“Aqueles que querem tratar da sua vidinha e dos seus negócios não contam comigo”

Líder centrista, Francisco Rodrigues dos Santos, responde aos críticos e garante que está empenhado em ‘salvar’ o CDS. Está disponível para uma aliança pré-eleitoral com o PSD nas legislativas, mas sem Ventura.

“Aqueles que querem tratar da sua vidinha e dos seus negócios não contam comigo”

 

Compreende as críticas que lhe têm sido feitas por assinar um acordo com o Chega?

O CDS teve um resultado histórico nos Açores porque, ao fim de 45 anos, está a governar a Região Autónoma dos Açores. O CDS mostrou-se um partido incontornável e insubstituível para este novo ciclo e conseguiu posicionar-se como terceira força política. Demonstrou que é uma direita que soma, tem um discurso previsível e não anda aos ziguezagues. Não é uma direita destrutiva e fraturante. Espero que estes tempos de mudança cheguem ao Continente e se possa reeditar uma Aliança Democrática que no passado deu provas de êxito e deixou boas memórias. Espero que seja possível estabelecer uma plataforma capaz de derrotar o Partido Socialista e oferecer uma proposta sólida e alternativa.

O CDS está disponível para uma aliança pré-eleitoral nas próximas eleições legislativas ou prefere ir sozinho a eleições?

O CDS está disponível para que se estabeleça uma plataforma de entendimento com as forças políticas de direita. O CDS está disponível para formar uma plataforma eleitoral como a Aliança Democrática para que os votos da direita somem, não subtraiam e possam eleger o maior número de mandatos possível. Para isso é necessário que existam convergências em pontos que são essenciais como, por exemplo, o apoio aos mais vulneráveis, aos idosos, aos jovens…

Mas está disponível para uma aliança pré-eleitoral com o PSD se houver condições…

Há um sentimento geral no país de alguma fadiga com esta governação do Partido Socialista. Cabe aos partidos de direita, como é o caso do CDS e do PSD, entenderem-se no fundamental para apresentar uma proposta política alternativa aos portugueses. Se se entender que esse é o caminho para que o bloco da direita some o maior número de deputados, para que não se desperdicem votos e para que haja um projeto reformista para Portugal, creio que o CDS não dirá que não.

O Chega está fora desse projeto?

Sim. O CDS não fará alianças políticas com o partido Chega. Não fará certamente coligações com o Chega.

Preferia que o Chega tivesse ficado fora do acordo nos Açores?

O CDS não rejeita um voto pela sua origem. Se servir para o CDS aplicar as suas propostas e fazer valer as suas ideias e os seus valores, estamos disponíveis para o receber. Mas não estamos disponíveis para alianças eleitorais com o Chega.

Isso não é contraditório?

Nos Açores não estamos a falar de uma aliança com o Chega. Nós governamos os Açores com o PPM e o PSD. O que aconteceu foi que o partido Chega se mostrou disponível para viabilizar alguns eixos que já estavam nos programas desses partidos.

Essa explicação não convenceu muita gente de direita. O Adolfo Mesquita Nunes, por exemplo, considera que foi um erro.

Convivo bem com as opiniões diversas que existem no nosso partido. O que tenho a dizer é que o resultado do CDS nos Açores é histórico e, pela primeira vez, estamos no Governo. A verdade é esta. O saldo que eu faço é extremamente positivo.

O saldo da sua liderança?

Sim. Uma liderança avalia-se por resultados eleitorais. A minha liderança, juntamente com o Artur Lima, que é meu vice-presidente e presidente do CDS nos Açores, conseguiu um feito inédito que foi chegar ao Governo da Região Autónoma dos Açores. Nós tivemos a maior concorrência de sempre à direita. Quando muitos vaticinavam a nossa morte, o que aconteceu foi que, pela primeira vez na história, o CDS chegou ao Governo e somos a terceira força política. Todo o CDS ficou feliz e comemorou este resultado.

Mesmo há pouco tempo um deputado do CDS dizia que a liderança está a falhar. Como recebe estas críticas vindas de pessoas com responsabilidades no partido?

