Coronavírus. A diferença entre o ocidente e o oriente

Macau vai testar mais de 650 mil pessoas no espaço de três dias por ter registado quatro casos positivos. 900 pessoas ficaram isoladas. O contraste é evidente com o ocidente, onde a abertura é uma realidade apesar de milhares de casos diários.  

Bastaram apenas quatro casos da variante Delta do novo coronavírus para que o Governo de Macau declarasse na quarta-feira o “estado de emergência imediata em risco de sofrer um surto” comunitário. Para um território que só identificou 63 casos desde o início da pandemia e não registou qualquer morte, a celeridade das medidas e das restrições decididas pelas autoridades, tanto fronteiriças como dentro do território, têm demonstrado ser eficazes. Até ao início desta semana, Macau não registava um único caso de covid-19 há 16 meses consecutivos. 

Mas os alarmes soaram na região depois de uma jovem dançarina ter testado positivo ao novo coronavírus. A macaense terá viajado entre Zhuhai e Xian, na China, no final de julho e ao seu lado, na fila 54 do avião, estariam dois outros passageiros infetados que lhe transmitiram a infeção. Posteriormente, a jovem terá infetado os seus familiares próximos.

A identificação destes casos levou as autoridades macaenses a adotar medidas preventivas com efeito imediato.  Inicialmente, foram colocadas cerca de 900 pessoas em isolamento, entre estas 700 eram contactos próximos e mais de 200 eram moradores de prédios vizinhos ao desta família infetada.

Depois, “para evitar a transmissão causada pelo novo tipo de coronavírus na Região Administrativa Especial de Macau, a partir das 00h do dia 5 de agosto de 2021” foram encerrados “os cinemas, teatros, parques de diversão em recintos fechados, salas de máquinas de diversão e jogos em vídeo, cibercafés, salas de jogos de bilhar e de bowling, estabelecimentos de saunas e de massagens, salões de beleza, ginásios de musculação, estabelecimentos de health club e karaoke, bares, night-clubs, discotecas, salas de dança e cabaret”, anunciou o chefe do Governo de Macau.

Além do encerramento de vários estabelecimentos, as autoridades de saúde começaram a realizar testes de ácido nucleico à covid-19 para toda a população, durante três dias, em 41 locais: 27 em Macau e 14 no Cotai (faixa de casinos entre as ilhas da Taipa e de Coloane).

Com mais de 659 mil habitantes, até às 14h locais de quinta-feira, as autoridades de saúde já tinham testado 379 mil pessoas, sendo que dos 115 mil resultados conhecidos todos revelaram ser negativos, noticiou a TDM-Teledifusão de Macau. Este primeiro dia de testagem foi marcado por filas intermináveis, que chegavam a ter quase mil pessoas à espera, como contou ao i um português residente em Macau.

O mundo a duas velocidades. O coronavírus veio mais uma vez denotar as assimetrias em matéria de saúde pública entre ocidentais e orientais. A forma como se tem controlado a pandemia difere tanto geograficamente como culturalmente, e dos Estados Unidos à China ou da França à Nova Zelândia as diferenças têm sido notórias.

Os Estados Unidos estão a abrir, a China a fechar. Washington está à procura de uma reabertura segura e sustentável no acesso de estrangeiros ao país, que poderão entrar no país se tiverem a vacinação completa. A imunização da população é a prioridade do Governo de Biden, uma vez que ainda na quinta-feira os EUA registaram o maior número de infeções em seis meses — 112 700 casos em 24 horas.

A aposta nas vacinas é segura e tem definido a política ocidental de combate à covid-19. Canadá, Itália, Alemanha e Reino Unido juntam-se aos EUA no lote de países com maior taxa de vacinação. O Reino Unido, por exemplo, já tira os proveitos da imunização da população: entrou há semanas na última fase de desconfinamento, na qual já não é obrigatório o uso de máscara nem o distanciamento social, não obstante os 50 mil casos diários que iam surgindo e a previsão de um pico infeccioso em agosto. 

Em sentido inverso à abertura ocidental, a China prepara-se para enfrentar uma nova clausura, como é o caso de Macau. O país está a enfrentar uma nova vaga de covid-19, com 71 casos detetados em 24 horas, um valor superior aos máximos divulgados desde janeiro. São 17 as províncias identificadas como foco de contaminação neste momento, o que já levou as autoridades chinesas a suspender os passaportes aos cidadãos chineses de “forma temporária”.

Os “máximos” chineses são considerados limitados em comparação com os números de outros países, se considerarmos que a China tem uma população de 1398 mil milhões. Mas o facto é que 71 casos foram suficientes para restringir a liberdade de circulação aos cidadãos. O cenário repete-se na Coreia do Sul que também tem vindo a apertar as restrições há já um mês devido ao rápido aumento do número de infeções.

A política zero infeções Na ótica do virologista Pedro Simas, “uma política muito agressiva de testagem” e a adoção de “restrições muito apertadas” para controlar a pandemia “faz todo o sentido”, por parte de países como a China, Coreia do Sul e Nova Zelândia.

Contudo o especialista alerta que o problema só se resolve com a vacinação. “Os países que têm uma política de zero infeções teriam que se prevenir muito bem em ter programas de vacinação muito acelerados e eficientes. Mas eles estão muito atrasados na vacinação. Só têm entre 20% a 30% de uma dose vacinal”, salienta.

Pedro Simas acredita que “o vírus vai ficar endémico no mundo e não vai desaparecer”, deitando por terra qualquer tentativa de erradicação da covid-19. E lembra que “mesmo que o Ocidente adotasse as mesmas medidas, é impossível erradicar o vírus porque África e a América do Sul não o vão fazer”.