Casas eficientes é algo de que muitos já ouviram falar mas que talvez poucos saibam do que exatamente se trata. Uma casa eficiente permite economizar energia – mas não falamos apenas de apagar as luzes que não precisamos que estejam acesas ou fechar as janelas para evitar a entrada de calor ou frio. Para ser considerada casa eficiente, deve reduzir o consumo desnecessário de energia e as emissões de gases de efeito estufa. E, para construir ou remodelar uma casa destas, é necessário, entre outros, a incorporação de materiais isolantes térmicos nas paredes, tetos, portas e janelas, bem como o uso de fontes de energia renováveis, como painéis solares e sistemas de armazenamento de eletricidade.
A eficiência energética é uma prioridade e, por isso, a Comissão Europeia está determinada a alcançar um parque imobiliário com emissão zero até 2050. É que é preciso ter em conta que a construção de edifícios representa cerca de 40% das emissões de carbono.
Mas serão estes objetivos ambiciosos para Portugal? “Na realidade temos até 2030 para garantir uma construção com emissões de carbono zero e muitos dos projetos que estão hoje em curso não preveem isso”, começa por explicar ao i, Nuno Garcia, diretor-geral da GesConsult. Por isso, diz que “é muito pouco realista as novas metas saírem do papel e concretizarem-se no espaço de apenas oito anos. Até 2050 pode parecer muito tempo, mas estamos a falar de duas gerações de projetos”.
Uma verdadeira corrida contra o tempo, e o especialista defende que “se a mentalidade atual não mudar já e a implementação de novas soluções não for imediata, este intervalo não vai ser suficiente para pensarmos nos projetos, definirmos as implementações e atingirmos os objetivos que estão definidos”.
Embora a sustentabilidade “seja um tema ‘quente’ na atualidade, e até sirva de fator diferenciador para alguns projetos, estamos apenas a dar os primeiros passos na matéria, há um caminho longo a percorrer, que precisa de ser muito disseminado, para que daqui a 10-15 anos todas as obras estejam apontadas para os requisitos de 2050”, aponta Nuno Garcia.
Apoios suficientes? Para dar uma ajuda a melhorar o desempenho energético das casas particulares, o Governo conta com alguns apoios no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), como é o caso do Vale Eficiência e do Programa Edifícios + Sustentáveis que, com dados até maio, já tinham ultrapassado as 106 mil candidaturas. E o Governo decidiu aumentar a dotação para um total de 96 milhões de euros.
Questionado sobre se estes apoios são suficientes, Nuno Garcia defende que “em matéria de sustentabilidade, os incentivos são sempre de menos. Tradicionalmente apresentam um limite desajustado ao que o particular tem de investir, sendo que as condições para o conseguir são tão burocráticas, que acabam por afastar quem os procura”. Os incentivos, argumenta, “têm de ser pensados a uma escala real e a maior parte dos projetos não tem uma dimensão suficientemente grande para causar impacto”.
São então necessários mais apoios? “Claramente que sim, até para diversificar e massificar soluções”, defende o responsável, que chama a atenção para que estes apoios podem até nem ser diretos. “Não pagar tantos impostos, receber isenção em algumas taxas, obter benefícios nos licenciamentos, seguir uma fiscalidade verde – todas estas são formas indiretas de incentivo”, lembrando que, adicionalmente, “a comunicação que é feita dos apoios criados para estimular a sustentabilidade também pode ser reforçada, para que cada vez mais pessoas tenham conhecimento e concorram”.
Numa altura em que as temperaturas estão cada vez mais altas, uma casa eficiente torna-se cada vez mais uma necessidade – tal como acontece no inverno com as baixas temperaturas.
Nuno Garcia analisa: “Somos o quarto país europeu com maior pobreza energética, o que significa que uma parcela elevada do orçamento doméstico é canalizada para as faturas de energia, sendo que, mesmo assim, somos incapazes de manter as casas quentes durante o inverno e frescas no verão”. Com temperaturas extremas, diz, “esta realidade faz-se notar ainda mais, porque não conseguimos casas termicamente confortáveis e gastamos muita energia a climatizá-las”. Assim, defende que “tem de existir um investimento grande no nosso parque habitacional, para que se garantam condições dignas de habitabilidade, ao mesmo tempo que se consuma menos energia e se reduza nas emissões de carbono”.
Mais despesas E, se para as famílias, tornar uma casa eficiente traz custos extra, para as empresas não é diferente. “É inegável que o impacto financeiro existe”, diz Nuno Garcia. “E não havendo ainda soluções massificadas, esse custo é grande”.
Na sua opinião, o caminho passa por “encontrar soluções com menor impacto, com a ajuda da evolução tecnológica para o minimizar”.
E deixa o alerta: “Não podemos ficar à espera de não termos água nas torneiras para percebermos que o custo dessa falta é muito superior à despesa que pagamos na fatura. Mas parece-me que não existe ainda uma noção do impacto que se vai sentir quando tivermos de racionar recursos porque eles simplesmente deixaram de estar disponíveis”.
Questionado sobre se as casas eficientes não passam de uma miragem em Portugal, Nuno Garcia é perentório: “Acho que na sua plenitude, as casas eficientes são, de facto, uma miragem, na medida em que não existem projetos que cumpram toda a check-list associada à sustentabilidade”.
E diz que é preciso conjugar técnicas e métodos construtivos, associar sistemas tecnológicos, pensar nos gastos em todo o ciclo de construção e utilização do edificado (materiais sustentáveis, isolamentos, aproveitamento de água e energia) “e isso não está massificado”. “Além de se observarem os projetos como um todo, a tendência também tem de se tornar global entre os promotores e existem resistências naturais a isso”, finaliza o diretor-geral da GesConsult.