O Governo apresentou esta quinta-feira em Almada, sob protestos, a versão final do programa "Mais Habitação", que foi aprovado em Conselho de Ministros.
No local esteve o primeiro-ministro, António Costa, o ministro das finanças, Fernando Medina, mas coube à Ministra da Habitação, Marina Gonçalves, anunciar as novas medidas: candidaturas abertas em contínuo no Porta 65 Jovem, criação do porta 65+ para quebra de rendimentos, proteger inquilinos com arrendamentos mais antigos, arrendar para subarrendar até 35% do rendimento da família.
O Governo quer também combater a especulação através da renda justa e revenda de 3 anos para 1 ano.
Uma discussão pública «bastante viva e participada», foi o resultado da consulta pública para as restantes medidas do programa Mais Habitação, garantiu esta quinta-feira o primeiro-ministro António Costa. As novas medidas do programa foram apresentadas ao som de fortes protestos e buzinadelas em frente ao Forte de Albarquel, numa manifestação em defesa do Alojamento Local. E, algumas medidas, poderão não ver a luz do dia, pelo menos, tendo em conta as últimas declarações de Marcelo Rebelo de Sousa que acenou poder vetar algumas das iniciativas do Executivo.
No que diz respeito a medidas, a ministra da Habitação, Marina Gonçalves, destacou que está a «complementar a resposta estrutural que está em curso de reforço das respostas públicas de arrendamento», acrescentando que «o primeiro objetivo é estimular novos projetos privados de arrendamento acessível, com os promotores como parceiros», avançou a ministra que destacou a «cedência de imóveis do Estado devolutos», uma «linha de financiamento bonificado, sustentável», «previsibilidade nas rendas desses projetos» e ainda «incentivos fiscais».
A ministra falou também de «uma nova geração de cooperativas», garantindo que será conseguido através de «parcerias entre o Estado, os municípios e o setor cooperativo».
Ora, entre as medidas está mais investimento em arrendamento acessível, o reforço de cooperativas de habitação e descidas nos impostos sobre o arrendamento.
O primeiro-ministro garantiu que a medida do arrendamento coercivo não se aplica aos territórios de baixa densidade populacional nem às regiões autónomas dos Açores e Madeira, para «garantir a devida tranquilidade» depois do «entusiasmo com que este tema tem sido debatido», que causou «alguma perplexidade ao primeiro-ministro». E apesar de todas as polémicas, o Governo fez apenas pequenos ajustes, em que são considerados para este efeito os imóveis classificados como devolutos há pelo menos dois anos. De acordo com as contas de António Costa: existem 6.444 casas classificadas como imóveis devolutos, referindo que «não queremos uma caça aos devolutos».
Uma iniciativa que poderá levar o Governo às barras do tribunal. «Toda esta legislação é de uma imoralidade a todos sentidos. Estamos a falar de uma violência que é exercida sobre uma certa classe, neste caso, é a classe dos proprietários», já veio garantir António Frias Marques, presidente da Associação Nacional de Proprietários. E dá um exemplo: «Imagine que tenho uma casa vaga porque estou à espera que a minha filha se case, o que é que acontece? Ai de quem se queira meter nessa casa, porque vou exercer o direito de resistência. O artigo 21.º da Constituição diz que todos temos o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os meus direitos, liberdades e garantias».
No que diz respeito ao alojamento local, o primeiro-ministro anunciou que as licenças atuais vão manter-se até 2030, sendo que só nesse ano serão reavaliadas pelos pelos municípios. «Quem quiser manter mantém e quem quiser transferir-se para o alojamento habitacional tem isenção de IMI e de IRS sobre os rendimentos prediais até 2024», disse António Costa depois de Fernando Medina, o ministro das Finanças, ter confirmado que se mantém a contribuição extraordinária para o Alojamento Local, mas que pretende baixar essa taxa dos 35% inicialmente propostos para 20%.
A tributação extraordinária não será generalizada e as restrições aplicadas ao Alojamento Local só vão aplicar-se a apartamentos e são os municípios a estabelecer qual o equilíbrio a existir entre habitação estudantil, alojamentos locais e outras formas de alojamento. É certo que as autarquias têm-se vindo a opor a estas restrições, considerando que tem sido uma atividade que tem vindo a dinamizar a economia das cidades.
