O 5G chegou a Portugal com algum atraso em relação a quase todos os países da União Europeia mas está a recuperar e o número de estações de base instaladas no território nacional com esta tecnologia ascendia, no final do ano passado, a 5.842 estações, distribuídas por 302 concelhos (98%) e por 1.526 freguesias (49%).
Questionada sobre a situação nacional, fonte oficial da Anacom diz não considerar «que Portugal esteja atrasado no desenvolvimento do 5G», acrescentando que o leilão em que foram disponibilizadas diversas frequências, incluindo para serviços compatíveis com 5G «já terminou há mais de um ano, e desde essa altura os operadores têm vindo a instalar redes». O regulador acrescenta que «as obrigações impostas no âmbito do leilão 5G e que vinculam as empresas que adquiriram determinadas quantidades de espetro nesse processo de atribuição, tendo sido transpostas para os respetivos títulos dos direitos de utilização de espetro de radiofrequências, incluem metas específicas para o desenvolvimento de rede e cobertura 5G».
A Anacom deixa ainda exemplos: a MEO, a NOS e a Vodafone, numa primeira fase e até ao final de 2023, «têm de assegurar a cobertura de 75% da população de cada freguesia considerada de baixa densidade e de cada freguesia das ilhas disponibilizando o serviço de banda larga móvel». Depois, até ao final de 2025, por exemplo, «as obrigações fixadas preveem que 95% da população do país deverá dispor de serviços de banda larga, bem como 95% das autoestradas do país, principais itinerários ferroviários e redes de metropolitanos de Lisboa, Porto e Sul do Tejo».
A entidade liderada por João Cadete de Matos defende: «Não existem razões para que as metas estabelecidas não venham a ser cumpridas», acrescentando que «são diversas as potencialidades das tecnologias de 5.ª geração, que podem ser disponibilizadas em momentos distintos, como é o caso da existência de equipamentos específicos».
‘Não se pode dizer que recuperámos o atraso’
Ao Nascer do SOL, Rui Luís Aguiar, professor da Universidade de Aveiro e especialista neste setor, diz que este atraso não acontece só em Portugal, defendendo que existia um «conjunto de expectativas sobre a forma como o 5G ia funcionar», que passavam muito pela capacidade de intervir na sociedade em todas as diferentes áreas: transportes, energia, logística, etc. «Tecnicamente, o 5G que desenvolvemos é possível de o fazer mas é caro» e «as companhias só pagam isso se o mercado pedir», diz. E acrescenta: «Ora, se é muito fácil para mim ter a tecnologia, não é nada fácil para mim chegar às empresas, por exemplo de logística, e mudar os processos deles». É que, na opinião de Rui Luís Aguiar «preparámos uma tecnologia – e ainda estamos a preparar – para um contexto para o qual a sociedade está a reagir muito mais devagar».
Neste momento, o professor reconhece que as empresas estão a tentar perceber como capitalizar nas diferentes valências do 5G. «Começaram por implementar o 5G mais básico porque é aquele que sabem capitalizar».
Apesar de em Portugal termos começado mais tarde, há uma vantagem: «As empresas portuguesas foram capazes de tomar uma atitude mais cautelosa, analisando o que se está a passar nos outros países, onde o sucesso da implementação, tirando o mais básico, está a ser mais lento. Resultado? As empresas portuguesas – que obviamente não estão nisto para perder dinheiro – estão a tomar uma atitude cautelosa a ver se o mercado dos serviços mais avançados arranca. E só depois é que querem fazer os seus grandes investimentos», explica.
De forma geral, o professor da Universidade de Aveiro, diz que existe um atraso no 5G porque «é um negócio que envolve muito dinheiro e as empresas só estão dispostas a comprometer-se quando veem o retorno claro que aparenta ser possível na parte mais básica do 5G que é o 4G com mais velocidade. Não há uma pressão ou não há uma alavanca financeira que incentive as empresas a avançar ou a recuperar o atraso com o qual partimos».
No que diz respeito aos mais recentes dados divulgados pela Anacom, Rui Luís Aguiar entende que são um bom sinal e que as imposições do leilão estão a correr bem. Mas não se pode dizer que ultrapassámos ou que recuperámos o atraso, defende. Mas acrescenta que «do ponto de vista nacional, o que importa é a implementação do 5G como um mecanismo de transformação digital do país. E aí, sim, estamos atrasados. Feliz ou infelizmente os outros países na Europa não estão tão avançados como se esperava».
Já para o cidadão ‘dito comum’, essa é a parte do 5G «que está a correr melhor», trazendo «efetivamente uma internet mais rápida em melhores condições em mais circunstâncias». «A esse respeito, o 5G é uma tecnologia que está a ser muito bem sucedida e que o cidadão comum nem se apercebe. Mas tem a internet a funcionar muito melhor, deixa de ter tantas razões de queixa e acha que as coisas estão a funcionar bem sem se aperceber bem porquê», diz.
