Os episódios de calor extremo vividos em Portugal no verão do primeiro ano da pandemia tiveram um efeito maior do que seria expectável na mortalidade, com cerca de 1500 mortes em excesso associadas à exposição ao calor, mais 50% do que seria esperado para condições meteorológicas semelhantes num período pré-pandemia sem constrangimentos. A conclusão foi publicada no início deste ano no “Journal of Biometeorology”. Pedro Sousa, meteorologista do IPMA e um dos autores, explica ao i que o trabalho visou fazer uma análise do impacto das ondas de calor de 2020, concluindo que terá havido “um excesso de morte evitável” para que podem ter contribuído uma menor acessibilidade aos cuidados de saúde, também por receio da população, algo suscitado por outros estudos que se debruçaram sobre o aumento das mortes por acidentes cardiovasculares, cujo risco também aumenta durante ondas de calor.
No artigo, os investigadores recordam o impacto que a grande onda de calor que varreu a Europa no verão de 2003 teve no aumento da sensibilização e medidas de mitigação, admitindo que o foco na covid-19 acabou por fazer recuar nos avanços dos anos anteriores. Para Pedro Sousa, continua a ser necessário reforçar a sensibilização e a educação da população: “As pessoas muitas vezes não têm noção do quanto se morre em Portugal com o calor e o frio”. No verão de 2020, o calor chegou a representar em julho mais 45% de mortes por dia. O investigador alerta que se a sensibilização e os cuidados com os mais vulneráveis ajudam a mitigar os impactos, parte do excesso de mortalidade que se tem verificado ao longo dos anos em Portugal em episódios de frio e calor extremo se deverá também a “problemas estruturais” como o parque habitacional e a dificuldade de aquecimento ou arrefecimento das casas.