Otexto publicado há oito dias nesta página sobre ‘as mulheres da minha geração’ (era assim mesmo que se chamava) teve inúmeros comentários. Sobretudo de mulheres. Já tenho sido apelidado de ‘machista’, dadas as minhas posições contra o feminismo radical, mas também recebo com frequência emails de leitoras que se identificam com o que escrevo. E há anos, na apresentação de um livro, ouvi um elogio que nunca mais esqueci de uma senhora dos seus quarenta anos: «O senhor é o escritor português que percebe melhor as mulheres».
Não sei se será verdade. Mas lá que me esforço, esforço.
No final da vida, o meu pai dizia-me: «Apesar de ter levado grande parte do meu tempo a tentar perceber o mundo e as pessoas, houve uma coisa que nunca percebi: as mulheres».
Julgo que compreendi o que queria dizer. E também por isso tento perceber as mulheres e escrever sobre elas. São mais de metade da humanidade! E a uma conclusão pelo menos cheguei: ao contrário do que as feministas dizem, as mulheres são muito diferentes dos homens.
Reproduzo a seguir, com pequenos arranjos, o email de uma leitora enviado a propósito do dito texto.
Hoje, enquanto folheava o b,i, encontrei um artigo seu que, mais uma vez, foi muito especial para mim.
Partilhei com amigas e amigos.
Sei que todos eles se identificaram com o que escreveu.
As mulheres da minha geração estão no limbo entre as filhas e as netas das da sua.
Elas têm imensas oportunidades (?), vivem sem tabus, rompem barreiras.
Por outro lado, não conhecem bem o conceito de intimidade e de compromisso.
Podem fazer tudo e até podem não fazer nada. Mas o que elas não podem mesmo fazer, mas teimam em tentar, é negar a convulsão que muitas das suas opções de vida causam na vida de terceiros – nomeadamente, dos maridos e dos filhos.
Será que o tempo vai provar que a ruptura da família ‘normal’ não foi uma ideia brilhante e que o feminismo que elas apregoam com orgulho não é outra coisa senão um conceito traiçoeiro, uma versão feminina do indesejável machismo?
Eu abraço-me firmemente à convicção de que sim. Que o feminismo acabará por criar desgaste. Que o equilíbrio tenderá a ser reposto, na medida do possível. Que há-de haver um momento em que, contas feitas, se concluirá que o saldo não foi positivo. E mais e mais mulheres vão começar a fazer essas contas.
Acredito também que é um saldo difícil de reverter. Bem sei que nem todas as mulheres, mesmo que queiram, podem deixar de trabalhar. Ou trabalhar menos. Ou ter empregos compatíveis com uma vida familiar harmoniosa.
A sociedade, o mercado de trabalho e a economia moldaram-se à tal euforia, e as condicionantes criadas por esse facto são limitantes para quem quer ir no sentido inverso: I’ve been there. I’ve done that. I still do.
Tenho 33 anos. Sou casada, tenho filhos, sou licenciada e deixei uma possível carreira estável para cuidar dos meus filhos. Já conto mais de uma década deste propósito. E, se me permite confidenciar, nada me faria sentir mais preenchida. Parece um lugar comum? Antes (ainda) fosse.
É uma malfadada euforia esta ‘coisa’ que se apodera das mulheres que correm para longe dos seus compromissos: a família que decidiram criar, o marido e os filhos.
O impacto nas crianças é tremendo. As possíveis novas relações destes casais vão ser assombradas em muitas situações por essas decisões. E assim se ‘desengonça’ uma sociedade.
No que diz respeito à ‘mini-sociedade’ da qual sou cofundadora, co-gestora e cooperadora, tento que seja o mais imune possível à (des)conjuntura que anda por aí, e que todos achem que a vida em família tem muito valor e vale muitíssimo a pena!
Gostaria de salvaguardar que não acho que a mulher deva ser infeliz ou desconsiderada. Nem o homem. Mulheres e homens têm igual dignidade.
Mas sabemos que a questão não é essa.
A maioria dos maridos não trata mal as mulheres no sentido monstruoso que querem fazer parecer, na tentativa de justificarem posições de repúdio. Há, sim, homens que correspondem menos bem às expectativas das mulheres em determinados aspectos. E vice-versa.
Mas amar alguém também é uma escolha. É também um compromisso – e, para quem fica para ver, poderá vir a ser muito compensador. Seja esse amor dirigido ao marido ou aos filhos.
Tudo isto para lhe dizer, de forma muito humilde, que eu poderia certificar com a minha vida muito do que li no seu artigo. E por isso foi tão especial para mim. Eu não sou uma mulher da sua geração. Mas também não queria ter sido.
Neste caso, preferia ter sido uma mulher da geração anterior à sua…
Agradeço pelos artigos que se dedica a escrever.
Faço votos para que continue. Que deles venha muita satisfação e reflexões por parte de quem os lê.
Um grande bem-haja pelo seu trabalho».
Resta-me a mim agradecer a esta leitora o seu testemunho e desejar-lhe as maiores felicidades. Bem merece!