Numa altura em que a agricultura nacional enfrenta vários desafios como a invasão russa na Ucrânia ou a seca, a Pordata divulga um raio-x do setor. Uma das principais conclusões da recolha de dados, levada a cabo a propósito do Dia da Produção Nacional, é que o setor emprega cada vez menos trabalhadores. Em 1989, o nosso país contava com 1,5 milhões de agricultores – o que correspondia a cerca de 16% da população residente – ao passo que, em 2019, o número de trabalhadores era de apenas 650 mil, o equivalente a 6% da população residente.
Os dados da Pordata e também do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que, nesse período, Portugal perdeu cerca de 900 mil trabalhadores nesta área, o que dá uma média de 30 mil trabalhadores por ano.
A quebra mais acentuada viria a acontecer entre a década de 1989 e 1999, em que deixaram a profissão cerca de meio milhão de trabalhadores.
Ainda assim, e apesar de esta perda ser transversal a todos os países da União Europeia – para o que muito contribuiu a mecanização e a introdução de sistemas de aumento da produtividade –, Portugal ainda é o quinto país com mais empregados agrícolas por habitante.
Mas há outros dados. Diz a Pordata que a mão-de-obra agrícola “apresenta características sociodemográficas diferentes do perfil do conjunto da população empregada em Portugal”. Assim, a mão-de-obra agrícola é mais masculina. Os homens representam 56% dos trabalhadores agrícolas versus 51% da população empregada.
E é também mais envelhecida. Os dados mostram que mais de metade (60%) dos trabalhadores agrícolas têm 55 ou mais anos. Em 2019, essa faixa etária representava apenas 21% da população empregada.
Os dados mostram ainda que a população que se dedica à agricultura conta com menos qualificações: mais de 52 mil trabalhadores não sabem ler nem escrever (8%), enquanto quase um terço da população empregada já tem o ensino superior.
No que diz respeito ao salário médio dos trabalhadores do setor da agricultura e pescas, situa-se nos 823 euros, um valor que representa menos 21% do que entre os restantes trabalhadores por conta de outrem. “São menos 219 euros por mês. Só no setor dos alojamentos e restauração se ganha menos”, diz a Pordata.
Cereais em quarto lugar
Ao longo dos últimos anos, muito mudou no panorama agrícola português. Em 2020, com um milhão de toneladas, os cereais eram a quarta cultura agrícola com a maior produção em Portugal. No entanto, já tinha sido a principal, com uma produção de 1,7 milhões de toneladas, corria o ano de 1986.
Atualmente, antes dos cereais, estão as culturas forrageiras (ervas para alimentar animais, 4,4 milhões de toneladas), as principais culturas para indústria (1,3 milhões toneladas) e as culturas hortícolas (1,2 milhões de toneladas).
As contas da Pordata mostram que entre 1986 e 2020, as principais leguminosas foram a cultura agrícola “que sofreu maior queda na produção em termos relativos (-86%)”. O olival duplicou a sua produção, “sendo a cultura agrícola com maior ganho na produção”.
Mas é diferente no que diz respeito à superfície ocupada. Nos dias de hoje, são o olival (4,1% do território), cereais (2,3%) e vinha (1,9%), as três principais culturas agrícolas que mais superfície ocupam no país. Em 1986, eram os cereais que ocupavam o primeiro lugar (9,5%), seguidos do olival (3,7%) e da vinha (2,8%).
Assim, desde 1986 e até 2020, as principais leguminosas secas foram a cultura agrícola que perdeu mais superfície em termos relativos (-91%). Em contrapartida, os principais frutos de casca rija foram a cultura agrícola que mais superfície ganhou (+87%).
Portugal, como se sabe, é conhecido pela qualidade do seu vinho e azeite. Segundo os dados, em 2020, o país foi o 4.º maior produtor de olival (723 mil toneladas) entre oito países da União Europeia com produção nesse ano. Um ano antes, em 2019, o país atingiu o recorde de produção de azeite, com 1,5 milhões de hectolitros (hl), o equivalente a 15 litros de azeite per capita.
Já no que respeita ao vinho, em 2020, Portugal foi o 5.º maior produtor de vinha (853 mil t) da União Europeia, entre 19 países produtores nesse ano. No ano passado, foram produzidos 7,4 milhões hl de vinho, o valor mais alto desde 2006, e que equivale a 71 litros de vinho per capita.
Paisagem agrícola
A Pordata não tem dúvidas: a paisagem agrícola nacional “mudou muito: explorações agrícolas cada vez maiores, mais exploradas por empresas e ocupadas por pastagens permanentes destinadas ao gado”.
Mas vamos a números que ilustrem esta diferença. Em 2019, a superfície agrícola utilizada ocupava 43% do território nacional. Três anos antes, em 2016, Portugal era o 16.º país da União Europeia onde a agricultura ocupava maior parte do território nacional. Mas a verdade é que desde 2003 que a superfície agrícola em Portugal se mantém “sensivelmente inalterada”.
O nosso país conta com cada vez menos explorações agrícolas e os números não são animadores: em 30 anos reduziu em mais de metade o seu número (quase 600 mil em 1989 para menos de 300 mil em 2019). “As maiores reduções ocorreram entre 1989 e 1999 (menos 182 mil) e 1999 e 2009 (menos 109 mil), mantendo-se um número de explorações agrícolas relativamente estável desde então”, diz a Pordata.
Aos dias de hoje, 9% das explorações são de média a grande dimensão (com pelo menos 20 hectares) que ocupam 4/5 do território (79%). Há 30 anos eram 4% e ocupavam pouco mais de 3/5 (62%). “Consequentemente, a dimensão média das explorações agrícolas em Portugal duplicou em 30 anos: de 7 para 14 hectares”.
Os dados mostram também que a riqueza criada pela agricultura no ano passado foi de 3,5 mil milhões de euros. “Descontando a inflação acumulada ao longo dos anos, este valor tem vindo a diminuir desde o início dos anos 80. Nessa década, a agricultura gerava mais do dobro da riqueza atual, atingindo o valor mais baixo em 2012”, lê-se na nota.
2021 foi, aliás, o segundo melhor ano de produção agrícola do século XXI: 9,2 mil milhões de euros (61% diz respeito à produção vegetal e 33% à pecuária), só superado pelo ano 2001.
Os dados da Pordata falam também em ajudas para o setor: em 2020, o nosso país recebeu 170 milhões de euros em ajudas ao investimento na agricultura. Em 1989, chegou a receber 2,5 vezes mais descontando a inflação. “Foi o valor mais alto desde que entrou na União Europeia. A preços constantes, os outros máximos foram registados em 1992, 1995, 2003 e 2013”.