A União Europeia tem ficado, nos últimos anos, muito aquém do seu projeto inicial e do seu potencial. Mas de um momento para o outro, primeiro com a pandemia e logo depois com a agressão russa à Ucrânia, tem revelado o empenho em aproximar-se do seu sentido fundador. Veremos se ainda será a tempo, se terá eficácia e se não terá de pagar um preço demasiado elevado.
Nos últimos anos (para não recuar mais ainda) a União Europeia tem mostrado fragilidades e falta de capacidade de união e de afirmação política. A famosa exclamação de Henry Kissinger – de que não sabia para que número poderia ligar se quisesse falar com a Europa – é o retrato da falta de liderança europeia. A fragilidade de reação coordenada nas crises mais recentes na Europa (que tiveram em comum a intervenção direta ou indireta da Rússia), a incapacidade na resposta adequada à crise dos refugiados do Médio Oriente e do norte de África ou a saída do Reino Unido da UE têm sido sintomas de uma Europa incapaz de se afirmar.
No entanto, recentemente, a pandemia covid-19 veio revelar que, mesmo que depois de algumas hesitações, é possível a afirmação de uma Europa unida, solidária e com capacidade de articulação entre os vários países. Perante uma grave crise, a União Europeia foi capaz de responder.
Agora, quando a Europa e o mundo vivem a mais aguda crise das últimas décadas com a invasão da Ucrânia pela Rússia, a União Europeia manifesta liderança e resposta comum e uma capacidade de resposta que poucos esperavam certamente, também, o regime russo.
Provavelmente, se a União Europeia tivesse assumido no passado recente outra afirmação, o regime de Putin não arriscaria a agressão à Ucrânia, que agora se verifica.
O conjunto de sanções à Rússia, bem como o apoio militar à Ucrânia são inéditos e representam a única resposta possível perante uma agressão inaceitável e injustificável. São respostas para a defesa da democracia e da liberdade – valores fundadores da União Europeia.
A prazo se verá se a reação europeia foi a tempo de evitar o esmagamento da Ucrânia. Infelizmente, não evitará o sofrimento de milhões de ucranianos.
Resta saber se esta crise — não se sabendo como vai terminar ou quais as suas consequências para a estabilidade europeia e mundial — impulsionará uma nova atitude da União Europeia no que respeita à política e segurança energética, à defesa, ao relacionamento com países que não comungam dos valores europeus de respeito pela democracia, pela liberdade e pelos direitos humanos e, sobretudo, no que respeita à necessidade de apostar numa maior coesão política.
Certo, para já, é o elevado preço a pagar pelos ucranianos perante uma Europa que não se afirmou no passado recente e os custos para a União Europeia por ter adiado até agora uma atitude mais assertiva.
Ainda assim, este é um preço que vale a pena pagar pela liberdade, pela solidariedade e pela justiça.