Com o que está a acontecer com o despacho de acusação do motorista de Eduardo Cabrita – em que o Ministério Público ‘meteu’ dentro do carro do então ministro um elemento do Corpo de Segurança Pessoal da PSP que, na verdade, seguia num outro veículo, de escolta – e o que tem vindo a passar-se ao longo dos últimos anos na Justiça portuguesa, é inevitável que esta venha a ser um dos temas da campanha eleitoral que se avizinha.
E é bom que o seja.
Como o próprio Presidente da República já veio alertar, é insustentável ter uma Justiça tão lenta, tão lenta que deixa de ser justa.
Como pode um inquérito a um acidente com atropelamento mortal que envolve o carro em que seguia o ministro da Administração Interna, conduzido por um motorista oficial e com um militar da GNR a seu lado, seguido por um veículo com elementos do Corpo de Segurança Pessoal da PSP, que foi também testemunhado pelos colegas de trabalho da vítima, e que, além de tudo isso, teve no local uma patrulha da GNR e uma ambulância do INEM, demorar seis longos meses?
E como admitir que, ao fim de todo esse tempo, o despacho do MP contenha erro tão grosseiro como o de incluir como passageiro do carro em que seguia o ministro alguém que não lá estava e que, no seu próprio depoimento, expressamente afirma que seguia no carro de trás?
Independentemente do que vier a apurar-se em sede de instrução ou de julgamento, perante o alerta público de tamanho erro, o MP deveria promover de imediato a sua correção. Mas não foi isso que aconteceu.
Se a Justiça busca o apuramento da verdade – material ou possível -, como pode não reagir sem delongas a inverdades factualmente relevantes, remetendo a correção para momento posterior do processo sem qualquer justificação que não formalismos que servem apenas para obstruir uma justa e atempada sentença?
Há qualquer coisa de muito estranho neste caso, que não abona a credibilidade do Ministério Público e, como assim, da Justiça.
Como não abonam os casos cada vez mais frequentes de juízes e procuradores acusados de corrupção e cujos processos se arrastam nos tribunais sem que se perceba porquê. São exceções e é preciso não confundir a árvore com a floresta, argumenta-se. E assim até poderá ser. Corte-se é o mal pela raiz.
Mas o que não é exceção, antes a regra, é uma Justiça demasiado e injustificadamente demorada, incapaz de corrigir os seus erros e, sobretudo, de resistir aos holofotes do mediatismo e à tentação de influenciar ou condicionar a opinião pública.
Vejam-se os casos que envolvem Jorge Nuno Pinto da Costa e o FC Porto ou Luís Filipe Vieira e o SL Benfica.
Pinto da Costa é o presidente de clube desportivo mais titulado do mundo, andou nas bocas do mundo por causa de Apitos Dourados e quejandos mas a verdade é que nunca resultaram em condenação. E é preciso chegar a octogenário para lhe cair a espada em cima? Se tiver que ser, seja, mas que chegue a julgamento e a uma decisão e não fique mais uma vez a aboborar.
E vá lá que não se lembraram de o atirar inexplicáveis três noites para os calabouços a dormir em colchão de praia, como sucedeu a Luís Filipe Vieira ou a José António Santos no caso Cartão Vermelho.
Investigue-se, e investigue-se até às últimas consequências, mas não se cometam humilhações e desumanidades escusadas nem se violem os mais elementares direitos humanos.
Sobretudo se, e enquanto isso, verdadeiros criminosos continuam à solta em paraísos londrinos ou caribenhos ou simplesmente aguardam com tranquilidade em suas luxuosas casas por uma Justiça que não há de chegar ainda em suas vidas… se chegar.
O caso de José António dos Santos – também conhecido por Rei dos Frangos – é paradigmático. Vá lá perceber-se por que razão um empresário que emprega milhares de funcionários, cujas empresas familiares faturam mais de 400 milhões/ano, que alimenta a gente da terra e a Misericórdia, que nunca fugiu nem deu motivos à Justiça para desconfiar que poderia querer furtar-se-lhe, é sujeito a detenção para interrogatório e mantido três dias e três noites privado de liberdade. Não está certo!
E menos ainda quando não se percebem quais os crimes que lhe são verdadeiramente imputados nem se lhe dá qualquer oportunidade de defesa pública.
José António dos Santos faz parte de uma geração de empresários, como Nabeiro, Amorim e tão poucos outros, que criaram riqueza e a distribuíram pelas suas gentes, a começar pelos seus trabalhadores.
Não serão certamente santos – mesmo quando o são de apelido -, mas não é pelo facto de serem ricos que merecem ser perseguidos ou tratados como criminosos.
Cuidem mas é de perceber quem é tão rico como eles e não trabalha como eles trabalham, nem tem tantos trabalhadores como eles empregam, ou tão pouco paga tantos impostos e tantas contribuições para a Segurança Social. Que já era tempo de começarem a apurar-se as causas de tantos enriquecimentos injustificados.
A Justiça diz-se cega por não dever olhar a quem, não por ficar de olhos fechados quando convém.