De repente era uma realidade; 24 horas depois era um fracasso. No dia 20, doze dos mais poderosos clubes da Europa, liderados pelo Real Madrid e pelo seu presidente, Florentino Perez, abriram uma cisão no seio do futebol do continente. Real e Atlético de Madrid e Barcelona, Juventus, Milan e Inter, Liverpool, Manchester United, Manchester City, Arsenal, Tottenham e Chelsea decidiram avançar com uma Superliga Europeia, apoiando-se na ideia de que, desta forma, embolsariam muitos mais milhões de euros do que aqueles que recebem com as habituais presenças da Liga dos Campeões. Uma frente de guerra abriu-se de imediato. Pudera! Já imaginaram o que seria atual Liga dos Campeões sem estes clubes? Até porque apesar de Florentino Perez, o chefe dos rebeldes, ter afirmado e reafirmado que o estabelecimento da Superliga não significava o abandono dos 12 clubes da Champions, a UEFA e o seu presidente, Ceferin, anunciaram de imediato a expulsão desses clubes das provas europeias, recebendo o apoio esperado da FIFA, cujo presidente, Infantino, se saiu com a prepotente decisão de proibir os jogadores das equipas dos 12 de representarem as suas seleções nacionais. Uma precipitação estúpida, convenhamos, própria de quem não está habituado a ser contrariado. Não conseguimos perceber como tal atitude poderia ser possível, mas não foi preciso ir muito mais longe.
Poucas horas após o anúncio da nova Superliga, os adeptos do Chelsea, o menos importante de todos os clubes revolucionários, trataram de se juntar em frente a Stanford Bridge reclamando contra a posição dos seus dirigentes. Afinal é bem mais fácil atingir uma meia-final da Champions, como sucedeu esta época, do que triunfar na eventual Liga dos todo-poderosos.
Inglaterra out!
Um efeito dominó tomou, entretanto, conta dos seis clubes ingleses que haviam decidido apoiar o projeto de Florentino Perez. A pouco e pouco, Arsenal, Manchester United, Manchester City, Tottenham e Liverpool seguiram o exemplo do Chelsea e abriram a boca para soltar um meio envergonhado NO!
Se dirigentes da Juventus, como Agnelli, resolveram manter-se mudos após o abandono dos ingleses, Florentino Perez voltou a sublinhar que o surgimento da Superliga é inevitável. E isso por mais que a UEFA já tenha decidido virar de pernas para o ar a Liga dos Campeões a partir de 2024, alargada para 36 equipas. Garante o presidente do Real Madrid que já estão garantidos ganhos orçamentais na ordem dos quatro mil milhões, recolhidos cabendo 32,5% a cada clube, proventos muito mais significativos do que aqueles que absorvem em direitos de publicidade e televisivos vindos da atual Liga dos Campeões.
Para já, com o abandono dos clubes ingleses, a Superliga parece condenada a desaparecer na gaveta, para alívio da UEFA que estava à beira de ter a Liga dos Campeões transformada noutra Liga Europa. Agora, no que respeita às acusações de elitismo, a coisa é para rir já que foi este modelo de Liga de Campeões que tornou os clubes ricos ainda mais ricos e conduziu a discrepâncias incompreensíveis em campeonatos como os de França, Itália ou Alemanha, cristalizando campeões que mantêm os títulos durante anos a fio. Vencido o primeiro round, resta saber como vai a UEFA manter sossegados os clubes mais insatisfeitos, como são o caso de Real e Barcelona. A verdade é que é preciso comprá-los. E a bom preço.
A semana foi excitante para o futebol europeu e abriu janelas para discussões vindouras. O poder discricionário da UEFA, que regula como quer e lhe apetece as provas europeias, e que nos últimos anos tem defendido até à morte os seus favoritos, será cada vez mais discutido, tal como o foi agora. Os clubes parecem querer decidir por si próprios o seu futuro, mesmo que isso obrigue ao abandono da Confederação Europeia. Nada de muito preocupante, convenhamos. Já as primeiras jornadas da Taça dos Campeões estavam em marcha quando a UEFA foi fundada. O que quer dizer que podemos passar muito bem sem ela.