Dia 25 de Abril de 1965. O mais importante jogo da seleção nacional contra a Checoslováquia. No Grupo 4 de classificação para o Mundial de Inglaterra, Portugal já conseguira duas vitórias frente à Turquia (5-1 em casa; 1-0 fora). Em Bratislava (agora Eslováquia), uma vitória abrir-nos-ia às escâncaras os portões da Mancha. Frente aos tão temidos vice-campeões do Mundo (perderam a final de 1962 com o Brasil), os acontecimentos pareciam destinados a jogar contra as ambições portuguesas. Uma tempestade de chuva copiosa e vento incessante abateu-se sobre o Slovan Stadion e, ainda por cima, logo no terceiro minuto, Fernando Mendes chocou violentamente com o médio checo Kvasnak e ficou lesionado com gravidade, desconfiando-se desde logo de rotura de ligamentos do joelho. O jogador do Sporting, um dos maiores cavalheiros que conheci no futebol, ainda não o sabia, mas esse fatídico minuto de Bratislava marcaria o final abrupto da sua carreira.
Sem poder recorrer a substituições, por via dos regulamentos do Campeonato do Mundo, Portugal via-se obrigado a jogar todo o resto da partida em inferioridade numérica. Contra a intempérie e contra a infelicidade, os dez homens que ficaram em campo (José Pereira, Festa, Germano, José Carlos, Hilário, Coluna, José Augusto, Eusébio, Torres e Simões) seriam os protagonistas de um dos momentos mais refulgentes e sensacionais da história do futebol português. José Augusto recuou para o lado de Coluna, e o ataque ficou entregue ao esforço de Torres, ao azougue de Simões e à grandeza de Eusébio.
Aos 21 minutos, Eusébio recolheu a bola junto à linha de meio-campo e começou a correr em direção à área checa; Pluskal e Popluhar foram em sua perseguição, mas não conseguiram deter a sua força extraordinária; descaído sobre a direita, Eusébio dispara um remate fortíssimo e colocado: a bola entra junto ao poste, impossível de defender por Schroiff. Eusébio sempre afirmou que tinha sido uma dos melhores golos da sua vida. O estádio emudeceu com a sua potência física que conseguira arrasar dois dos mais poderosos médios-centro do mundo. A Pantera Negra misturou-se com a tempestade e deferiu um raio fatal.
A resistência! À avalanche adversária que se seguiu, responderam os portugueses com uma serenidade extraordinária na defesa. António Simões desdobra-se incansavelmente em funções defensivas e ofensivas e é um perigo constante para a defesa contrária graças aos seus dribles e simulações. José Carlos e Hilário tornam-se imponentes. Mas há ainda um minuto fundamental: o minuto 43. Kvasnak entra na área portuguesa, leva Festa a seu lado; o jogador do FC Porto estica a perna, talvez tenha tocado primeiro na bola, mas derruba o seu opositor. Penalti!, diz o árbitro Atanas Stavrev, que veio de Sófia, na Bulgária.
Os portugueses reclamam, mas não há nada a fazer. A vitória está agora nas mãos de José Pereira, a quem chamam o Pássaro Azul, apenas internacional pela primeira vez na semana anterior, em Istambul. E é ele quem a segura.
O remate de Masny destina a bola junto ao poste, mas o Pássaro voa em sua direção e sacode-a. A luta irá continuar por toda a segunda parte, mas a vontade lusitana é cada vez mais inquebrantável.
Finalmente, o Campeonato do Mundo está ali ao nosso alcance. O dia 25 de Abril de 1965 tornava-se inesquecível. Sobre ele, escreveu assim Alfredo Farinha, o enviado-especial de A Bola: “O jogo com os checoslovacos foi, para nós, que o vimos, o vivemos, o sofremos e, por último, gozámos a inefável sensação de euforia que o resultado final nos proporcionou, um jogo extraordinário; mas, para aqueles que não tiveram a felicidade de o presenciar, ficará para sempre incompletamente descrito, porque é inimaginável, porque era preciso ter estado cá para ser possível apreciá-lo em toda a sua amplitude e grandeza”.