No entanto, as guest houses ou hostels não serão abrangidos. «Todos os municípios que se tenham considerado em situação de carência habitacional não podem conceder novas licenças de alojamento local. Não podemos ter sol na eira e chuva no nabal», disse António Costa, acrescentando que «só este ano foram mais 2.017 habitações que deixaram de estar disponíveis para habitação e foram alocadas a esta atividade económica, o que tem um impacto muito grande no acesso à habitação» e que «exige regulação».
No que diz respeito ao programa Porta65 Jovem, um programa que permite ajudar os jovens portugueses a conseguir habitação consoante o seu rendimento, este vai permitir candidaturas de forma contínua. «Hoje, o Porta 65 Jovem funciona em três períodos de candidatura. Aquilo que promoveremos ainda este ano é uma abertura de candidaturas contínua, para que possa a todo o tempo responder às necessidades dos mais jovens», disse Marina Gonçalves.
Fim dos vistos gold
Para António Costa não há dúvidas: «Nada justifica existir um regime especial» e que por isso os vistos gold vão acabar. O primeiro-ministro deu números: desde 2012 e até agora permitiram a entrega de 11.758 vistos a cidadãos estrangeiros.
Assim, acaba «com um regime geral de atribuição dos vistos gold, sem prejuízo da admissibilidade de autorizações de residência para investimento nos termos do regime geral». Entre 2012 e 2023 o grosso destas autorizações de residência (89%) visaram exclusivamente a compra de imóveis. «Só em 22 casos houve criação de emprego», disse.
«Só em 22 destas 11.758 autorizações houve geração de emprego, portanto a concessão destes vistos deve continuar a poder decorrer nos termos da lei geral, nada justificando um tratamento especial», detalhou o primeiro-ministro, acrescentando que os vistos já concedidos e à sua renovação, «para dar segurança a todos aqueles que são titulares», no momento da renovação, e se cumprirem os critérios que já estão previstos, a autorização será convertida numa autorização de residência «normal, como qualquer outro estrangeiro que resida no nosso país».
E os processos pendentes, garantiu, «continuarão em apreciação e serão tramitados de acordo com a lei geral, que entretanto é nova e já prevê a concessão de autorização de residência para fins de investimento empresarial, atividades culturais, ou de investigação científica».
Mas a verdade é que este debate não acaba aqui, como garantiu o primeiro-ministro. «Este debate não se encerra hoje», disse, acrescentando que «é provável que outros partidos apresentem outros projetos-lei» e que a Assembleia da República irá produzir uma legislação para o que é fundamental: «mais habitação para as famílias portuguesas, não é por acaso que a habitação está protegida constitucionalmente, é a partir da habitação que depois construímos tudo o resto». E disse ainda que «num momento de grande carência habitacional, sobretudo nas novas gerações, temos de mobilizar todos os recursos e o talento das novas gerações».
Consulta pública com mais de 2.700 contributos
Antes, o Governo já tinha informado que a consulta pública do programa Mais Habitação tinha recebido mais de 2.700 contributos. «Foram enviadas propostas por parte de várias associações representativas do setor, entidades públicas, autarquias e cidadãos», que foram avaliadas e aprovadas no Conselho de Ministros desta quinta-feira.
As medidas que levaram a mais propostas no âmbito da consulta pública foram, segundo o Ministério da Habitação, o incentivo à transferência para habitação das casas em alojamento local (29%); arrendamento obrigatório de casas devolutas (12%); garantia de renda justa em novos contratos (8%); fim dos vistos gold (6%); licenciar com termo de responsabilidade dos projetistas (6%); disponibilizar imóveis do Estado em regime de Contratos de Desenvolvimento de Habitação (CDH) (6%); proteger inquilinos com arrendamentos mais antigos (5%).
O Ministério diz que a consulta pública foi «bastante participada e interventiva», acrescentando que a «sociedade civil e as entidades representativas envolveram-se nesta discussão, dando o seu contributo de forma construtiva».
E acrescenta que «fica também evidente nos contributos recebidos que a sociedade reconhece a centralidade das políticas de Habitação e a necessária continuidade do investimento estrutural em curso no reforço do parque público, reforçando igualmente a necessidade de medidas adicionais que garantam no imediato mais habitação e apoio às famílias».