O texto aqui publicado há três semanas, sobre as causas da pobreza e riqueza das nações, provocou reações opostas: houve quem o considerasse certeiro e quem achasse que estava errado de raiz.
Basicamente, eu afirmava que a riqueza e a pobreza das nações não depende dos governos mas dos povos.
Só que um leitor argumentava: «Isso não é verdade, porque os portugueses vão trabalhar para outros países e são ótimos profissionais. O problema não está, portanto, nas pessoas mas nos líderes».
Ora, este argumento, ao invés de contrariar o que escrevi, confirma-o.
Ou seja: enquadrados noutras estruturas, integrados noutros povos, os portugueses funcionam. Mas entregues à sua sorte, dependendo de si próprios, não conseguem sair da cepa torta.
E a História da humanidade está cheia destes exemplos.
Homens que viviam em estado praticamente selvagem, quando transportados como escravos para outras geografias contribuíam poderosamente para o desenvolvimento de sociedades muito avançadas.
Um outro leitor, concordando com o texto, lembrava uma frase do famoso livro de Adam Smith A Riqueza das Nações, escrito no último quartel do século XVIII, que rezava assim: «A riqueza das nações mede-se pela riqueza do seu povo, mais do que pela riqueza dos seus príncipes».
Se fosse ao contrário, se o desenvolvimento dos países dependesse dos governos e não dos povos, um estado da África profunda que tivesse a sorte de ter sido bem governado poderia ser hoje tão desenvolvido como a Suíça; inversamente, um país do Norte da Europa, que tivesse tido o azar de ser mal governado, poderia ter atualmente um rendimento per capita inferior ao de Portugal ou mesmo ao de Angola.
Ora, isso não cabe na cabeça de ninguém…
É curioso notar que, mesmo no interior dos países, se verificam diferenças entre o norte e o sul. O norte de Itália é muito mais desenvolvido do que o sul. E o Governo é o mesmo… Não quer isto dizer que se desresponsabilizem totalmente os governos pelas decisões que tomam. Não.
Mas o impacto dessas decisões é limitado pelas características de cada povo, pelas suas qualidades e defeitos, pelo seu estádio de desenvolvimento. E é temporário; num período mais longo esse impacto dilui-se. Até o efeito das revoluções se perde.
Julgo que, se não tivesse havido 25 de Abril, Portugal estaria hoje mais ou menos como está – com uma democracia política, uma economia de mercado, integrado na Europa. Ou até talvez estivesse um pouco melhor, tendo em conta os rios de dinheiro que se têm derretido.
Pense-se nos muitos milhares de milhões que entraram em Portugal depois do 25 de Abril: os fundos europeus (começados a chegar em 1981, há 40 anos), a dívida pública acumulada desde a revolução e a dívida externa (famílias e empresas) contraída no mesmo período.
Somem-se estes valores – e obter-se-á uma soma astronómica, que entrou no país e que em boa parte se sumiu. As cidades melhoraram, é certo, as estradas melhoraram, mas a capacidade produtiva pouco se alterou – e nalguns setores até regrediu.
A nossa distância para os países avançados da Europa não diminuiu – e fomos ultrapassados por muitos que estavam atrás de nós. Portugal poderia, pois, ter sido melhor governado. Mas não se pense que poderíamos ser um país desenvolvido como a Alemanha.
O nosso problema nunca foi o dinheiro. Dinheiro tem entrado muito – da Europa, no passado recente, do Oriente ou do Brasil, num tempo mais longínquo. Só que a questão está no povo – e não no dinheiro, no Governo ou nos recursos.
Há países de África que têm enormes recursos naturais e são muito atrasados, e países sem recursos naturais nenhuns, como a Suíça ou a Holanda, que são altamente desenvolvidos.
A riqueza dos países está na capacidade de trabalho dos seus povos, na sua capacidade de aprendizagem, na sua capacidade de organização, nas estruturas que constroem – e que depois se repercutem a todos os níveis da sociedade, até ao nível mais alto: o Governo.
Por isso os judeus foram para um território árido, onde vivia gente miserável, e aí construíram um Estado rico e poderoso.
Não há exemplo que ilustre melhor do que este a ideia de que o desenvolvimento de um país depende essencialmente da capacidade do seu povo.