A raiva contra o desemprego e miséria na África do Sul misturou-se com oportunismo de criminosos e com o descontentamento com a prisão do antigo Presidente Jacob Zuma, numa explosiva convulsão, sem paralelo na história do país desde o Apartheid. Pelo menos 45 pessoas morreram nos motins que duram desde o fim de semana, segundo a AFP, com autoestradas cortadas por barricadas e tiros, fogo posto, vandalismo e saque de lojas. As forças armadas sul-africanas já foram colocadas nas ruas, com uns 2500 soldados a reforçarem as forças de segurança, segundo a BBC, enquanto habitantes locais se começam a organizar para defender os seus bairros.
É difícil avaliar até que ponto estes motins são liderados por apoiantes de Zuma. Se é verdade que o seu epicentro foi a província KwaZulu-Natal, bastião do ex-Presidente, onde morreram 26 pessoas, agora a principal preocupação são os bairros de lata de Soweto, mesmo ao lado de Joanesburgo.
Os habitantes destes bairros nunca foram conhecidos como particularmente fãs de Zuma. Mas certamente sentiram o pior do aumento do desemprego jovem com a pandemia, para uns insustentáveis 46.3%. Os amotinados que atacaram o centro comercial Jabulani, o maior em Soweto, onde fica uma cadeia de supermercados propriedade de madeirenses, estavam mais preocupados em escapar com comida, roupa, móveis, camas, colchões e até frigoríficos às costas, segundo a Lusa.
Enquanto se vive o caos nas ruas, há uma certa paranoia no topo do partido governante, o Congresso Nacional Africano (ANC, em inglês), que foi dominado durante décadas por Zuma, antes deste ser derrubado pelo atual Presidente, Cyril Ramaphosa. A imprensa sul-africana está cheia de rumores e burburinho quanto a se este ou aquele dirigente do ANC no fundo apoia Zuma, enquanto o Daily Maverick notava que parecia haver algum apoio ao ex-Presidente entre a família real zulu, particularmente influente no seu estado de KwaZulu-Natal.
Estilo Al Capone Durante anos, nenhuma acusação, por mais incrivelmente grave que fosse, parecia pegar com Jacob Zuma. Ainda antes de subir à presidência, em 2009, já era acusado de corrupção e de violar a filha de um amigo e camarada de partido, uma conhecida ativista pelos direitos de pessoas com HIV. Durante o julgamento, em 2006, Zuma admitiria apenas ter tido sexo consensual desprotegido com esta, sabendo que estava infetada com o vírus, dizendo ter tomado banho para evitar apanhá-lo, chocando qualquer pessoa com o mínimo conhecimento do que é o HIV.
Após anos de controvérsia, Zuma – à semelhança de Al Capone, que foi preso por meros crimes fiscais, comparava o jornal sul-africano Citizen – foi apanhado por um crime menor, condenado a 15 meses de prisão por desrespeito ao tribunal.
“Enviar-me para a prisão na minha idade é o mesmo que me condenar à morte”, queixou-se o ex-Presidente de 79 anos, citado pela AFP. Tão cedo não desistirá de voltar às ruas, estando os seus advogados a preparar um recurso à condenação. E já há alguma pressão política sobre Ramaphosa para que lhe conceda um indulto presidencial, lê-se na imprensa sul-africana.