“Infelizmente, não entendemos que haja condições para voltarem a abrir [as discotecas e os bares] até ao final de agosto e, portanto, mantêm-se essas restrições” por causa da pandemia causada pela covid-19. A afirmação é do primeiro-ministro, António Costa, e, por isso, o setor da animação noturna continua sem ver a luz ao fundo do túnel.
A notícia não caiu bem no setor – que até tinha reunido com o Governo na segunda-feira – e a Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP) é clara: “Do nosso ponto de vista, começa a ser muito difícil estas empresas poderem um dia vir a reabrir. Se não conseguimos – porque não temos informação – comentar as medidas de caráter sanitário, tem que haver aqui um equilíbrio ao nível económico”, diz ao i Ana Jacinto, secretária-geral da AHRESP. Apesar dos apoios recebidos nos últimos meses, eles são “insuficientes face à dimensão e gravidade da situação”. E se a ideia é continuar com estes espaços fechados até agosto, então “o Governo tem que majorar os apoios a estas empresas para que um dia possam abrir porque, se não, é muito difícil”.
Ainda no que diz respeito aos bares e discotecas, Ana Jacinto defende que a não reabertura para já “é um problema enorme” até porque “a animação noturna é um elemento fundamental do nosso produto turístico e nós estamos a ficar numa situação muito delicada e estas empresas numa situação muito delicada”.
Assim, a AHRESP está a preparar uma proposta de reabertura para estas atividades mas não vê grande solução uma vez que o Governo já decidiu. Para já, não há dúvidas: “Estamos a falar de um subsetor fundamental do nosso produto turístico” e, por isso, “corremos o risco de deixar de ser competitivos”, garante Ana Jacinto. E acrescenta: “A animação noturna é um elemento fundamental das escolhas dos turistas, é muito importante para o produto turístico português. Estamos bem agora porque estamos no corredor verde do Reino Unido” mas quando outros países concorrentes também estiverem e puderem abrir bares e discotecas, “corremos o risco de perder este alento”.
A opinião é partilhada por José Gouveia, presidente da Associação Nacional de Discotecas que deixa no ar a questão: “Porquê?”. Principalmente numa altura em que “os especialistas do Infarmed dizem que não há razão para nós continuarmos fechados, pelo menos quando se fala em discotecas outdoor”.
A dúvida é então a palavra de ordem nesta altura, principalmente quando a restauração poderá abrir até à 1h da manhã. “Nós perguntamos então: ‘e as discotecas e os bares ficam onde? Qual é o papel delas num futuro próximo?’. Até porque até agosto, nem é preciso decretar abertura das discotecas porque não há discotecas para abrir”.
O anúncio deixou muitos empresários com a mão na cabeça. “Estamos a entrar numa situação extremamente preocupante e revoltante. Neste momento, após este anúncio, já há muita gente que está a dar voltas à fechadura pensando que não vão voltar a abrir porque a esperança foi sempre que durante o período de junho, julho, voltassem a abrir, pelo menos os espaços ao ar livre”, lamenta o responsável.
Agora, cabe aos empresários e associações perceber que medidas e iniciativas é que vão ter que tomar. Até porque continuam a ser feitos investimentos mas “António Costa gosta muito de cortar essa esperança”, critica. “Agora também pergunto ao senhor António Costa se acha que o turismo vai aumentar tendo os bares e as discotecas encerradas nesta altura de verão porque muitos turistas vêm à procura disso: praia, gastronomia, clima e a diversão noturna”, atira José Gouveia.
“Depois alguém substitui o nosso espaço”
Ao i, Olavo Sousa, do grupo Noite Biba – que tem discotecas em Viseu, Coimbra e Figueira da Foz – diz não concordar com esta decisão do Governo. E justifica: “O que assistimos pelo país fora, ao longo deste último ano e pouco em que estamos encerrados, é que os restaurantes substituem as discotecas”. O maior problema, no seu entender, está aí. “Isso é que não é aceitável. Como é que é possível estarmos encerrados e não trabalharmos porque podemos ser um foco de contaminação, mas depois, os outros podem e destroem o nosso espaço. Não se compreende”, atira, apesar de entender que se compreende a decisão por ser de saúde pública. Mas, feitas as contas, este setor foi o primeiro a encerrar e será o último a abrir. “Sempre fomos conscientes que podíamos ser um foco de contaminação e, por isso, é que tomámos essa decisão, mas também acho que está na altura de o Governo olhar para nós e para os apoios miseráveis que nos tem dado”, diz ainda Olavo Sousa.
Opinião que não é muito diferente da de Fernando Pereira, sócio do Tokyo e do Jamaica. “Sempre tive uma expectativa muito negativa em relação à reabertura das discotecas”, começa por dizer ao i. E acrescenta: “Essa perceção tem a ver com tudo o que se passa dentro de uma discoteca: um espaço fechado, um ar condicionado, na maioria das vezes, em circuito fechado, a proximidade das pessoas, o álcool. Tudo isto leva a que as decisões do Governo em relação às discotecas sejam as corretas em relação à saúde pública”. No entanto, há coisas que diz não conseguir perceber como é o caso da “ausência total de qualquer justificação, de qualquer apoio, de qualquer informação que permita que os espaços como o Jamaica e o Logótipo do comerciante Tokyo consigam tomar decisões”. Portanto, estão num impasse: “Despedimos o pessoal? Não despedimos o pessoal? Mantemos contratos? Não mantemos os contratos? Entregamos o espaço? Não entregamos o espaço? E não há nenhuma informação em relação a isso”.
Se for para proteger a saúde pública, a resposta está na ponta da língua: “’bora”. Mas não se pode permitir “o que aconteceu no Porto, o que aconteceu em Lisboa, e o que vai acontecer no Porto, em relação aos Santos Populares, porque no fim da linha estão as discotecas e os bares e são eles que mais vão sofrer porque a abertura vai ser adiada”.
Quanto à luz ao fundo do túnel: “Nunca a vimos” e só o Jamaica, que entretanto teve de mudar de instalações, já conta com um prejuízo de 50 mil euros.