Ainda assim, ainda há muito a fazer. Apesar de já existir uma densidade razoável com 5G, o especialista questiona: «Mas não se quer 5G só nesses sítios, não é?», lembrando que existe cada vez mais se usa o work from home e a deslocalização do trabalho. «Quem estiver num grande centro populacional habitua-se a usar o telemóvel ou o tablet e ter sempre uma rede de qualidade». Mas em locais «mais calmos» no meio do Alentejo, Beiras, em Trás-os-Montes, «não há nenhuma razão para eu dever exigir e querer exigir o mesmo tipo de trabalho. E se nunca exigir isso, cada vez mais as pessoas ficam no Porto, Lisboa e grandes centros. A esse respeito, o 5G ainda tem um percurso grande a fazer, mesmo para o consumidor final», atira.
Mas claro, ainda estamos longe dos carros voadores. «Isso ainda vai levar muito tempo até chegarmos aí. Não há qualquer uso a esse respeito, não é uma coisa que não vai acontecer nos próximos cinco anos de certeza. Tranquilamente», avisa.
O que dizem as operadoras
João Teixeira, Chief Technology Officer (CTO) da Altice Portugal, defende que apesar «do longo e complexo processo de leilão do 5G e do atual período de contração económica, que se encontra em contraciclo com a atual necessidade de investimento para o cumprimento das obrigações de cobertura do 5G, o balanço do roll-out do 5G da Altice Portugal é bastante positivo».
Ao Nascer do SOL, o responsável defende que o trabalho que a empresa tem vindo a levar «coloca-a num lugar de destaque e liderança ao nível do mercado e do setor, com soluções que abrangem várias áreas da sociedade» e que o o investimento e aposta até agora realizados «têm sido fulcrais para que o país se reposicione rapidamente em termos de penetração de redes móveis de alto débito».
Sobre para quando a implementação do país a 100%, João Teixeira garante que a empresa está a cumprir «de forma escrupulosa» as obrigações de cobertura atribuídas pela Anacom na sequência do leilão, lembrando que o 5G da Altice já cobre 90% da população.
Para o próximo ano «e nos anos seguintes, o 5G vai continuar a ser uma das grandes apostas da empresa do ponto de vista de investimento, com o desenvolvimento e implementação de projetos e soluções que aportem mais valias à vida e ao dia a dia dos cidadãos e das empresas», garante o CTO da Altice. «Importa, no entanto, sublinhar que a adoção do 5G irá depender, principalmente, da evolução de todo o ecossistema que o integra, seja a nível de plataformas, soluções ou equipamentos, bem como mediante o papel que o consumidor final terá ao nível da utilização progressiva de equipamentos (ex: telemóveis) compatíveis com o 5G», defende João Teixeira.
Por sua vez, fonte oficial da Vodafone Portugal diz ao nosso jornal que «a demora na conclusão do leilão para atribuição de frequências do 5G levou a que Portugal se tornasse num dos últimos países da UE a disponibilizar comercialmente o acesso a esta rede de nova geração».
Apesar do atraso, a operadora diz ter partido para a implementação da sua rede em Portugal «beneficiando do know-how das várias operações do grupo na Europa e dos testes realizados antes do lançamento comercial», o que permitiu que a operadora começasse a disponibilizar o serviço a 30 de novembro de 2021, poucas semanas depois da atribuição das licenças de uso de frequências. E explica que há vários meses que a sua rede de última geração está presente em todas as capitais de distrito e das ilhas, «continuando a estender-se de forma progressiva a todo o país». Feitas as contas, neste primeiro ano de operação e até ao momento, cerca de 15% da base de clientes da Vodafone Portugal já usa a rede 5G.
A empresa liderada por Mário Vaz diz ainda que vai continuar o plano de expansão, lembrando que os tarifários terão 5G sem quaisquer encargos até 31 de março para que as pessoas se possam adaptar. E garante que «tem estado a trabalhar para garantir o cumprimento das obrigações resultantes do leilão 5G» e que o plano está a decorrer dentro do esperado mas que o setor atravessa constrangimentos comuns, «nomeadamente o impacto da inflação, sobretudo custos de energia (de que a Vodafone é grande consumidora) e dos combustíveis, além os distúrbios das cadeias logísticas que aumentam os preços e os prazos de entrega dos equipamentos».
Para Miguel Almeida, CEO da NOS, a operadora «sempre disse que iria liderar o 5G, entregando mais valor aos clientes e ao país, e abrindo caminho para mais inovação, competitividade e sustentabilidade». E acrescenta que esta foi a operadora que mais investiu no leilão. «Este compromisso e capacidade de entrega refletem-se na cobertura e velocidade da nossa rede, mas também nas parcerias que estabelecemos e nos projetos inovadores que implementamos. É com enorme orgulho que vemos tudo o que conquistamos ao longo do último ano, e que sabemos ter contribuído decisivamente para colocar Portugal no top 10 da UE em matéria de 5G».