Mais de metade dos doentes positivos para a covid-19 atualmente internados em enfermaria no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, e no Hospital de São João, no Porto, foram hospitalizados por outros motivos que não complicações da infeção com o SARS-Cov-2.
O balanço foi feito ao i pelas duas unidades, que retratam uma situação diferente das vagas anteriores, em que o facto de o vírus estar mais disseminado na comunidade e as instituições manterem a atividade normal – o que não foi possível no inverno passado, – tem levado a que mais pessoas que recorrem aos hospitais a precisar de internamento estejam infetadas no momento da admissão, representando agora uma parte significativa dos doentes internados em alas covid-19.
O Hospital de Santa Maria já abriu mesmo uma enfermaria específica para doentes que são admitidos para serem operados e que ao serem testados para a covid-19, o protocolo antes do internamento, acusam positivo. Atualmente, revelou ao i a instituição, há cinco enfermarias covid-19 a funcionar no hospital e 60% a 70% dos doentes internados foram admitidos por outros motivos que não complicações da infeção, em particular doentes cirúrgicos mas também pessoas com patologias descompensadas como insuficiência cardíaca ou renal. Já no São João, de um total dos 58 doentes internados com covid-19 ao dia de ontem, 41% foram admitidos por outros motivos, percentagem que sobe para 56% quando se tem em conta apenas doentes internados em enfermaria.
O balanço foi solicitado pelo i aos dois hospitais, os maiores em Lisboa e no Porto, para tentar caracterizar a situação atual no país depois de a nível internacional surgirem alguns indicadores que sugerem que, perante a disseminação sem precedentes da infeção, com menor gravidade face às variantes anteriores e ao período pré-vacinas, os hospitais lidam agora com uma terceira frente: o aumento de pessoas infetadas que são internadas por outros motivos, e que continuam a ser separadas dos doentes negativos para o vírus para evitar o risco de infeções contraídas no hospital, numa altura em que os surtos em ambiente hospitalar também têm vindo a aumentar.
O i contactou a Direção-Geral da Saúde no sentido de obter um ponto de situação a nível nacional, mas até à hora de fecho não foi possível ter resposta.
Fontes hospitalares explicam que, em vagas anteriores, já eram contabilizados como internamentos covid-19 casos em que as causas de admissão tinham sido outras mas os quadros de complicações associadas à covid-19 eram superiores.
Além disso, agora os hospitais estão a funcionar normalmente, ao passo que em 2020 e no inverno passado a atividade cirúrgica, que representa uma parte significativa dos internamentos, foi suspensa pela necessidade de alargar as unidades de cuidados intensivos, que chegaram a ter 1400 doentes no pico do inverno passado entre casos covid-19 e não covid-19, a maioria agravamentos da covid-19.
Para já, nenhum dos hospitais avança com a necessidade de alterar a estratégia em curso e as adaptações para admitir doentes infetados têm sido feitas ao abrigo dos planos de contingência. Os internamentos continuam também a ser publicados pela Direção-Geral da Saúde como casos covid-19 independentemente da sua natureza, refletindo a ocupação das alas destinadas a doentes infetados.
Uma questão que pode no entanto vir a pesar na análise dos rácios de internamento associados à covid-19 com a nova variante e na análise da eficácia da vacina contra doença grave, se forem incluídos casos em que o internamento teve outro motivo que não uma pneumonia ou outra complicação associada à covid-19, por exemplo uma pessoa ir ser operada.
Esta terça-feira, a OMS admitiu que metade dos europeus poderão vir a ser infetados com o SARS-Cov-2 este inverno, aludindo às projeções do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME) da Universidade de Washington, que o i noticiou nas últimas semanas.
O instituto publicou entretanto uma nova atualização das suas projeções, que aponta para mais infeções do que estimaram na primeira modelação da Omicron mas com menor severidade, revendo assim ligeiramente em baixo o número de mortes esperadas este inverno.
Para Portugal, projetam um pico na casa das 200 mil infeções diárias esta semana, isto com base no padrão de mobilidade e elevada transmissibilidade da Omicron, e antecipam que o número de doentes com covid-19 hospitalizados poderá chegar perto dos 6 mil este inverno já tendo em conta a hospitalizações crescente de pessoas infetadas – antecipam por isso uma pressão hospitalar superior à projetada a nível nacional pelo INSA.
Menor severidade da Omicron Ainda não são conhecidos dados nacionais sobre o risco de hospitalização com a nova variante, sendo a última informação publicada pela DGS respeitante ao mês de outubro, quando a Omicron ainda não estava em circulação.
A nível internacional continuam a ser publicados dados que sugerem uma menor severidade. Um estudo em pré-publicação na plataforma medRxiv, divulgado esta semana, sugere, com base numa amostra de 52 297 casos de Omicron na Califórnia, um risco 50% menor de necessidade de admissão hospitalar, 75% menor de admissão em UCI e uma redução de 69,6% na duração média dos internamentos.
Já em Inglaterra, onde as admissões hospitalares de pessoas infetadas continuam a aumentar e no caso das crianças estão em níveis recorde, é feita já a ressalva pelas autoridades de que estes casos incluem também doentes internados por outros motivos.
O que também se verifica em Portugal, onde o número de crianças internadas tem vindo a aumentar – com mais casos de crianças pequenas internadas, o grupo que iniciou mais tarde a vacinação, do que adolescentes. De acordo com o jornal Público, em cinco hospitais contactados contavam-se esta semana 27 crianças e jovens internados, havendo entre estes casos crianças internadas por outros motivos que não a covid-19 e situações em que foram colocadas em alas covid por terem familiares infetados e estarem no período de isolamento.
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