A discussão acerca da invasão russa da Ucrânia dominou a cimeira dos G7, terminada na segunda-feira, e naturalmente também está no topo da agenda da cimeira da NATO iniciada nesse mesmo dia, em Madrid. Aliás, a guerra transformou a própria natureza desta organização, apontam analistas, reforçando-a e unindo-a, quando ainda há três anos era dada como estando em “morte cerebral” pelo próprio Presidente francês, Emmanuel Macron.
Agora, além do envio de apoio militar à Ucrânia, a NATO procura reformular toda a sua estratégia para os Estados bálticos, considerados há muito o calcanhar de Aquiles da aliança face à Rússia. E a ontem a NATO até conseguiu convencer a Turquia, que tem tentado manter uma postura de mediador face à Rússia, a apoiar a candidatura da Finlândia e Suécia à aliança.
“Folgo-me em anunciar que agora temos um acordo”, declarou o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, perante os jornalistas, saudando um “começo histórico” para esta cimeira. Mas claro que, para conseguir que a Turquia – que nos últimos anos, por um lado, causou revolta no seio da NATO ao comprar baterias de mísseis russas S-400, mas que, por outro lado, também vendeu uma frota dos seus drones Bayraktar TB2 à Ucrânia, tendo estes sido considerados cruciais para travar a ofensiva russa – mudasse de posição, teve de haver cedências.
Uma das principais objeções do Governo de Recep Tayyip Erdogan à entrada da Finlândia e Suécia na NATO estava a sua acusação de que estes abrigavam militantes do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), independentistas curdos que Ancara considera ser uma organização terrorista. Mas a promessa pública da Finlândia, de que enquanto Estado-membro da NATO “se irá comprometer plenamente com os documentos e políticas de contraterrorismo da NATO”, indica que Erdogan “conseguiu o que queria” destes países nórdicos, apontou a France Press.
Avanços Na prática, esta tem sido uma cimeira com avanços significativos para a NATO, ao mesmo tempo que o discurso – sobretudo vindo de Londres, que nos últimos meses se tem afirmado como um dos principais preponentes de uma linha dura contra Vladimir Putin – se vai tornado cada vez mais acesso. “Este é o nosso momento 1937”, considerou o novo chefe do exército britânico, o general Patrick Sanders, esta terça-feira, referindo-se ao momento antes do início da II Guerra Mundial, durante o qual o primeiro-ministro do Reino Unido, Neville Chamberlain, tentou apaziguar Hitler.
“Estamos a viver um período da história tão profundo como aquele que os nossos antepassados viveram há 80 anos”, continuou o general Sanders, que nas últimas semanas tem apelado a que o exército britânico se prepare para a possibilidade de ter de combater na Europa continental. “Agora, como então, as nossas escolhas terão um impacto desproporcional no nosso futuro”, rematou.
Já a discussão dos planos para um reforço adicional do flanco leste na NATO também mostram algum receio de uma escalada. Está a cima da mesa aumentar o número de tropas da aliança em estado de alerta para mais de 300 mil.
A BBC avançou que no cerne desta proposta está o redesenhar da defesa dos Estados bálticos, ou seja, Estónia. Letónia e Lituânia. De momento, esta baseia-se na colocação de pequenos contingentes da NATO – numa missão que incluiu efetivos portugueses – nestes países, como fator de dissuasão a uma potencial invasão da vizinha Rússia.
No entanto, também é amplamente claro que estes contingentes, mais as forças nacionais dos países bálticos, muito dificilmente conseguiriam travar uma ofensiva russa. Sobretudo se o Kremlin, como esperado no caso de um conflito convencional, decidisse cortar o corredor Suwalki, que liga o seu enclave de Kaliningrado ao resto da Rússia, o que poderia isolar totalmente os países bálticos do resto da aliança. Daí que estes à muito peçam reforços, que parecem mais próximos de chegar.
“Mas a questão é”, questionou Frank Gardner, o correspondente da BBC para a Defesa. “Será que a NATO de facto tem os recursos humanos e o dinheiro para sediar ainda mais forças tão longe de casa?”