicado devido às circunstâncias atuais, onde a economia portuguesa não é exceção», diz ao SOL. No entanto, há um ponto que preocupa o analista. «É natural, mas também preocupante que os níveis da dívida soberana estejam tão altos, uma vez que o Estado teve de intervir na economia para que conseguisse atenuar os impactos provocados pela pandemia, e onde tem vindo a ajudar as famílias e a adotar políticas no sentido de continuar a promover o crescimento económico», diz, acrescentando que «devido a este esforço todo, acabámos por nos colocar numa situação em que estamos extremamente alavancados e demasiado expostos, mas estas medidas eram precisas para evitar que a economia parasse na altura onde tivemos grandes restrições».
E a recuperação?
A recuperação pode não ser rápida. Pelo menos é o que defende Henrique Tomé. «Espera-se que a recuperação económica seja mais demorada do que era esperado inicialmente», diz. No entanto, se o número de casos e surtos continuar a aumentar, «poderá haver a necessidade de colocar novas restrições e poderá levar a que exista novamente um maior abrandamento na economia, que desta forma acabará por prejudicar ainda mais o contexto atual».
Quanto a um dos maiores desafios que o Governo terá pela frente, o analista da XTB não tem dúvidas: «Este Governo terá de, nos próximos meses, e em especial para o ministro das Finanças, conseguir equilibrar os níveis de dívida soberana do nosso país, sendo que o papel e a ajuda do Banco central europeu (BCE) será fundamental para ajudar a estabelecer esse equilíbrio», defende.