Desde o final da semana passada que farmacêuticos têm estado a reportar nas redes sociais o aumento de pedidos de comprimidos de iodo para proteger de radiação nos balcões das farmácias, com pouca informação por parte da população de que estes medicamentos só são vendidos com receita médica e de como são usados. Durante o fim de semana, no mesmo grupo no Facebook foi denunciada uma publicidade ‘patrocinada’ de um dos suplementos com iodeto de potássio à venda em Portugal,e que pôs a circular um post com o destaque de que “protege a tiroide do iodo radioativo”. O i confirmou que a publicidade do produto comercializado pela empresa Nutribio está também a circular em espanhol. “Marketing bélico. Destrói qualquer vestígio de bom senso”, escreveu o autor da publicação.
Como o SOL noticiou na edição de fim de semana, nenhum dos produtos de iodo comercializados em Portugal tem a dosagem indicada para situações de exposição a radiação e o IOB39 um exemplo, já que tem uma dosagem de 200 microgramas e o preconizado nas orientações internacionais são, numa situação de exposição iminente a radiação e por indicação das autoridades de saúde, a toma de 130mg para adultos e 65 mg para crianças. Para este suplemento ser utilizado numa situação teriam de ser tomadas centenas de cápsulas e cada caixa, promovida com o custo de 10 euros, tem 30.
O i tentou contactar a empresa, que não respondeu, e também o Infarmed não reagiu até à hora de fecho desta edição. Na última sexta-feira, questionado pelo i sobre o aumento da procura de comprimidos de iodo nas farmácias e se existe stock de medicamentos para estas situações na reserva nacional estratégica de medicamentos, o Infarmed respondeu que “até à data, não se verificou um aumento da prescrição/dispensa de medicamentos contendo iodeto de potássio”, reforçando que “no nosso país, estes medicamentos apenas podem ser dispensados mediante prescrição médica”, não esclarecendo se está a monitorizar o aumento de pedidos nas farmácias e existem medicamentos para situações deste género em stock. Também a Direção Geral da Saúde não esclareceu se irá fazer algum esclarecimento à população, uma das preocupações manifestadas por médicos e farmacêuticos ouvidos pelo i perante a corrida às farmácias e os receios em torno das ameaças nucleares no conflito entre Rússia e Ucrânia, que têm levado a uma maior procura de comprimidos de iodo noutros países europeus.
Médicos alertados para “bombardeamento” de pedidos
A Sociedade Portuguesa Medicina de Urgência e Emergência (SPMUE) manifestou ontem publicamente preocupação com o que se está a passar, publicando também nas redes sociais um alerta destinado sobretudo aos médicos de família eadmitindo que nos próximos dias serão bombardeados com perguntas sobre o uso preventivo de KI ( Iodeto de Potássio) para Acidentes Radiológicos, antecipando que a comunicação social vai agarrar o tema e “o medo vende”.
Publicando a imagem da publicidade ao IOB9, a SPMUE fala “publicidade enganosa com doses homeopáticas” e remetem para orientações dos Estados Unidos sobre os riscos de exposição a radiação e dosagens indicadas numa situação desta natureza e que salvaguardam que este tipo de produtos, usados para inundar a tiroide de iodo imediatamente antes ou depois de um acidente nuclear, por forma a minizar a absorção de iodo radioativo, e sempre por indicação das autoridades locais, listando também as dosagens preconizadas que vão de 16mg a 32 mg em crianças até aos três anos de idade, 65 mg até aos 18 anos e 130 mg nos adultos. Dosagens que não constam em nenhum dos suplementos e comprimidos com iodeto de potássio vendidos em Portugal nas farmácias, confirmou o i junto de fonte da Sociedade Portuguesa Medicina de Urgência e Emergência.
Associação Nacional das Farmácia vai emitir orientações
Ao i, Ema Paulino, presidente da Associação Nacional das Farmácias, corrobora este alerta, confirmando que desde sexta-feira se sentiu um aumento de pedidos ao balcão das farmácias e adiantou que estão a ser ultimadas orientações para transmitir aos farmacêuticos durante esta semana para ajudar a responder aos utentes. “Aquilo que está comercializado em Portugal em termos de medicamentos, perante as dosagens que são usadas neste tipo de situação, não se justifica de todo estar-se adquirir. Por um lado são medicamentos sujeitos a receita médica, por outro lado a quantidade não tem nada a ver com aquela que é preconizada”, disse ao i a responsável, sublinhando que é essa a informação que será reforçada junto das farmácias, com orientações para os “esclarecimentos necessários” aos utentes que cheguem ao balcão com este pedido.