A NATO quer enviar para a Ucrânia equipamento para “proteger contra ataques químicos, biológicos, radiológicos e nucleares”, anunciou o secretário-geral da aliança, Jens Stoltenberg, esta quarta-feira, uma oferta que pretende ver aprovada na cimeira marcada para hoje. É que, à medida que aumenta a frustração do Kremlin, com os seus avanços travados e até a enfrentar contra-ataques no território que conquistou (ver texto ao lado), crescem os receios de que a guerra na Ucrânia, o maior conflito na Europa desde a II Guerra Mundial, ganhe ainda maiores proporções.
“Estamos preocupados quanto ao uso de armas químicas ou biológicas”, frisou Stoltenberg. “Qualquer uso de armas químicas iria mudar totalmente a natureza do conflito”, reforçou este antigo primeiro-ministro norueguês. “Seria uma grosseira violação da lei internacional e teria amplas consequências”.
Não é de espantar que a NATO esteja particularmente preocupada com a potencial utilização de armas químicas na Ucrânia, algo que tem motivado sucessivos alertas das secretas ocidentais. Não só se trata de algo que os russos conhecem bem – foram usadas pelo seu aliado Bashar Al-Assad durante a guerra na Síria, onde Moscovo testou as suas atuais doutrinas militares após modernizar das suas forças armadas – como as alegações do Kremlin de que a Ucrânia estaria a preparar um ataque químico contra os invasores têm sido vistas como uma “operação de falsa bandeira”, para justificar o uso destas armas proibidas pelas forças russas.
É feita a mesma leitura quanto às manchetes na imprensa russa que denunciavam que os Estados Unidos estariam a desenvolver armas biológicas em laboratórios secretos na Ucrânia. “Dezenas de laboratórios financiados pelo Pentágono estavam a levar a cabo programas biologico-militares”, declarou Putin, num vídeo divulgado pela Russia Today. “Estavam a experimentar com estirpes de coronavírus, antrax, cólera”.
De facto, no início do conflito, a Organização Mundial de Saúde (OMS) pediu às autoridades ucranianas que destruíssem as suas amostras de patogénicos – essenciais para a investigação médica normal – para evitar que a destruição de laboratórios no caos da guerra não os libertasse entra a população, avançou a Reuters. Mas ainda a semana passada o responsável das Nações Unidas para o desarmamento, Izumi Nakamitsu, assegurou que não há sinais de quaisquer investigação de armas biológicas na Ucrânia. Tratam-se de “bizarras da conspiração”, que podem servir de “operação de falsa bandeira”, reiterou a embaixadora dos EUA na ONU, Linda Thomas-Greenfield.
Receios do terror nuclear No entanto, as preocupações da NATO também passam por um eventual ataque nuclear à Ucrânia, tendo Stoltenberg apontado o dedo à “bravata nuclear” de Putin, que colocou as suas forças nucleares em alerta máximo logo no início da guerra.
A primeira coisa que nos vem à cabeça é a imagem das mais de 1500 ogivas nucleares de longo alcance russas prontas a disparar a atravessar os céus rumo à UE e à América do Norte, seguidas da retaliação dos EUA, França e Reino Unido, assegurando a destruição de boa parte do planeta em minutos. É o receio desse cenário apocalíptico que tem impedido o Ocidente de intervir ativamente no conflito. Mas analistas têm alertado sobretudo para as cerca de duas mil armas nucleares táticas da Rússia. Ou seja, bombas nucleares mais pequenas e com curto alcance, produzidas para serem utilizadas no campo de batalha.
Na prática, as armas nucleares táticas de Putin podem ser disparadas a partir dos camiões lança-mísseis Iskander-M – que estão a ser usados para bombardear cidades ucranianas, servindo também para atirar as temidas bombas de vácuo ou de fragmentação – ou instaladas nos mísseis Kalibr, lançados a partir de submarinos ou navios.
As forças do Kremlin “podem não ver isto como cruzando este grande limite nuclear”, avisou Patricia Lewis, diretora do programa internacional de segurança da Chatham House, à BBC. No que que toca às armas nucleares táticas, “podem vê-las como parte das suas forças convencionais”, salientou.
A questão é que quando os russos conduzem exercícios militares, há anos que estes incluem treinos na transição da guerra convencional para a nuclear. Sobretudo com o objetivo de recuperar vantagem num conflito com baixas pesadas, explicou Ulrich Kühn, perito nuclear da Universidade de Hamburgo, ao New York Times. “A probabilidade é baixa mas está a aumentar”, avisou. “A guerra não está a correr bem para os russos”.