Acionados os planos de emergência na ilha de São Jorge, a população tem vivido a crise sísmica dos últimos dias com ansiedade e os preparativos possíveis para um cenário de evacuação. Ao telefone com o i, Isabel Tavares Mendes, natural do continente e a viver há sete em Velas, diz que dorme pouco desde sábado, quando sentiu o primeiro abalo às 16h21. “É muita ansiedade, sinto-me quase num trabalho de parto”, descreve. Trabalha no snack-bar Livramento ‘O 30’, em frente aos bombeiros de Velas, e as movimentações e sucessivas reuniões indiciam o estado de alerta que tomou a vila. “A informação que temos é que se tocarem os sinos nos devemos dirigir para os pontos de encontro”, explica, remetendo para as informações que a autarquia tem vindo a disponibilizar.
Tem já preparada uma mala com poucos bens em caso de necessidade de evacuação, mas sente que isso de pouco valeria quando se vai comparando o cenário de uma erupção na ilha com o que se viveu em La Palma. “Vim para aqui para reorganizar a minha a vida e agora com isto não sei o que pensar”, diz. Larissa, natural do Brasil e chegada a Velas há apenas três meses, refere o mesmo sentimento de ansiedade e preocupação. Também já tem uma mochila preparada com artigos básicos, enlatados e documentos e explica que se está à espera, fazendo por estar a par das orientações. “Preparados nunca estamos”.
Nas conversas, quem tem memória compara a sucessão de sismos dos últimos dias, mais de 1300 desde sábado, com a crise sísmica de 1964 na ilha. Depois de sucessivos pequenos sobressaltos, Velas sofreu um violento sismo a 15 de fevereiro de 1964, que obrigou à evacuação de cerca de 5 mil pessoas para a ilha Terceira. Verificou-se na altura na altura uma das três erupções registadas desde que a ilha é habitada e a mais recente, sem consequências. As duas únicas erupções em terra remontam a 1580 e 1808, com relatos de fortes danos e vítimas mortais.
A prepararem-se para diferentes cenários, o presidente da Câmara Municipal das Velas anunciou ontem que foram mobilizados mais meios aéreos e um navio e que está também a ser preparado um campo militar no concelho da Calheta, para o caso de ser necessário. “O plano que está definido é que as pessoas sejam colocadas todas na zona da Relvinha, Ribeira Seca, sendo que o centro de Saúde da Calheta será o de referência”, explicou Luís Silveira, citado pela Lusa.
O autarca identificou como a “área mais crítica a zona entre as Velas e os Terreiros, onde residem três mil pessoas”, sendo que o concelho tem cinco mil habitantes. Ontem, em comunicado, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, que está a acompanhar a crise sísmica junto com o Centro de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos Açores (CIVISA) e Proteção Civil, admitiu que dos mais de 1300 sismos registados, mais de 100 podem ter sido sentidos, apelando à população para preencher um questionário. “A origem desta sismicidade pode estar relacionada com a ascensão de magma num dique magmático, fenómeno esse que provoca fragmentação das rochas em profundidade o que se traduz em libertação de energia elástica sob a forma de sismos”, explicou.
À Visão, o geólogo José Madeira disse não haver evidência de uma erupção iminente, mantendo-se vários cenários: uma crise sísmica e sismos de pequena magnitude como já houve no passado, que desvanece; a hipótese de poder haver, em sequência, um sismo de média-alta intensidade ou verificar-se uma erupção, em terra ou no mar.