Miguel Alves, agora ex-secretário de Estado Adjunto de António Costa, assinou três contratos, no valor de mais de 80 mil euros, com a Câmara Municipal de Lisboa (CML), em apenas um dia, em 2010. De acordo com a CNN Portugal, os contratos foram adjudicados por ajuste direto e tinham em vista a prestação de serviços de assessoria na autarquia, quando António Costa era presidente da CML.
Na altura, Miguel Alves, que tinha saído há apenas cinco meses do cargo de adjunto do então autarca de Lisboa, recebeu quase seis mil euros para exercer “serviços de assessoria jurídica” no gabinete da então vereadora Graça Fonseca, que mais tarde foi promovida a ministra da Cultura. Esse contrato tinha um prazo de execução de 47 dias. Outro dos contratos tem o valor de 23 700 euros e um prazo de execução de 245 dias; e o terceiro previa o pagamento de mais de 61 mil euros a Miguel Alves, para serviços prestados ao longo de 1035 dias.
Além disso, o valor obrigaria à realização de concurso público, uma vez que o limite é 75 mil euros, e que só separado em diferentes contratos com valores mais pequenos permitia a realização destes ajustes.
O último contrato, de 61 mil euros, não foi, no entanto, concluído, dada a intenção de Miguel Alves se candidatar às eleições autárquicas em Caminha, tendo a CML pago cerca de 50 mil euros ao antigo secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, que se demitiu na semana passada, na sequência da dedução da acusação pelo Ministério Público por um crime de prevaricação, no âmbito da Operação Teia.
Ao i, João Paulo Batalha, antigo presidente da Associação Cívica Transparência e Integridade, sublinha que estes ajustes diretos aconteceram depois de Miguel Alves ter exercido funções de adjunto de Costa na autarquia da capital, evidenciando uma espécie de “prolongamento do seu trabalho político” na CML. “O que António Costa fez enquanto presidente da câmara de Lisboa foi alimentar a mesma rede clientelar que sempre existiu nos municípios e da qual se serviram os principais partidos”, acusa.
No seu entender, a situação, além de ser “muitíssimo problemática do ponto de vista ético”, pode abrir dúvidas também no campo da legalidade. “Estamos a falar de ajuste diretos aparentemente feitos com o fracionamento dos contratos de prestação de serviços para impedir um concurso público, portanto, pode mesmo haver uma ilegalidade, como uma violação do código de contratação pública”, esclarece.
Acreditando que a lógica subjacente é alimentar redes clientelares e “ter quadros partidários pagos com dinheiro público”, o dirigente da Frente Cívica aponta que as próprias máquinas partidárias ao alimentarem-se deste tipo de avenças “tornam praticamente impossível escrutinar o trabalho político que é efetivamente feito”.
“Muitas vezes a função que têm é muito mais partidária do que política na instituição pública que lhes está a pagar”, critica.
Novas eleições após renúncia Após ter sido reeleito no passado dia 4, Miguel Alves renunciou ao mandato de presidente da Federação Distrital do PS de Viana do Castelo. A estrutura socialista vai reunir-se com “urgência” para aprovar o calendário de novas eleições.
Em comunicado, o presidente da mesa da comissão política da Federação Distrital do PS de Viana do Castelo, Vítor Paulo Pereira, adianta que, no sábado, “mediante manifestação de vontade apresentada, por escrito”, Miguel Alves renunciou ao lugar de presidente que ocupava já há mais de seis anos.
“Como esta declaração unilateral de vontade não depende de aceitação externa, e o seu efeito se traduz na irreversibilidade e na cessação do exercício das funções que o cargo exige, convocarei uma reunião da Comissão Política da Federação, com caráter de urgência, para em tempo útil desconvocar o congresso distrital, que estava marcado, e aprovar o calendário das novas eleições”, esclarece na mesma nota.
Para Vítor Paulo Pereira, que é também presidente da Câmara de Paredes de Coura, “a palavra que se impõe é de agradecimento” a Miguel Alves “pelo trabalho que fez durante vários anos à frente da federação” e “que se traduziu num evidente ciclo de progresso e desenvolvimento para o distrito de Viana do Castelo”.
“Este ciclo que agora se encerra e o trabalho executado dignificou o PS e, por imperativo de justiça, impõe-se que seja feito esse reconhecimento público. Gratidão é o que devemos ao Dr. Miguel Alves”, refere ainda.