Ana Gomes e Vitorino Silva protagonizaram o último debate presidencial desta quarta-feira, transmitido na RTP3.
A ex-eurodeputada deu início ao duelo. Depois de elogiar o adversário, que foi autarca, destacando que “os autarcas são muito importantes para fazer chegar a ajuda a quem mais precisa”, Ana Gomes começou por falar sobre o estado de emergência e uma possível “banalização”.
“Eu tenho criticado o estado de emergência porque considero que não se pode banalizar o arco legal para essas medidas. Já houve tempo para fazer uma lei de emergência sanitária”, disse, defendendo que o estado de emergência é excecional. “É preciso uma lei que colmate as insuficiências da lei de Bases da Saúde e dê a cobertura legal para as medidas sanitárias, não são as medidas que estão em causa”, disse, frisando que “não tem nada contra as medidas”.
“Apelo às pessoas que cumpram as medidas do estado de emergência”, “Os cidadãos têm de cooperar na aplicação das medidas”, reiterou.
Já Vitorino Silva começou a sua intervenção defendendo que “as eleições deviam ter sido adiadas”.
“Se o adversário é a abstenção porque marcaram as eleições para janeiro?”, questionou o líder do partido Reagir – Incluir – Reciclar (RIR), defendendo que vivemos tempos em que devemos “ser mais duros”, numa referência às medidas para combater a pandemia da covid-19.
Em resposta a Vitorino Silva, Ana Gomes admitiu que a questão do adiamento das eleições se podia ter colocado mais cedo, tendo e conta que o anúncio da data das eleições foi “tardio”, do ponto de vista da ex-eurodeputada.
Sobre as medidas, Ana Gomes reconhece que “há coisas que se podem melhorar, como evitar que as pessoas se concentrem todas no supermercado de manhã”.
Num debate, que se assemelhou mais a uma conversa amigável, Ana Gomes confessou ainda que “teve pena” que Vitorino, mais conhecido por Tino de Rans, tivesse saído do PS. “Tenho pena que o Vitorino tenha saído do PS porque é um lutador pela democracia, e acho que estas lutas têm de ser feitas nos partidos e o PS é um grande partido”, disse.
Por sua vez, o candidato, considerou que “nos partidos as pessoas gostam de se encostar”. “Eu gosto de me desencostar”, afirmou, falando ainda no processo de recolha de assinaturas.
“As minhas assinaturas foram conseguidas pela força da minha voz”, afirmou. O candidato a Belém acusou ainda os políticos de “afastarem” os emigrantes e defendeu “condições” para que estes possam votar.
“Os emigrantes são mais portugueses do que nós”, disse.
Vitorino Silva falou ainda sobre a geringonça, modelo que admite não ter gostado. Tanto da geringonça que uniu o PS e os partidos mais à esquerda em Portugal continental, como a mais recente geringonça de direita nos Açores.
“PS e PSD ficaram mal na fotografia”, considerou. “Não concordei nem com um nem com outro”, acrescentou.
Uma opinião que não foi partilhada por Ana Gomes, que frisou que acreditou “na geringonça desde o primeiro momento”. “Estávamos no tempo da ditadura da TINA (There Is No Alternative), e eu acredito mais no Tino. Na TINA não acredito”, disse.
Ana Gomes defendeu ainda que as políticas da geringonça demonstraram que havia alternativa.
“Não podemos continuar com empregos com baixos salários”, disse, defendendo ainda que os fundos europeus que o país vai receber são uma forma de tirar o país “da cepa torta”.
“Há uma oportunidade de viragem com os fundos europeus se nos soubermos reorganizar”, disse.
Além de defender uma política de proximidade, em que “o poder local tome as decisões e haja controlo democrático”, Ana Gomes considera ainda que “o Estado deve ser magro onde tem de ser e forte onde tem de ser”. “Nós não podemos aceitar que haja zonas do país despovoadas, temos de combater o declínio demográfico”, defendeu.
“E para isso há uma oportunidade com os fundos, mas precisamos de ter políticas que corrijam estas assimetrias”, afirmou.
Já Tino de Rans disse que se fosse Presidente “mudava o Palácio de Belém para Mogadouro ou Penela”, disse, mudando depois o seu discurso para os lesados do BES.
“Tanto dinheiro que veio e as pessoas ainda não receberam?”, questionou, falando depois no “dinheiro que é mal gasto”.
Ana Gomes esteve de acordo. “Há dinheiro, sim, não digam que não há, é preciso é ir buscá-lo onde ele está: nos off shores”, afirmou.
“A questão é distribuir bem o dinheiro dos que pagam, hoje há muita gente que não paga impostos em Portugal”, disse a socialista, que falou depois num estudo que concluiu que Portugal perde mil milhões por ano para as offshores, referindo-se às multinacionais e às famílias mais ricas. “Isto está mal, não pode continuar assim”, considerou. Por outro lado, a Comissão Europeia diz que as pequenas e médias empresas pagam na UE em média 30% mais de impostos.
“Isto tem falhado na governação do país e na governação da UE. A bazuca vai ter de ser paga, por quem? Pelas transações financeiras que não pagam impostos, pelas grandes empresas como a Google, a Amazon, que não pagam impostos sobre os lucros, ou as grandes indústrias poluentes”, considerou.
Tino de Rans aproveitou a referência de Ana Gomes ao clima para dizer que nunca viu “nenhum político a processar a Natureza”. “Não podemos deixar faturas para pagar”, defendeu ainda, em referência ao tema.
“Se fosse comentador e tivesse metade do seu palco a minha causa era a violência doméstica”, atirou, levando Ana Gomes a dizer que faria dessa causa uma bandeira enquanto Presidente feminina, tal como a questão da paridade.
Questionada sobre a polémica na qual esteve envolvida, relacionada com a vacina da gripe, Ana Gomes garantiu que faria tudo da mesma forma. “Não tirei vacina a ninguém”, disse.
Vitorino Silva encerrou o debate com uma resposta à pergunta: "Qual é a pessoa mais conhecida que o apoia?".
“Sou assessorado pelo povo”, respondeu.
O candidato lembrou que é calceteiro e acredita que um dia poderá mesmo haver em Portugal um Presidente que foi calceteiro. No fim, comparou-se à Rainha Isabel II.
“Não sei se já viu ‘A Coroa’, aquela série inglesa?”, começou por dizer. “A rainha de Inglaterra está 70 anos no poder, não tem o nono ano, não tem o sexto, foi mecânica na II Guerra Mundial… E em Portugal havia um Presidente da República calceteiro”, rematou.