Nós não temos de concordar todos uns com os outros, mesmo fazendo parte do mesmo partido. Quando um líder jovem assume a liderança de um partido com a história do CDS traz consigo uma promessa de mudança de ideias, de renovação de protagonistas e, normalmente, esbarra com algum atrito daqueles que estão mais instalados. A verdade é que fui eleito presidente do CDS, depois do pior resultado eleitoral de sempre, para salvar o partido, não para tratar da minha vidinha. Estou empenhado na salvação do partido e em realizar uma verdadeira unidade em torno desta liderança.

Mas não está a conseguir unir o partido…

Não será por causa do presidente do CDS que o partido não estará unido em torno da sua afirmação política. Tenho um objetivo que é que o CDS recupere o seu capital de confiança e diga a todos aqueles que procuram o CDS fora dele que não vão encontrá-lo e vão desiludir-se. Continuamos a ser o partido da direita democrática e popular que rejeita experimentalismos, aventureirismos e tem uma proposta sensata e moderada para Portugal. A moderação em política permite a mudança evitando as ruturas, e os valores da democracia cristã continuam vivos no partido e têm grande atualidade.

Chegou à liderança numa altura muito difícil e em que muita gente com peso no CDS não quis assumir responsabilidades. Sente que estão a minar-lhe o caminho?

Quando fui eleito presidente do CDS disse isto: não somos nós que escolhemos as nossas circunstâncias, são elas que nos escolhem a nós. Estudei no Colégio Militar e havia um artigo do código de honra que nos dizia para praticar a camaradagem sem denúncia nem cumplicidade. Pratico esse mandamento todos os dias como líder do CDS. Fui eleito para salvar o partido, juntamente com a minha direção, e para unir todos em torno desse desígnio, não para provocar fraturas. Estou empenhado em que todos aqueles que têm amor à camisola, sentido de missão e estão na política com sentido cívico e com altruísmo tenham lugar para trabalhar no CDS. Aqueles que querem tratar da sua vidinha e dos seus negócios, fazer uma política de interesses ou de manutenção do statu quo mesmo que isso não sirva os interesses do partido, não contam comigo. Foi esta a proposta que submeti a congresso e foi sufragada com mais de 65% dos votos no congresso mais participado da história do CDS. Não só tenho legitimidade como tenho autoridade democrática. Não vou estar a infligir golpes no meu próprio partido, vou, sim, preocupar-me em falar para os portugueses dando a imagem de um CDS renovado, moderno e que consegue responder aos desafios que se colocam. É isso que importa. É dar uma razão para as pessoas votarem no CDS. Esse é o caminho que estou a fazer.

Não se assusta quando as sondagens dão o CDS quase a desaparecer?

Essa é uma questão pertinente porque as críticas sobre sondagens são sempre muito seletivas. Temos sondagens feitas por várias entidades que nos dão 1, 2, 3, 4 e até 5%. Este último resultado de 4,4 e de 5% é superior ao resultado que tivemos nas últimas legislativas. Muitas sondagens são feitas em Portugal para condicionar intenções de voto. São fabricadas. Errar uma vez é humano, errar várias vezes é má-fé. Nos Açores tivemos quase seis vezes mais. Estas sondagens vão falsificando perceções e penalizam o CDS. As sondagens vaticinaram sempre o fim do CDS, mas nós não somos contagiados por elas. Não exerço a minha liderança com base em sondagens, mas com base em resultados eleitorais.

Há aqui um problema novo para o CDS que é o aparecimento do Chega e da Iniciativa Liberal…

Esses dois partidos concorrem diretamente com o CDS, mas a verdade é que a primeira vez que o CDS enfrentou eleitoralmente esses partidos, no auge da sua força política, foi nos Açores e manteve o estatuto de terceira força política. As notícias sobre a morte do CDS foram manifestamente exageradas.

Está convencido de que no Continente vai acontecer o mesmo?

