Podemos estar perante uma quarta vaga? Não há dados ainda que nos permitam dizer isso. O que estamos a assistir é a um aumento de internamentos por covid-19, com maior destaque na área metropolitana de Lisboa, que se junta ao aumento de casos de doentes não covid que aparecem em estádios mais adiantados. Nesta altura, com o conhecimento que já temos, é fundamental as pessoas perceberem a importância da adesão às medidas de prevenção e controlo e da infeção e tem de haver um discurso coerente a nível nacional que transmita a necessidade desse envolvimento da população.
Que casos estão aparecer nos hospitais?
O aumento da atividade pandémica incide sobretudo nas pessoas não vacinadas, pelo que vemos faixas etárias que ainda não estão tão vacinadas, mas estamos a assistir com alguma preocupação a casos em pessoas vacinadas. Neste momento não levam a uma sobrecarga dos serviços de saúde, mas são casos que têm de ser avaliados. É algo que nos obriga de forma muito premente a analisar que tipo de vacinas fizeram, que esquema vacinal, que fatores do hospedeiro podem ter contribuído para uma menor eficácia vacinal e que tipo de variantes podem estar a condicionar esta situação.
Pode já ser consequência da variante indiana, que as análises do Instituto Ricardo Jorge indicam que pode estar já com transmissão comunitária no país?
É uma das hipóteses, o que na minha perspetiva nos obriga a fazer sequenciação genómica de todos os casos graves de internados e em particular dos vacinados. Tem de ser obrigatório. Com base nesta avaliação poderemos rever procedimentos com maior precocidade, antes que seja tarde. Um dos exemplos que está a ser equacionado em alguns países é reduzir o intervalo de 12 semanas entre as duas tomas da AstraZeneca para garantir mais precocemente o esquema vacinal completo.
Lisboa não deve avançar para a próxima etapa do desconfinamento, mantendo as regras atuais. Será suficiente para controlar a situação?
Com base nas regras apresentadas tenho alguma dificuldade em perceber para onde vamos evoluir. Tínhamos zonas verdes, vermelhas e amarelas na matriz e uma proposta de etapas C,B, A e basicamente o que foi anunciado foram duas novas etapas a 14 e 28 de junho em que o difere são horários de funcionamento e lotação dos espaços públicos. Se tenho dificuldade em perceber isto, admito que a maior parte das pessoas também tenham e que comecem a interiorizar que a pandemia já acabou, o que não é verdade.
O gabinete de crise da OM defende mais critérios na matriz de risco. Como se aplicariam?
Entendemos que é preciso fundamentar medidas e decisões com mais indicadores e uma análise mais fina: o RT que foi retirado da equação quando se passa só a falar de incidência, fatores como a positividade nos testes, a evolução e gravidade de internamentos em enfermaria e UCI e de óbitos, a circulação de variantes por concelho e cobertura vacinal. E há um dado que defendemos desde o início da pandemia que devia existir é que a informação sobre os internamentos não seja dada em número absoluto, quantas pessoas estão internadas, mas em movimento diário, quantas entram e quantas saem.
Vê motivos para que não sejam dados públicos ou que a informação não seja mais regular?
É incompreensível que passado este tempo todo da pandemia em vez de termos evoluído para termos uma informação mais precisa mantenhamos a mesma informação ou menos. O caminho deveria ser o oposto, mais informação para gerar maior conhecimento, fundamentar melhor as decisões e permitir a mobilização das pessoas para a adesão às medidas, o que nesta fase até todos termos vacina é determinante. Temos mais informação em Portugal sobre a situação epidemiológica no Reino Unido do que no nosso país. É mais fácil saber a evolução em termos epidemiológicos, de prevalência das variantes, de evolução clínica do que no meu país. E quem diz Reino Unido diz outros países, que além disso têm um modelo de acesso de informação de maior entendimento em que as pessoas acedem aos dados com maior facilidade.