O Presidente da República parte hoje para o Qatar para marcar presença no jogo de estreia da seleção nacional no Mundial do Qatar, depois de o pedido de autorização para viajar entre esta quarta e sexta-feira ter recebido a aprovação da maioria parlamentar.
A deslocação tornou-se mais polémica depois das declarações a seguir à vitória de Portugal frente à Nigéria, em que Marcelo Rebelo de Sousa desvalorizou as violações de direitos humanos no país anfitrião do campeonato do mundo de futebol. Já ontem, horas depois de o Parlamento lhe ter dado luz verde, Marcelo tentou controlar os danos: “Depois de amanhã estarei a falar de direitos humanos no Qatar”, prometeu. Pelo menos é isso que conta fazer num encontro sobre educação para o qual está convidado a participar, à margem do Mundial de futebol.
Questionado sobre a “relevância da sua presença” num país que tem vindo a ser criticado precisamente por desrespeitar os direitos humanos, o chefe de Estado apontou que “é completamente diferente apoiar lá [a seleção]” e no Qatar “dizer o que se pensa sobre a situação política de lá”.
Marcelo lembrou ainda que, em 2010, quando a organização do campeonato do mundo foi atribuída pela FIFA ao Qatar, Cavaco Silva era Presidente da República e José Sócrates era primeiro-ministro. Nessa altura, “não houve nenhuma posição da comunidade internacional” sobre a decisão, lembrou.
“Havendo esse certame, que é um certame importante de projeção para Portugal, Portugal deve lá estar”, insistiu, rejeitando a interpretação de que qualquer deslocação a um país não democrático ou com problemas de respeito pelos direitos humanos “seria uma legitimação” desses regimes. “Essa não é a orientação da política externa portuguesa”, vincou.
Parlamento dividido A viagem do Presidente da República ao Qatar dividiu o Parlamento, mas também as duas maiores bancadas. A deslocação de Marcelo foi aprovada por larga maioria, com votos favoráveis do PS, PSD, PCP, a abstenção do Chega e os votos contra da Iniciativa Liberal, Bloco de Esquerda, PAN e Livre. Mas entre socialistas e sociais-democratas houve quem não alinhasse.
No PS votaram contra os deputados Alexandra Leitão, Isabel Moreira, Carla Miranda e Pedro Delgado Alves, já as abstenções foram dos deputados Maria João Castro, Miguel Rodrigues e Eduardo Alves. Outros deputados que seguiram a orientação de voto da direção da sua bancada quiseram deixar declarações de voto escritas relativamente ao que pensam sobre este assunto. Foi o caso dos socialistas Pedro Anastácio, Maria Begonha e Diogo Leão. No PSD houve igualmente três abstenções: dos deputados Hugo Carneiro, António Topa e Fátima Ramos.
Já o Chega, cujo líder André Ventura até tinha acusado os críticos de Marcelo Rebelo de Sousa de “hipocrisia”, acabou por abster-se na votação em plenário. Não por causa dos direitos humanos no Qatar, mas para salientar que este Presidente tem viajado muito. O líder parlamentar do partido, Pedro Pinto, sublinhou que Marcelo “já triplicou as viagens” feitas por Mário Soares e Ramalho Eanes. Por outro lado, não deixou de acusar quem vota contra, e “descobriu hoje que os direitos humanos no Qatar não são cumpridos”, de se guiar por “hipocrisia e demagogia barata”, perguntando: “Então quando há quatro anos o Mundial foi na Rússia?”.