«Não haverá seguramente festejos de Carnaval e a Páscoa não será como a conhecemos». A garantia foi dada pelo primeiro-ministro, António Costa, mas não apanha de surpresa os responsáveis pelo setor do turismo nas várias regiões do país, que tinham já a noção de um Carnaval «irremediavelmente perdido» e uma Páscoa «comprometida».
As opiniões dos responsáveis são, aliás, unânimes: com um confinamento por tempo ainda meio incerto não é expetável que o turismo comece a melhorar antes do meio da primavera.
O Nascer do SOL falou com responsáveis dos setores do turismo de várias regiões do país para saber qual é a situação neste momento e que perspetivas têm para o futuro deste setor de atividade. Se o Carnaval já está completamente perdido, para a Páscoa ainda existiam algumas esperanças, embora poucas. «Gostaríamos que tal [medidas ainda mais restritivas] não acontecesse, dado tratar-se de um período de oportunidade relevante para a procura turística no Algarve, mas neste momento é impossível antever a situação da pandemia em Portugal no período da Páscoa», diz a este jornal João Fernandes, presidente da Região de Turismo do Algarve, lembrando que a Semana Santa e as férias escolares são um período em que o Algarve «é tradicionalmente procurado por famílias com filhos». No entanto, as pausas escolares «estão à partida reduzidas».
João Fernandes lembra ainda que a Páscoa «é um período em que a procura dos mercados de proximidade é mais expressiva». No entanto, este ano será diferente e, «obviamente, tudo dependerá das condições epidemiológicas de Portugal e de Espanha e da própria realidade das fronteiras terrestres entre os dois países».
Já o presidente da Associação de Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA) não tem dúvidas: «O Carnaval está completamente comprometido e a Páscoa muito comprometida, para não dizer totalmente comprometida». As perspetivas do ano passado, altura em que Elidérico Viegas apontava para uma recuperação na Páscoa deste ano, foram por água abaixo. Até porque, para este ano, «ninguém acredita» que a Páscoa traga alguns números ao turismo. «Penso que já toda a gente percebeu que antes de abril não haverá levantamento nenhum das restrições que temos. Os períodos de férias escolares também podem estar comprometidos com estes confinamentos, e a Páscoa não proporcionar as férias que normalmente costuma proporcionar» é um claro sinal de que a recuperação não é para já.
E não só em Portugal como no mercado externo. «Digamos que a situação nos países de origem dos turistas também é preocupante, nomeadamente no Reino Unido, que é o nosso maior fornecedor. Não acredito que na Páscoa possamos ter a procura que temos nos períodos de Páscoa, que normalmente é um período de grande procura. O motor de arranque para a época turística, o pontapé de saída, não se vai verificar este ano», perspetiva o presidente da AHETA.
‘Tenho muitas dúvidas’
Um pouco mais acima, no Alentejo, as perspetivas são mais ou menos as mesmas. «O Carnaval está irremediavelmente perdido. Não há Carnaval, ninguém se vai aperceber sequer de que é Carnaval. Em relação à Páscoa, as coisas neste momento não estão muito simpáticas», diz a este jornal Vítor Silva, presidente da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo.
O facto de o turismo estar dependente de uma série de fatores como a vacina, o mercado externo, a confiança das pessoas ou a aviação deixa muitas incertezas futuras, principalmente numa altura em que se pensaria que a Páscoa já pudesse trazer alguns frutos. «Tínhamos a previsão de que a Páscoa fosse o começo da recuperação em relação ao turismo interno, não em relação ao turismo externo», diz Vítor Silva, lembrando que foi este mercado que «aguentou um pedacinho do turismo no ano de 2020». No entanto, é com «muita dificuldade» que vê a recuperação do turismo interno já na Páscoa, até por causa do confinamento.
Desconfinamento gradual
No caso do centro do país, o presidente da Entidade Regional de Turismo do Centro de Portugal lembra que «estamos em pleno período de confinamento» e que, por isso, não é esperado que «o processo de desconfinamento seja imediato, tendo em consideração o impacto que a última vaga teve no país», diz Pedro Machado.
