O Parlamento vai discutir esta tarde a possibilidade de consultar os portugueses sobre a eutanásia. A proposta de referendo resulta de uma iniciativa popular com mais de 95 mil assinaturas e vai ser votada amanhã.
António Pinheiro Torres, um dos promotores da iniciativa, defende que a realização de uma consulta popular é a única forma de evitar que a Assembleia da República possa “decidir sobre um assunto para o qual não pediu mandato à sociedade portuguesa. 81% dos deputados foram eleitos com programas sem qualquer posição sobre a eutanásia”.
Os defensores do referendo argumentam, desde o início, que a eutanásia não constava dos programas eleitorais dos maiores partidos. Só Bloco de Esquerda, PAN, Iniciativa Liberal e Livre incluíram este tema no programa. Para Pinheiro Torres, só o referendo permite saber “se o Parlamento estaria a ir ou não contra a vontade da maioria do povo português”.
A proposta dificilmente será aprovada perante a oposição à realização de um referendo do PS e dos partidos de esquerda. Pinheiro Torres confessa que vai assistir à votação com “uma grande curiosidade sobre o sentido de voto dos deputados do PS porque há uma tradição referendária”. O ex-deputado do PSD acredita que pode haver votos suficientes vindos da bancada socialista para aprovar a proposta. “Não tenho dúvidas de que existirão muitos deputados do PS que concordam com esta proposta de referendo”.
Os deputados socialistas e do PSD vão ter liberdade de voto. A líder parlamentar do PS já assumiu, porém, uma posição contra a realização de uma consulta popular e a expectativa entre os socialistas é que a maioria dos deputados não seja favorável a esta iniciativa.
Esquerda e pan contra
Certos são os votos contra do PCP, PEV, Bloco de Esquerda e PAN. A líder parlamentar do PAN, Inês Sousa Real, considera, em declarações ao i, que esta proposta é “extemporânea”, porque há um processo legislativo em curso. “Não nos parece que matérias de elevada sensibilidade como a vida ou a morte sejam referendáveis”, acrescenta.
Os cinco deputados do CDS e André Ventura, do Chega, vão apoiar a realização de um referendo. Os liberais preferem não antecipar o sentido de voto.
Os passos seguintes
A despenalização da morte assistida foi aprovada, na generalidade, no dia 20 de fevereiro. Foram viabilizados os diplomas do PS, Bloco de Esquerda, PAN, PEV e Iniciativa Liberal.
O projeto de lei dos socialistas prevê a despenalização da morte quando a própria pessoa deseja antecipar a morte “em situação de sofrimento extremo, com lesão definitiva ou doença incurável e fatal”. O pedido pode ser livremente revogado a qualquer momento. Os cinco diplomas aprovados excluem menores de 18 anos e pessoas que sofram de doença mental ou psíquica.
Se a proposta para a realização de um referendo for aprovada é enviada para o Presidente da República que pedirá ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da sua constitucionalidade. Marcelo Rebelo de Sousa, se o Constitucional aprovar, tem a última palavra.
Três referendos
A última vez que houve um referendo foi há 13 anos. Os portugueses foram chamados a decidir sobre a despenalização do aborto.
O “sim” venceu com quase 60% dos votos. Uma consulta popular sobre o mesmo assunto já tinha sido realizada em 1998, mas 50,7% dos eleitores respondeu “não”. Nos dois referendos sobre a interrupção voluntária da gravidez a abstenção foi elevada. Mais de 68% na primeira consulta e quase 57% na segunda.
Os portugueses foram também chamados a decidir sobre a regionalização em 1998. Mais de 60% rejeitaram a criação das regiões administrativa. O número de eleitores que não foi votar voltou a ser elevado. Mais de 51% optou por não participar nesta consulta popular.