“Consenso generalizado” para adotar medidas restritivas o mais rapidamente. Ponto de divergência: se as escolas devem manter-se ou não abertas para alunos mais velhos, a partir dos 12 anos. No final da reunião no Infarmed, e depois do debate à porta fechada com os peritos, desta vez foi o primeiro-ministro a tomar a palavra e não Marcelo Rebelo de Sousa, que acompanhou a reunião por videoconferência. António Costa confirmou a necessidade do confinamento avançando que será de pelo menos um mês, mas deixando a expectativa de poder começar a aligeirar medidas na segunda quinzena. A “divergência mais viva”, apontou, foram as escolas. À falta de consenso entre peritos, a decisão será “política”, adiantou, salientando no entanto que houve consenso de que não há motivo para encerrar as escolas até aos 12 anos e que as escolas em si sejam o problema, mas a movimentação de alunos. Sobre qual o futuro dos alunos mais velhos nas próximas semanas, se vão para casa ou continuam com aulas presenciais, o PR começou ontem a ouvir os partidos e o Governo ouve associações de pais e diretores. A decisão fica de qualquer forma fechada esta quarta-feira, mantendo-se o cenário de confinamento a partir de quinta-feira.
O efeito do Natal e a curva enorme para esmagar
Com apresentações mais sucintas do que nas últimas edições, e entre o retrato da situação atual – má –, as intervenções iniciais dividiram-se entre balanços do que “correu mal” em dezembro aos cenários sobre o confinamento mais ou menos restritivo. Baltazar Nunes, do Instituto Ricardo Jorge, sublinhou que não é claro que medidas funcionam melhor mesmo nos outros países, com a Irlanda, que confinou antes do Natal, a registar agora das piores situações epidemiológicas a nível europeu. Salientou no entanto que a análise feita no INSA sugere que o confinamento aos fins de semana nos concelhos de risco funcionou para baixar a incidência. Depois disso, Portugal foi dos países europeus com maior mobilidade nos dias antes do Natal e antes do Ano Novo, isto segundo a análise da mobilidade da Google e em particular no setor de lazer e comércio. Poderá estar aqui uma explicação. Manuel Carmo Gomes apresentou outra estimativa: com menos testes feitos em dezembro, menor procura de testes também, terão ficado por apanhar cerca de 5000 casos de covid-19 entre pessoas (assintomáticas ou com sintomas) que noutras alturas seriam detetadas. E ao aumentarem os contactos, precipitaram cadeias de transmissão.
Quanto ao confinamento, na parte transmitida ao público não se assistiu à divergência que se tornou mais clara no debate. A modelação do Instituto Ricardo Jorge, feita em colaboração com a Universidade de Trás-os-Montes, sugere que um confinamento de um mês como em março e abril mas mantendo as aulas presenciais pode ser suficiente para voltar a colocar o R abaixo de 1, onde chegou a estar antes do Natal. Será no entanto mais eficaz e rápido com as escolas fechadas.
Já Manuel Carmo Gomes apontou que mesmo com confinamento a redução de casos para o patamar antes do Natal pode levar, agora à luz dos últimos dados, oito semanas. O que parece um pouco incompatível com a ideia de ser possível aligeirar medidas dentro de duas semanas, pelo menos a esta altura. Na projeção feita pela FCUL, já contando com o efeito de um confinamento como o de março e abril, a epidemia começa agora a desacelerar e em duas semanas atinge-se um pico, com uma média diária de 14 mil casos – sem travão, podiam chegar aos 37 mil casos diários no final do mês, estimaram ontem. Depois são três semanas para reduzir de 14 mil para 7 mil casos diários – o que será já a primeira quinzena de fevereiro. E o primeiro mês de confinamento. E depois estimam três semanas para voltar ao nível de contágios anterior ao Natal, de cerca de 3500 casos/dia. Uma das conclusões no entanto foi de que o confinamento ao fim de semana funcionou – o que deixou em aberto essa solução para o futuro desconfinamento, enquanto se espera a cobertura vacinal dos grupos mais vulneráveis, que antes do segundo trimestre não deve avançar para a segunda fase, onde são abrangidos os idosos. O epidemiologista Henrique Barros, menos favorável ao confinamento, salientou que os cenários apresentados para o efeito do confinamento não são diferentes do resultado conseguido com o recolher obrigatório ao fim de semana e defendeu que o efeito do Natal e fim de Ano na multiplicação de contágios foi isolado. Contrariou também a ideia de encerramento das escolas. “As idades escolares não são a locomotiva da epidemia”, disse, explicando que a preocupação maior devem ser os idosos, “a locomotiva das mortes e pessoas que já estão naturalmente confinadas” e defendendo a necessidade de testar mais.
Preparar para pelo menos 700 doentes em UCI
Na reunião acabou por não haver qualquer apresentação sobre a situação nos hospitais, onde os médicos têm denunciado uma situação de rutura, e onde se colocará a maior pressão. Carmo Gomes disse que, mesmo com o confinamento, dificilmente se evitará passar os 700 doentes em cuidados intensivos – que esta quarta-feira já serão mais de 600. Os números dos próximos dias darão uma maior dimensão da onda, que na última semana se começou a perceber precisamente na quarta-feira. O número de mortes vai continuar a aumentar ao longo do mês.