Os pelos nos ovos…

O escrutínio a que os políticos estão sujeitos – tal como nós padres – não permite que haja qualquer falha, qualquer irregularidade, qualquer pecado.

Os problemas do Governo português ou, eu diria melhor, os problemas dos governantes portugueses têm feito correr muita tinta. É normal! É natural que exijamos dos nossos governantes o mesmo que eles exigem de nós, isto é, a máquina do Estado geral e das finanças em particular está tão bem montada que qualquer cidadão deste país é incapaz de pagar taxas e impostos no seu devido tempo. No mínimo, esperamos que, da mesma forma, quem governa esta mesma máquina, seja irrepreensível. 

Há, no entanto, uma questão que se me apresenta no momento que estamos a assistir: serão os nossos políticos todos corruptos, como parecem ser, ou haverá um fenómeno de Pânico Moral em que comecemos a ver corrupção por todo o lado? 

O escrutínio a que os políticos estão sujeitos – tal como nós padres – não permite que haja qualquer falha, qualquer irregularidade, qualquer pecado. Mas será possível? Será possível haver um padre imaculado? Será possível haver um político impecável? 

Penso não ser difícil responder objetivamente a esta questão. A resposta é: Não! Não é possível termos padres imaculados, políticos impecáveis, médicos sem maldades, professores intocáveis! 

Nós, acima de tudo, procuramos construir o céu na terra. Quisemos encontrar um modelo de sociedade impecável, governado por todos e para todos, sem princípios filosóficos apriorísticos, isto é, sem valores metafísicos. Os valores passaram a ser, apenas, uma construção da comunidade. E, na realidade, quisemos construir uma sociedade de santos, mas esquecemo-nos que nós somos tudo menos santos – o nosso coração tem, no seu interior, um veneno que nos leva a viver para nós próprios.

É verdade que vivemos numa sociedade mediática, onde o valor notícia se liga muito às más notícias e não tanto a boas notícias. Isto leva-nos a saber de cor o nome de todos os ministros e secretários de Estado ou mesmo de padres que agiram contra a lei, do que aqueles que agem coerentemente com os valores que defendem. O Papa Francisco lembrou uma vez acerca dos padres um ditado argentino: «Faz mais barulho uma árvore que cai do que uma floresta a crescer».

Eu também aprendi jornalismo e tenho esse bichinho dentro de mim. Ando sempre a procurar um pretexto para criticar a vida dos outros e humilhá-los. Eu bem sei que estes juízos que faço advêm de um pecado gravíssimo que me afeta a mim como a todos nós em geral: o Orgulho! 

Tenho um amigo italiano que quando eu estou a dizer mal disto ou daquilo me diz: ‘cerca il pelo nell’uovo’, isto é, ‘procuras sempre o pelo no ovo’. E é verdade! Sinto que isso é verdade em mim e na sociedade em geral: andamos todos à procura de encontrar um pelo no ovo da galinha! O ovo pode estar todo limpinho, mas andamos sempre a procurar alguma coisa por onde embirrar.

Na realidade, temos de assumir que não haverá nunca uma sociedade paradisíaca, com uns santinhos a deambularem de um lado para o outro. Os homens são e serão sempre falíveis. É verdade que não podemos admitir que se ultrapassem algumas linhas, mas também é verdade que precisamos de nos respeitarmos uns aos outros sem nos colocarmos a todos sob suspeita.

Eu, sinceramente, acho que se houvesse uma seleção de políticos depois de provas dadas na vida privada, seria muitíssimo melhor. Isto é, abolir, completamente, os políticos que o são por carreira. Há gente que começou nas Juventudes partidárias e que seguiu a carreira política sem nunca ter governado uma casa, uma empresa, um negócio – nada! Jesus diz que «quem não é fiel nas coisas pequena não poder ser nas grandes»!