Sócrates critica reações de Costa e Marcelo à morte de Ihor Homeniuk e fala em “problema de cultura política”

O antigo primeiro-ministro e líder socialista considera “triste” um Governo PS ser acusado de desvalorizar um caso grave de violência policial.

José Sócrates criticou, num artigo publicado na revista brasileira Carta Capital, as reações do primeiro-ministro e do Presidente da República à morte do ucraniano Ihor Homenyuk nas instalações do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), no aeroporto de Lisboa.

Sócrates lembra que Ihor Homeniuk aterrou no Aeroporto de Lisboa a 10 de março, e que foi levado pelo SEF para uma sala onde, "depois de várias peripécias, foi amarrado, espancado e onde viria a morrer".

"Nesse período de cerca de cinquenta e sete horas em que esteve detido em território português não teve acesso a um tradutor, nem a advogado, nem foi presente a um juiz como impõe a Constituição da República. Nas horas seguintes a certidão de óbito foi falsificada, a morte foi dada como natural e o assassinato foi encoberto", lê-se.

O ex-primeiro-ministro refere que "o tenebroso assunto foi mantido a custo no espaço público por algumas jornalistas da imprensa escrita – o resto, a indústria televisiva que domina a agenda política e que, na prática, decide o que existe e não existe, não viu no caso motivo de indignação, com a virtuosa exceção de uma delas que deu a notícia".

É então que Sócrates critica António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa. "O primeiro-ministro e o Presidente da República apesar de este último aparecer todos os dias na televisão não se sabendo se a distribuir afetos ao povo ou se a pedi-los, também não sentiram necessidade de se referirem ao desonroso assunto, para além de breves considerações de circunstância no momento em que o crime foi revelado", critica, destacando que é "triste ver um Governo socialista acusado de desvalorizar um grave caso de violência policial em que um cidadão estrangeiro acaba assassinado".

"Mais do que a cultura de uma qualquer instituição policial, o que está em causa é um problema de cultura política", considera.

O antigo líder do PS destaca ainda que o que aconteceu no aeroporto de Lisboa "não é, ou não é apenas, um infortúnio, um incidente trágico e isolado – ele é um sinal claro de uma obscena mudança na cultura política europeia e que tem reflexos nas culturas internas das policias".

Mas Sócrates não fica por aqui e critica também as declarações do diretor nacional da PSP, Magina da Silva, depois de ter sido recebido por Marcelo Rebelo de Sousa, no último domingo.

"O que mais me impressionou na sua estudada e bem preparada declaração foi o ponto prévio em que afirmou que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é uma boa polícia e tem excelentes profissionais. Nem uma palavra para condenar o assassinato, nem uma palavra para apresentar condolências à família, nem uma palavra para lamentar o dano que o caso causa ao Estado. Fico com a impressão de que a declaração do chefe da polícia foi feita com o único propósito de afirmar uma certa cultura de autoridade policial", remata.