O Banco Privado Português (BPP) foi criado, em 1996, pelas mãos de João Rendeiro. Mas ao contrário das tradicionais instituições financeiras, este estava vocacionado para gerir grandes fortunas, daí ter atraído vários investidores de peso, mas a crise financeira ditou o seu fim. Mas se muitos conseguiram resgatar com alguma e, até com pequena antecedência o seu dinheiro, houve quem não tivesse a mesma sorte.
E apesar da sua pequena dimensão e do pouco peso no setor bancário, o caso BPP inevitavelmente acabou por ter repercussões devido a potenciais efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira, emergindo como um caso de supervisão, pondo em causa a ação do Banco de Portugal, e judicial, com suspeitas de crimes financeiros.
O fim do banco foi ditado em abril de 2010, quando o Banco de Portugal retirou ao BPP a autorização para o exercício da atividade bancária – decisão que a entidade então liderada por Vítor Constâncio (secretário-geral do PS entre 1986 e 1989, vice-presidente do Banco Central Europeu entre 2010 e 2018) – justificando a sua decisão com a “inviabilidade dos esforços de recapitalização e recuperação” do banco. É certo que nessa altura, João Rendeiro já tinha batido com a porta.
A explicação é simples: os problemas do banco começaram antes. Em novembro 2008, a entidade liderada pelo banqueiro viu-se a braços com graves problemas financeiros, o que o levou a pedir um auxílio do Estado no valor de 750 milhões de euros. Um pedido que foi recusado e que o levou a sair da liderança, no final desse mês.
A partir daí e até abril de 2010 decorreu a intervenção do Banco de Portugal no BPP com uma operação liderada por parte de seis bancos (Caixa Geral de Depósitos, BCP, BES, Santander Totta, BPI e Caixa Central de Crédito Agrícola Mútuo), no montante de 450 milhões de euros, com garantia do Estado.
A operação foi então justificada pelo Ministério das Finanças, na altura, liderado por Teixeira dos Santos, do Governo PS de José Sócrates, com vista a salvaguardar depósitos e não as aplicações da área de gestão de fortunas.
Conclusão: uma das principais preocupações das autoridades – Banco de Portugal, mas também do Governo e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) foram os clientes de retorno absoluto, que através do BPP investiam dinheiro em sociedades. Ou seja, estes clientes acabaram por ser indemnizados pelo Fundo de Garantia de Depósitos – no máximo de 100 mil euros – e pelo Sistema de Indemnização aos Investidores – proteção gerida pela CMVM – ainda assim, os valores não cobriram a totalidade do dinheiro investido, daí ter sido criado um fundo com o objetivo de gerir os ativos financeiros e, como tal, recuperarem o dinheiro.
Na altura, o presidente da Associação Privado Clientes garantiu que o fundo de investimento mobiliário foi liquidado em 2018 e permitiu que “a generalidade dos clientes recuperassem o capital”. Mas Jaime Antunes garantiu, na altura, que os que perderam parte do capital foram aqueles que tinham aplicações mais elevadas, acima de dois ou três milhões de euros. “O BPP é o único caso na União Europeia em que depositantes perderam dinheiro”, afirmou.
Já os acionistas perderam todo o capital investido.
Falta de ativos Os ativos líquidos do banco quando entrou em liquidação rondavam os 700 milhões de euros, ou seja, montante insuficiente em 900 milhões para fazer face às responsabilidades assumidas.
Mais de uma década depois, o processo de liquidação ainda não foi dado como terminado e a comissão liquidatária tem sido alvo de muitas críticas por parte da Associação Privado Clientes, que representa lesados do BPP.
Feitas as contas, já foram pagos um total de 405 milhões de euros ao Estado, mas os pagamentos aos credores comuns ainda não começaram. Ainda esta segunda-feira, a Associação Privado Clientes consultou o processo da Comissão Liquidatária do Banco Privado Português (BPP) junto do Tribunal do Comércio e apontou que, no último relatório de 2020, “consta como ‘custo com pessoal’ dois milhões de euros”. A somar a este valor há ainda que contar com a rubrica ‘outros gastos administrativos’, onde está inscrito o valor de 2,1 milhão de euros, mas sem ser especificado pela Comissão Liquidatária a que se referem esses custos.
“O facto é que somado ao ‘custo com pessoal’ tem-se uma despesa administrativa de, no mínimo, 4,1 milhões de euros anuais, valor que representa um verdadeiro escândalo se levarmos em conta que os credores esperam há mais de 11 anos” por serem compensados, afirma a associação.
Os lesados dizem ainda que o processo não indica quem são os 28 trabalhadores nem o valor de remuneração de cada um deles, acrescentando que se for feita “uma conta rápida”, então, “em média, cada um desses 28 colaboradores custa mais de 70 mil euros anuais, pagos com o dinheiro dos credores”.
Quanto a valores fixos mensais, refere que de concreto o processo apenas refere as remunerações mensais propostas pelo Banco de Portugal e que o tribunal aceitou e fixou para 2021: o presidente, Manuel Paulo, ganha 4650 euros por mês e os vogais José Pedro Simões e José Vítor Almeida ganham cada um 3500 euros mensais.
Recorde-se que, em 2020, a Comissão Liquidatária do BPP teve um prejuízo de 4,2 milhões de euros.