Estou totalmente convencido disso. Os portugueses, na hora da verdade, vão reconhecer que o CDS é um partido moderado e de Governo, mas intransigente nos seus valores. Não é um epifenómeno. É um partido com história, que não faz conversas de café, mas que não ignora as preocupações do cidadão comum. Mas não é com um estalar de dedos que se recupera um partido que estava muito delapidado. É um caminho gradual e com muita humildade. Estamos a fazer um caminho e ‘enquanto houver estrada para andar, a gente vai continuar’, como diz o Jorge Palma. Ou, como dizia Winston Churchill, ‘o fracasso não é eterno, o sucesso não é definitivo, o que conta é coragem para continuar’. Creio que estamos no bom caminho.

Há pouco tempo disse que ‘há muita gente à direita que prefere os salões do Bairro Alto e do Príncipe Real em vez de querer corresponder a uma vocação de mudança’. Gostava que essas pessoas se envolvessem mais?

Gostava que a direita pudesse concentrar-se mais naquilo que a une e que a diferencia do socialismo do que propriamente em fazer jogos de espelhos à procura das diferenças que existem entre si. Existem várias direitas e federá-las é um exercício de um elevado grau de dificuldade, mas esse é o grande desafio. É conseguir compreender que as correntes mais conservadoras e as mais liberais têm interesses que são partilhados, como a emancipação do homem face ao Estado, a liberdade de cada um gerir o seu projeto de vida, defender as suas tradições e a sua cultura sem complexos, amar o seu país sem anacronismos, promover políticas de apoio à família…

O eleitorado já não está zangado com a direita por causa das políticas de austeridade?

Os portugueses nunca estiveram zangados com a direita. O que aconteceu, como em alguns relacionamentos, é que se deu um tempo para clarificar sentimentos e fazer balanços com o devido distanciamento temporal. A memória é uma qualidade essencial na política. A direita unida venceu as eleições em 2015 e depois gerou-se uma maioria parlamentar que permitiu ao PS governar. Mas a verdade é que, depois desses anos em que tivemos de resgatar a soberania e a liberdade, com sacrifícios e esforços muitas vezes desumanos, a missão foi bem-sucedida. Os portugueses compreenderam aquele período difícil. Um dos problemas da direita, historicamente, é que é sempre chamada a governar em tempos de aflição. A direita consegue arrumar a casa e depois vem a esquerda fazer a festa.

Este Orçamento do Estado foi aprovado apenas com os votos a favor do Partido Socialista. O PCP e o_PAN abstiveram-se e o Bloco de Esquerda, pela primeira vez, votou contra. É um sinal de que esta legislatura pode não chegar ao fim?

Este Orçamento é o canto do cisne. Os compagnons de route do Partido Socialista desertaram numa altura de emergência e de uma grave crise sanitária. O Bloco de Esquerda desertou e o PCP assobiou para o lado, fingindo que não estava a fazer aquilo que realmente aconteceu. Parece-me evidente que este Governo ficou preso por arames entre o radicalismo animalista do PAN e o radicalismo comunista do PCP. É, de facto, uma situação de instabilidade política.

Isso vai facilitar a vida à direita?

O que exige à direita, ao PSD e ao CDS, é ter a capacidade de assumir compromissos sérios e oferecer uma alternativa aos eleitores. Neste Orçamento, o CDS apresentou propostas que não foram aprovadas por preconceito ideológico. Este Orçamento continua a escravizar a classe média. Não temos um único incentivo à criação de riqueza, à iniciativa privada e à captação de investimentos. Limitamo-nos a distribuir uma riqueza que não existe.

Os últimos Governos a que o CDS pertenceu aumentaram os impostos. Se voltar ao Governo vai baixar os impostos?

Precisamos de um choque fiscal em Portugal para que trabalhar compense e para que as empresas sintam que podem investir em Portugal. A direita quer dar mais liberdade às pessoas, baixar impostos, apoiar os idosos mais vulneráveis e dar condições aos jovens. Os jovens devem ter impostos mais baixos no seu primeiro emprego. Um jovem em Portugal, hoje, tem todas as suas expetativas goradas. É por isso que há uma fuga de talentos para o estrangeiro. O nosso elevador social está completamente avariado. Os jovens investiram na sua formação, mas não têm retorno. Vivem até cada vez mais tarde em casa dos pais porque não têm um emprego com uma remuneração justa e não conseguem uma habitação condigna. Apresentámos propostas neste Orçamento para as novas gerações, para os empresários, mas também para os nossos idosos e para as nossas forças de segurança.

