Eu voto. ‘Os políticos não falam para os jovens’

Ainda que 35% dos jovens, entre os 18 e os 24 anos, declarem que não pretendem votar nestas eleições, Vasco Galhardo Simões, de 25 anos, não desiste de ‘aproximar a política ao máximo das pessoas’.

A previsão da participação dos eleitores jovens, entre os 18 e os 24 anos, nestas eleições presidenciais, é tudo menos animadora. Segundo a mais recente sondagem do ISCTE/ICS, relativa aos meses de novembro e dezembro de 2020, 35% dos inquiridos que se inserem naquela faixa etária afirmaram que não pretendiam votar, tendo 18% respondido que ainda não sabiam como votariam. No relatório deste estudo é possível ler que «o que distingue os eleitores mais jovens é a propensão para responder que não votariam nesta eleição». Foi este panorama que o projeto Eu Voto pretendeu modificar.

 

Dar o primeiro passo

«Eu não sei bem ao certo quando me surgiu a ideia, mas considero-me uma pessoa interessada e bem informada nesta área», começou por explicar Vasco Galhardo Simões, jovem de 25 anos licenciado em Relações Internacionais e Política pela Kingston University, em Londres.

«Fui percebendo que, no meu grupo de amigos, ninguém sabia nada sobre esta parte tão importante da nossa vida em sociedade. E, como a abstenção vai subindo à medida que o tempo passa, principalmente entre os mais novos, decidi tomar uma atitude», referiu o rapaz, que se juntou a Diogo Marques, mestre em Ciências da Comunicação, de 29 anos, para promover os sete candidatos a Belém «de forma igual e imparcial».

Para arrancar com o projeto, Vasco e Diogo contaram com o apoio da Comissão Nacional de Eleições – «é o nosso único apoio monetário e agradeço o facto de terem confiado em nós, até porque somos o primeiro projeto digital apoiado por este órgão» –, da Comunidade Cultura e Arte – «tivemos de construir um site, desenvolver o design e os conteúdos da melhor forma possível, assim como tentar que chegassem ao nosso público-alvo com eficácia e uma mensagem coesa e forte» – e da Comissão Nacional de Juventude – «a repercussão das nossas publicações torna-se completamente distinta».

 

A importância da comunicação

Na ótica de Vasco, «os políticos não falam para os jovens porque sabem que estes não votam e não se importam, não se dão ao trabalho de falar nos seus problemas e de explorar os mesmos». Por este motivo, o Eu Voto constitui uma plataforma que agrega perfis de todos os candidatos que concorrem às eleições deste domingo, sendo fundamental contribuir para a «fortificação das interações entre os eleitores e a política».

«A comunicação do Governo tende a ser cinzenta e pouco apelativa. Nas redes sociais conta muito a maneira como se chega a quem nos lê», explicou, adiantando que, para inverter este facto, pretendeu «tornar as coisas mais coloridas, com texto simples e linguagem descomplicada, tratando os jovens por tu, sem palavras caras, como se fossem nossos amigos».

E parece que a estratégia do aspirante a produtor de audiovisuais está a ser frutífera pois, em dois meses, o @euvoto.pt, no Instagram, conta com 20 mil seguidores. «Realmente, o alcance desta plataforma está a superar todas as minhas expetativas. Os números que obtemos, também naquilo que diz respeito ao engajamento no site euvoto.pt, prova que as pessoas não estão desinteressadas, não têm é as ferramentas necessárias para se elucidarem», disse Vasco Galhardo Simões.

 

O poder das interações virtuais

Segundo dados referentes à sondagem do ISCTE, um dos fatores diferenciadores das camadas mais jovens «é a menor intenção de votar em Marcelo Rebelo de Sousa». De facto, analisando a forma como os seguidores reagem aos perfis dos candidatos no Instagram do Eu Voto, é possível constatar que o de Ana Gomes, independente, à data de fecho desta edição, contabilizava mais de 3 mil likes, sendo seguida por Marisa Matias, do Bloco de Esquerda, com cerca de 2300. Ainda que, de acordo com o ISCTE, no grupo dos eleitores que têm entre 25 e 44 anos, André Ventura tenha «um apoio significativamente acima da média neste grupo», somente cerca de 1/20 dos seguidores da página colocaram ‘gosto’ no perfil do candidato do Chega.

«Não posso afirmar com certeza se a maioria está mais inclinada para um ou outro candidato, mas estamos a responder a centenas de mensagens diariamente», salientou Vasco, avançando que há duas semanas respondia, essencialmente, a jovens que residem no estrangeiro e que votarão pela primeira vez.

Esta tendência assinalada pelo fundador do projeto alinha-se com as queixas feitas pela associação Cap Magellan, a principal entidade, em França, que reúne jovens de origem portuguesa. Esta quarta-feira, num debate no Facebook, vários lusodescendentes insurgiram-se contra a falta de informação que notam em relação aos candidatos, exigindo obtê-la.

É por eles, por aqueles que se encontram em isolamento profilático – «confusos e sem saber o que fazer» – e por todos aqueles que se encontram perdidos ou indecisos que Vasco continua a lutar pelo projeto. «Tem sido cansativo, mas é por uma boa causa e, no fundo, orgulho-me de saber que ajudo pessoas a votar, pessoas que, se calhar, sem esta plataforma, não o fariam», declarou, não deixando de afirmar que «o que importa é que as pessoas votem, não interessa em quem», e é este o lema que segue, com o auxílio de Diogo Marques, quando trata os candidatos «de forma igual, sem juízos de valor».

 

O futuro

«Há pessoas que me dizem que nunca votaram ou que não se importavam. E é verdadeiramente incrível ler que finalmente perceberam o processo eleitoral e leem sobre cada candidato», assumiu o jovem.

«Isto proporciona-se porque fazemos um mashup dos assuntos mais importantes, das bandeiras de cada candidato, em cada post», defendeu, justificando que «são sete candidatos e há um com que nos identificamos mais». A partir desta premissa, é fácil perceber que «a partir do momento em que um jovem concorda com quase tudo aquilo que um candidato diz, é meio caminho andado para que vá às urnas no dia das eleições».

Ainda que esteja ciente de que tem «um grande trabalho pela frente», mantém-se focado no objetivo de fazer o Eu Voto perdurar e tem aliados nesta missão, como o escritor Afonso Reis Cabral, a apresentadora Cláudia Borges, a atriz Inês Aires Pereira, o locutor Renato Duarte ou o jornalista Marcos Pinto.

 «Recebemos mensagens de pessoas a pedir que não paremos. Acho que é muito importante esclarecê-las fora da altura das eleições», disse, já tendo em vista as eleições autárquicas, que acontecerão entre o fim de setembro e o início de outubro. Todavia, Vasco não esquece uma mensagem específica. «Uma rapariga escreveu: ‘Acho que mais importante do que, muitas das vezes, criticarmos o que vemos é saber elogiar e agradecer as coisas boas que se fazem neste mundo’. E, no final, admitiu que o Eu Voto está incluído nesse leque».

«Em suma, queremos aproximar a política ao máximo das pessoas», concluiu.