A novela em torno do Bloco de Esquerda continua a ecoar, depois da reunião em que o partido aprovou o programa eleitoral e as listas do partido às eleições legislativas. Acontece que, mesmo antes das votações, elementos das moções E e N abandonaram esta reunião da Mesa Nacional, em protesto por aquilo que definiram como sendo uma “votação anti-estatutária” de listas às eleições legislativas.
Catarina Martins reagiu ao acontecimento, na conferência de imprensa após a aprovação das listas, definindo-o como um “episódio diferente do costume”. “Os aderentes são chamados a fazer propostas que são trazidas à Mesa Nacional. É assim que nós temos trabalhado desde sempre e os nossos estatutos preveem que a Mesa Nacional se debruce sobre as propostas que vêm das assembleias distritais e votem em alternativa outras propostas. Sempre foi assim, tem sido assim ao longo de toda a vida do BE”, assegurou a líder bloquista.
“Essa proposta foi chumbada, a Mesa Nacional decidiu fazer o que faz sempre: votar todas as propostas que vêm dos plenários distritais e, quando é caso disso, votar em alternativa outras propostas que sejam feitas por pessoas que estão presentes na Mesa Nacional e da Comissão Política. Mantivemos o método de votação de sempre e esses camaradas decidiram não participar na votação”, continuou.
As votações, garantiu Catarina Martins, continuaram com “toda a normalidade”, com 70% da Mesa Nacional presente. As listas “são diversas e são plurais” e “representam as várias sensibilidades” do partido, concluiu. “Mas um grupo parlamentar deve sobretudo ter aquelas vozes que podem fazer a diferença na atividade setorial e que são representantes em todo o país das lutas do BE”, argumentou a líder bloquista, afirmando que, “muito para lá das sensibilidades” bloquistas, os candidatos escolhidos “podem ser as vozes nas áreas fundamentais e juntar nomes independentes”.
Listas polémicas A moção E enviou um comunicado às redações, referindo que “em causa está a apresentação de uma lista alternativa à sufragada pelas/os militantes do distrito de Santarém, numa tábua rasa à decisão do órgão competente regional”. A moção E recusou-se a “participar numa proposta viciada de ilegalidade e exigiram a retirada da lista B por Santarém, versada na proposta a sufrágio na Mesa Nacional”, refere o mesmo comunicado, onde a mesma moção afirma que “votar numa proposta desta natureza é ser conivente com o incumprimento estatutário e é rasgar a democracia interna”. “Nenhuma candidatura pode ser agregadora e mobilizadora se parte do incumprimento da vontade expressa das e dos seus aderentes”, continuou.
Acontece que a direção do Bloco pretendia recandidatar Fabíola Cardoso ao lugar em Santarém, deixando de fora a lista sufragada pelos militantes bloquistas dessa localidade, onde estas vozes críticas do BE são suficientes para fazer este ‘barulho’. A estrutura bloquista de Santarém propunha o nome de Ana Sofia Ligeiro, que faz parte do movimento Convergência, para encabeçar a lista. Nome este que venceu a votação local, “seguiu para a mesa nacional e teria de ser ratificada pela mesa, para que fosse efetivada e houvesse essa candidatura”, algo que não aconteceu, conforme explicou à TSF a própria Ana Sofia Ligeiro.
O movimento Convergência foi, aliás, já polémico em maio deste ano, parecendo augurar o que viria a acontecer na reunião da Mesa Nacional. Na altura, quando Ana Sofia Ligeiro, apresentava a moção intitulada “Enfrentar o empobrecimento, polarizar à esquerda”, a bloquista alertava para o “perigo de perda de influência política que este partido pode enfrentar em muito pouco tempo”. A defesa contra este perigo, argumentava, passaria pela “diversidade e a riqueza de opiniões dentro do partido”, e a moção não aceitaria “condicionantes à contribuição para o debate político”, nem que fosse “cortado qualquer direito de opinião, de participação”. Recorde-se que esta mesma moção elegeu, na última convenção, 17 dos 80 lugares da Mesa Nacional.
Opções Catarina Martins será cabeça-de-lista pelo círculo eleitoral do distrito do Porto, e Mariana Mortágua pelo círculo eleitoral do distrito de Lisboa. De fora das listas ficaram deputados como Luís Monteiro, Jorge Costa e Maria Manuela Rola. Já o eurodeputado José Gusmão representará o Algarve nas próximas legislativas.
Saídas Esta não é, no entanto, a primeira vez que se verificam conflitos internos no Bloco de Esquerda. Em 2019, por exemplo, um grupo de 26 bloquistas anunciou a saída do partido por considerar que “pouco resta do projeto original”. Esse grupo criticava “o caminho de institucionalização” que o BE tinha tomado, e a transformação do partido “num projeto reformista centrado na sua própria sobrevivência”.