Era desejável que houvesse uma clarificação e as eleições fossem antecipadas?

O que é exigível é termos um Governo competente que consiga planear uma resposta à pandemia atempadamente.

Mas acredita que há condições para a legislatura chegar ao fim ou prevê eleições antecipadas?

Essa é uma pergunta que tem de fazer ao primeiro-ministro. António Costa deve avaliar se tem condições de governabilidade até ao final da legislatura. Corre o risco de ficar solitário e isolado, mas isso é a fatura das escolhas do próprio Partido Socialista. Só espero que poupe os portugueses a mais danos devido ao desnorte e à falta de suporte parlamentar. Mais de metade dos portugueses já não confiam nas medidas deste Governo. Há uma fadiga muito grande. Dou-lhe o exemplo do congresso do PCP. Isto é uma vergonha e uma total ausência de respeito pelos portugueses, que estão a fazer sacrifícios. Quando os portugueses acham que os políticos são uma casta à parte revoltam-se e insurgem-se.

O CDS apoia estas restrições, apesar de não ter votado favoravelmente a renovação do estado de emergência?

Achamos que muitas delas não estão a ser eficazes. O esforço de contenção não está a ser bem feito porque as medidas não estão a revelar eficácia. O Governo falha na eficácia das medidas e comunica de uma forma verdadeiramente incompreensível. Está desnorteado. Perdeu a confiança dos portugueses. A abstenção do CDS é um sinal de que não estamos disponíveis para passar mais cheques em branco ao Governo. Estamos ao lado do Presidente da República na necessidade de haver um estado de emergência para aplicar medidas que permitam conter a curva de contágios. Estamos ao lado do Presidente da República sobre a necessidade do estado de emergência, mas não estamos ao lado de um Governo que oculta da oposição as medidas que vai tomar. A nossa abstenção é, em primeiro lugar, um ato solene de protesto com a falta de transparência do Governo no diálogo com a oposição. E, depois, um protesto perante a falta de planeamento. O plano de vacinação talvez seja o sinal exterior mais grave do desnorte deste Governo.

O primeiro-ministro já garantiu que não vai haver falhas…

Este Governo é péssimo na adversidade. Não sabe gerir crises. Foi assim em Pedrógão, em Tancos, em Reguengos de Monsaraz, e está a ser, agora, também com a pandemia. Nós exigimos um plano de vacinação porque um cidadão português não é menos do que um cidadão alemão. A Alemanha, que é a democrata cristã mais consolidada do mundo, sabe com exatidão o que vai acontecer. Portugal ainda não sabe nada e continuamos com a propaganda e com um discurso balofo e pífio.

O líder parlamentar do CDS, Telmo Correia, assumiu que preferia votar a favor da renovação do estado de emergência…

A direção do partido emitiu um sentido de voto e ele foi respeitado no Parlamento. Todos reconhecemos que não há varinhas mágicas e também somos sensíveis ao facto de existirem diferentes soluções para abordar esta pandemia.

Não é a primeira vez que são públicas as divergências entre a direção do partido e a liderança do grupo parlamentar. O Francisco Rodrigues dos Santos discordou de que os políticos com responsabilidades pudessem apoiar um presidente de um clube de futebol quando o líder parlamentar do CDS integrava a comissão de honra da candidatura de Luís Filipe Menezes. Há um mal-estar entre a direção e o grupo parlamentar?

Não tenho nenhum problema com o líder parlamentar do CDS. Acho que é uma pessoa respeitável, um dos melhores tribunos do Parlamento, e alguém que espero colabore ativamente e de forma leal com esta direção para colocar o CDS na rota do crescimento e da relevância política que merece.