Nesse sentido, mesmo que, daqui a um mês, a situação seja menos grave, «como esperamos todos que aconteça, é de prever que o processo de desconfinamento seja gradual, mantendo-se algumas restrições com impacto na atividade do setor turístico», diz. E acrescenta: «Independentemente do nível das restrições, outra batalha a ser ganha é a da recuperação da confiança por parte dos consumidores, que não será um processo imediato, como é natural».
‘Será sempre um exercício de futurologia’
Num primeiro confinamento, muitos foram os que apontavam esta Páscoa para o início da recuperação turística – mais que não seja porque o verão teve «resultados muito interessantes, principalmente para os territórios de baixa densidade, mas que naturalmente não apagaram a situação bastante difícil do setor», diz Luís Pedro Martins, presidente da Associação de Turismo do Porto e Norte.
Mas, com a terceira vaga, «é muito difícil estar a avançar com previsões, será sempre um exercício de futurologia».
É esse mesmo exercício que, para já, é feito em relação à Páscoa, garante. «Tudo leva a crer que teremos de manter restrições até muito perto dessa data, o que desde logo compromete a Páscoa. Sabemos que as duas habituais semanas de férias escolares foram encurtadas para apenas uma e isso, naturalmente, influencia a eventual procura que poderia haver para essa época», diz ao Nascer do SOL.
Recuperação para quando?
Face aos avanços e recuos que a pandemia de covid-19 já teve em Portugal, ninguém sabe quando o turismo poderá começar a recuperar. No entanto, são feitas algumas previsões.
João Fernandes garante que «é extremamente difícil fazer previsões com alguma consistência».
No entanto, destaca que o turismo do Algarve «tem a seu favor um trabalho desenvolvido para criar todas as condições e motivações», como é o caso de grandes eventos como o MotoGP, a Fórmula 1 (a confirmar) ou o Portugal Masters em golfe, entre meados de abril e o início de maio. Junta-se a contratação de rotas com as principais companhias aéreas que servem a região, entre outros. «Em condições normais é expetável que tenhamos um segundo semestre com procura mais expressiva relativamente ao período homólogo de 2020», diz, acrescentando que uma vez que «o plano de vacinação em Portugal prevê uma imunidade muito expressiva já em setembro de 2021, temos razões para acreditar que o verão de 2021 seja o ‘período D’ para esta recuperação».
A opinião é partilhada por Elidérico Viegas. «Neste momento não pensamos em retoma efetiva antes do verão, dos meses altos do verão. E, mesmo assim, muito limitada, mais centrada na procura do mercado interno», projeta. «Reconheço que durante o verão poderemos ter recuperação caso a pandemia se esbata quer através da vacinação, quer das restrições impostas pelos países e por Portugal», acrescenta.
O verão é também a altura apontada por Vítor Silva. «Com o aumento de vacinação, este novo confinamento está a dar muito bons resultados. Se aguentarmos, penso que a segunda metade da primavera já poderá retomar o turismo interno. Não tenho nenhuma bola de cristal, mas penso que o verão já será bom para o turismo interno», diz, lembrando que o verão passado, apesar da pandemia, conseguiu resultados muito semelhantes aos de 2019.
Verão é também o palpite do Porto e Norte, que conta com resultados animadores para essa altura. «Sabemos que a seguir ao confinamento, e depois de a situação pandémica estar controlada, teremos um cenário com uma oferta mais reduzida, um turista que irá ter um comportamento e preferências diferentes do que tinha antes de março de 2020, e com mais consciência e cautela financeira. São estas e outras análises que estão a ser consideradas neste trabalho de reestruturação do setor», prevê Luís Pedro Martins.
Mais contido nas previsões está Pedro Machado, que recorda que a previsão anterior para a recuperação nesta Páscoa «pecou por excesso de otimismo». Por isso, defende que «a recuperação está dependente de diversos fatores internos e externos que são extremamente voláteis, como temos assistido no último ano». Garante que é «irresponsável» nesta altura apresentar previsões para 2021 e até para 2022. Mas, tal como no Alentejo, o verão passado contou na zona centro com um crescimento de dormidas de turistas nacionais. No entanto, todos os fatores como mercados externos ou transporte aéreo são determinantes e levam o responsável a garantir que «todas estas variáveis estão dependentes da evolução de uma pandemia que tem sido tudo menos previsível».