O anúncio de um eventual aumento dos preços da energia na ordem dos 40% já este mês parece ter caído que nem uma bomba junto do Governo. As declarações foram feitas pelo presidente da Endesa, numa entrevista à Antena 1 e ao Jornal de Negócios, mas o i sabe que Nuno Ribeiro da Silva falou com João Galamba ainda antes de prestar essas declarações e que o secretário de Estado do Ambiente e da Energia estava informado de que um dos temas a abordar seria a subida do preço da fatura da luz. Ao i, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática remete apenas para o recuo por parte da elétrica.
Em causa estão as declarações da Endesa 24 horas depois, garantindo que irá manter os preços contratuais até dezembro para os clientes residenciais, cumprindo assim os compromissos estabelecidos e afastando a ideia de que as pessoas iam ter uma desagradável surpresa já em agosto.
Tudo parecia ter acalmado até ter sido divulgado ontem de manhã o despacho assinado por António Costa. “Perante as ameaças de práticas especulativas nos preços a praticar pela Endesa e o dever de o Estado proteger o interesse dos contribuintes na gestão dos dinheiros públicos, determina que os serviços da administração direta e da administração indireta do Estado não podem proceder ao pagamento de quaisquer faturas emitidas pela Endesa, independentemente do seu valor, sem validação prévia, por despacho do secretário de Estado do Ambiente e da Energia e para evitar a descontinuidade do serviço, devem os referidos serviços públicos e a ESPAP proceder cautelarmente a consultas de mercado, para a eventual necessidade de contratação de novos prestadores de serviço que mantenham práticas comerciais adequadas”, revela o diploma.
Como será aplicado? Até ao final do dia não era claro. Apenas que são vários os pagamentos que terão de passar pelo gabinete de Galamba. Só desde o início do ano foram publicados 69 contratos de fornecimento de energia com a empresa liderada por Nuno Ribeiro da Silva por parte de entidades públicas, revela o portal Base. Incluem escolas, universidades e hospitais, passando também por empresas públicas e autarquias. Ao todo, ultrapassam os 97 milhões de euros, a que acresce o IVA. Os últimos contratos publicados têm a data de segunda-feira. Um ajuste direto feito pela Companhia Carris de Ferro de Lisboa, no valor 1.109.910,00 euros, e uma compra da Ensiprof – Ensino e Formação Profissional, por concurso público, no valor de 63.719,49 euros.
Já no campo das autarquias, a de Loulé assinou um contrato com a elétrica por três anos, no valor de 9,2 milhões de euros, já em Sintra, a duração do contrato é menor, seis meses, mas ronda os sete milhões de euros. Com valores inferiores é possível encontrar outros exemplos, como Almada, Marinha Grande ou Aveiro, entre outros.
Também a Autoridade Tributária assinou contrato com a Endesa até ao final do ano, no valor de 3,5 milhões de euros, também o Instituto da Segurança Social acordou com a elétrica os seus serviços pelo mesmo período, no valor de 4,8 milhões de euros. E dentro da administração pública, há um contrato recente da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, de março e por um ano, no valor de 123 mil euros.
Quem vai ter aumentos Já no final do dia, António Costa, divulgou o preço médio no mercado ibérico de eletricidade (Mibel), falando de uma poupança média de 15,21% com este mecanismo. “Factos são factos. Todos os dias poupamos graças ao mecanismo ibérico”, disse no Twitter, numa altura em que os partidos pedem esclarecimentos mais detalhados (ver pag. 4).
E depois de a Endesa ter garantido que irá manter os preços até ao final do ano, o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, veio também afirmar que a EDP – o principal fornecedor do mercado elétrico liberalizado em quantidade de energia, logo seguido pela Endesa – irá manter os valores “para os seus clientes até ao final do ano”.
Para já, a Galp diz apenas que “está a avaliar o impacto das regras decorrentes da aplicação do mecanismo de ajustamento nos diversos cenários de evolução dos custos do gás natural e do valor do ajustamento imputado” e que a decisão sobre um possível aumento de preços “será tomada no curto prazo”.
Também a concorrente Goldenergy não se compromete com valores. Ao i, a elétrica diz que “o mecanismo ibérico para limitar os preços do gás acordado pelos Governos de Espanha e Portugal e aprovado pela União Europeia tem resultados benéficos para conter, até certo ponto, a escalada de preços no mercado grossista devido ao aumento dos preços do gás utilizado na produção de eletricidade”, acrescentando, no entanto, que “este mecanismo, que no geral representa um benefício, tem um custo que não está refletido no preço dos mercados grossistas e que visa compensar os produtores de energia elétrica a partir do gás natural face à diferença entre o preço de referência agora fixado e o preço efetivo de mercado do gás”.
E face a este cenário admite: “Ao dia de hoje, não temos ainda toda a informação disponível para quantificar o que o mesmo representa para a Goldenergy, pelo que é ainda prematuro definir qual será o impacto nos preços finais para os consumidores”. E recorda que, até à data, tem mantido os preços.
Já em relação ao mercado regulado, Duarte Cordeiro disse que “não só não vamos ter aumentos, como tivemos uma diminuição, neste semestre, de 2,6% nos preços”, lembrando que há uma “maioria” de clientes no mercado livre que está “protegida por tarifa fixa, por contrato que vai além” do final do ano.
Para já, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) disse apenas que estará “particularmente atenta” ao comportamento dos comercializadores relativamente à repercussão do impacto sobre os consumidores do mecanismo ibérico.
Recorde-se que a partir de setembro de 2006 todos os consumidores (domésticos e não-domésticos) passaram a ter o direito de escolha do seu comercializador de eletricidade. E só em 2011 se iniciou o processo de extinção das tarifas reguladas de venda a clientes finais de eletricidade e passaram a ser aplicadas as tarifas transitórias de venda a clientes finais que estão em vigor até 31 de dezembro de 2025.
Consumo bate recorde Numa altura em que os preços da energia fazem correr tinta, foi revelado que o consumo subiu 7,2% em julho em relação ao período homólogo, devido às temperaturas elevadas, tendo atingido, no dia 13, o valor mais elevado de sempre no verão – 163,5 GWh [gigawatts-hora] – ultrapassando o anterior máximo, registado em 2010, segundo os dados da REN.