Como dar música ao novobanco?

Ao princípio, foi um convite que o deixou reticente. Deveria Moullinex, produtor de Viseu, criar a música que irá fazer parte do rebranding do novobanco? Mas depois de ouvir o projeto e a explicação sobre a vontade de humanizar a instituição, Luís Clara Gomes não hesitou em aceitar o desafio.

A música tem o poder de nos transportar para locais onde nunca fomos e de explorar sentimentos que estão enterrados no nosso íntimo, mas terá o poder de humanizar uma instituição que outrora deixou milhares de portugueses lesados?

Criar uma música para integrar o rebranding do Novo Banco, agora novobanco, foi o desafio proposto a Moullinex, nome artístico de Luís Clara Gomes, produtor e compositor de música eletrónica, que este ano lançou o seu quarto disco, Requiem for Empathy.

«Claro que tive dúvidas quando me convidaram para este projeto», confessou o músico à Luz, recordando que «existe uma responsabilidade muito grande por se tratar de uma instituição bancária e pelo seu passado», no entanto, bastou uma conversa com os representantes do novobanco para mudar de opinião.

«Senti que as pessoas que estão envolvidas neste rebranding têm os valores certos e têm os valores alinhados com os meus nesse aspeto. Obviamente, não deixa de ser um trabalho encomendado, mas, muito sinceramente, tanto do ponto de vista artístico como do ponto de vista humano e estético identifico-me com ele», esclareceu Moullinex.

O novobanco atravessa um processo de reestruturação, que passa pelo som e pela imagem, e, neste sentido, foi pedida a colaboração de todos os funcionários para gravarem as suas vozes para, através de um modelo matemático e digital, criarem uma onda de voz coletiva que será a nova representação visual do banco.  

Esta vontade de colaborar com os trabalhadores do banco e dar-lhes voz foi um dos grandes motivos que levaram Moullinex a sentir-se atraído pelo projeto e a criar Identidade Sonora, uma composição original que irá estar presente nos balcões da instituição financeira ou nas chamadas de atendimento ao cliente.

«A conversa que tive com o António Ramalho, CEO do novobanco, foi muito emocional, falámos sobre as 4500 pessoas que, durante um período de transição, ficaram ‘sem passado, sem presente e sem futuro’, parafraseando as palavras dele, e a imagem de ser uma campanha que era construída com base na voz dos trabalhadores era algo que me ficou muito presente comigo durante o processo de composição», afirmou o músico.

A escolha de Moullinex, um produtor que mais depressa associamos a música de pista de dança do que a composições ambientais para ouvirmos na sala de espera de um banco, foi impulsionada porque a equipa que está a liderar o processo de rebranding procurava um artista português contemporâneo, associado a uma nova geração que cruzasse um som que fosse ao mesmo tempo moderno, mas que tivesse também uma primazia pela parte emocional e humana na música. 

Inspirados pelo trabalho mais recente do músico, Requiem for Empathy, disco lançado em abril, mais concretamente pela música Luz, a BBDO, Brand Practice e Innovation Makers, acabou por convidar Moullinex para dar música ao novobanco.

Os primeiros ‘traços’ da composição surgiram logo após o músico abandonar esta reunião inicial: Sentou-se ao piano e, de uma forma muito instintiva, começou a tocar o que lhe veio à cabeça enquanto se gravava com um telemóvel. Meses mais tarde, voltou a esta gravação e decidiu que seria este o ponto de partida para a música hipnótica e circular.

«Comecei a explorar os contextos em que esta melodia podia viver e senti que era importante que fosse mais orgânica, menos sinfónica, para que tivesse uma escala humana», diz Moullinex, que explicou ter-se inspirado em compositores como Claude Debussy, Yann Tiersen, Hans Zimmer ou Jóhann Jóhannsson. «Para podermos olhar para o banco e o seu conceito de humano para humano não podíamos adotar uma orquestra, tinha que ser um quarteto de cordas».

No final, o músico ficou satisfeito com o trabalho que entregou, não sente que é algo «paralelo» à sua carreira, mas sim uma continuação do trabalho que tem vindo a desenvolver nos últimos anos da sua carreira, e poucas coisas lhe deram tanto prazer como o concerto de apresentação.

«Foi o derradeiro teste, se o destinatário desta campanha é a força laboral, então, em última análise, a música foi feita para as mais de 3 mil pessoas que estavam presentes no Campo Pequeno a ouvir a música», explicou o músico, admitindo que sentiu alguma pressão nesse momento. 

Neste concerto, Moullinex contou ainda com alguns convidados especiais em cima de palco, para além da banda que o costuma acompanhar. «Lancei o desafio à equipa do novobanco para procurar funcionários talentosos, que tocassem instrumentos, para me acompanharem na apresentação do tema – contei com a ajuda de um pianista, um flautista, um guitarrista e uma vocalista». 

«Senti-me muito bem por conseguir, à semelhança do resto da campanha, potenciar a identidade das pessoas que trabalham numa instituição tão grande, que, no fundo, é o objetivo deste projeto», confessou.