Ucrânia reconquista cidades numa guerra cada vez mais negra e nublosa

Exército ucraniano anunciou recuperação de Irpin, a nordeste de Kiev, e também de Trostyanets.  Acusação de envenenamento de negociadores ucranianos e de Roman Abramovich marca início da quinta semana do conflito.

Irpin e Tostyanets. A quinta semana de guerra na Ucrânia arrancou com as autoridades ucranianas a anunciar a recuperação de duas cidades violentamente bombardeadas às forças russas, a primeira no nordeste de Kiev, e a confirmação da estabilização da situação nas cidades de Trostyanets, Poltavka e Malynivka na região de Sumy, no leste do país, que faz fronteira com a Rússia. Mas no dia em que era esperado um retomar de negociações, as informações sucederam-se de parte a parte, contraditórias como têm sido nas últimas semanas. 

A Reuters avançou de manhã que Putin tinha demonstrado estar pronto para iniciar conversações tendentes a um cessar fogo, mas ao final do dia o Finantial Times avançava que a Rússia já não exigia que a Ucrânia seja “desnazificada” e que admite uma adesão do país à União Europeia desde que permaneça fora da NATO. 

Citando fontes com informações sobre as conversações que deverão ter lugar esta terça-feira em Istambul, na quarta ronda de negociações desde o início da invasão a 24 de fevereiro, o Finantial Times avançava que o documento base do encontro não contém três dos elementos considerados centrais por Moscovo até aqui: a desnazificação, a desmilitarização e a proteção da língua russa na Ucrânia. Mas não está previsto um encontro direto entre Putin e Zelensky.

E o ceticismo, que tem sido o sentimento mais comum no Ocidente sobre as reais intenções do Kremlin nestes encontros, mantém-se, ontem adensado com a notícia, avançada pelo Wall Street Journal, de que negociadores ucranianos e o oligarca russo Roman Abramovich terão tido sintomas compatíveis com envenenamento depois de uma das primeiras reuniões que tiveram lugar em Kiev no início do mês. 

O jornal avançou com a história com o site de investigação Bellingcat e os contornos eram ontem pouco claros. Os sintomas terão passado por irritação cutânea e dos olhos, mas um oficial norte-americano citado pela Reuters sob anonimato admitiu depois que os sintomas poderão ter resultado de condições ambientais e não de envenenamento, que sugeria um possível envolvimento do Kremlin, que na semana passada confirmou que Roman Abramovich participou numa fase inicial das negociações russo-ucranianas, tendo chegado a ser defendido por Zelensky como tendo um papel importante nesse processo aquando das sanções determinadas contra oligarcas russos. 

Entrevista enfurece Kremlin Esta segunda-feira, e depois de ameaças do regulador de media russo, o site noticioso russo Meduza, dos poucos órgãos independentes no país, avançou mesmo com a publicação de uma primeira entrevista do Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky a jornalistas russos. “Minutos antes desta entrevista ser originalmente publicada, o Roskomnadzor, agência de censura russa, pediu que nenhum órgão russo a publique”, lia-se ontem no site noticioso, que publicou a entrevista feita por Zoom pelas 16h45. “Não é apenas uma guerra, é muito pior”, titulou a Meduza, numa extensa entrevista de 90 minutos com o líder ucraniano. Segundo o jornal, depois de Zelensky ter considerado trágica a tentativa de censura de Moscovo, Dmitry Peskov, citado pela Meduza, disse não ter medo do que diz o ucraniano. Ainda de acordo com o site Meduza, o ministro dos Negócios Estrangeiros Sergey Lavrov anunciou que o Kremlin prepara um decreto para proibir a entrar na Rússia de cidadãos de países inimigos.

Neste clima extremado em que parece improvável um cessar-fogo imediato, agudiza-se a tragédia humanitária. Esta segunda-feira não estiveram em vigor corredores humanitários, com a situação em Mariupol a manter-se como uma das mais críticas. Segundo o presidente da câmara da cidade, Vadym Boychenko, há ainda 160 mil pessoas encurraladas na cidades que precisam de urgente assistência e evacuação. Segundo o autarca, estimam-se que tenham morrido cinco mil pessoas em Mariupol, entre as quais 210 crianças.