Portugal vai pedir a Bruxelas a mobilização extraordinária da reserva agrícola europeia, numa altura em que «os agricultores atravessam momentos particularmente difíceis» e a seca severa ou extrema, que cobre 40% do território nacional, coloca a produção alimentar em risco. «Está inscrito na agenda do Agrifish [reunião do Conselho de Ministros da Agricultura da União Europeia, que tem lugar na terça-feira] um ponto com o nosso pedido, que Espanha, França e Itália subscrevem, em que solicitamos que a Comissão Europeia dê um sinal claro de preocupação em relação à utilização de água como recurso fundamental para produzir alimentos», afirmou a ministra da Agricultura e Alimentação, Maria do Céu Antunes, alertando que «a produção alimentar está ameaçada» não só em Portugal, mas noutros Estados-membros.
Face a este cenário, a governante afirmou que o assunto irá ser discutido com a Comissão Europeia. A ideia passa por apresentar medidas concretas, nomeadamente para o setor pecuário altamente afetado pelos preços das rações, assim como pela hipótese de acionar a reserva agrícola que dispõe de cerca de 400 milhões de euros por ano em relação ao extra-Política Agrícola Comum (PAC).
E, numa resposta imediata, o ministério revelou que vai ser publicado, dentro de dias, um despacho que «não autoriza mais culturas permanentes — olival, abacate e frutos vermelhos» no Alentejo e no Algarve, enquanto continuar o ciclo de seca severa. Já num estudo da Agro.Ges recomendou que o abacate seja uma opção estratégica e uma opção importante do desenvolvimento agrícola da região do Algarve, incluindo os seus produtores nos processos de decisão, planeamento e abordagem às soluções para os problemas que o futuro possa guardar. «O respeito pelos recursos naturais, através do melhor conhecimento das questões relacionadas com o solo, a água, a biodiversidade e o balanço do carbono, assim como a garantia do cumprimento de toda a legislação, permitirão o desenvolvimento sustentável da região, devendo o abacate ser parte desta importante equação», diz o mesmo documento.
Já em declarações ao i, o secretário-geral da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), revelou que já no ano passado, as medidas chegaram atrasadas e que os agricultores, ao contrário do que acontece com outros países, não receberam nada. «As pessoas têm de perceber que sem água não se produz alimento. É uma opção. Se o país não quer produzir alimentos, quer é ter turistas e indústrias, então está resolvido o problema. Mas se quer produzir alimentos, tem de ter água».
O secretário-geral da CAP critica ainda a ideia de que a agricultura gasta água. «Isto não se resolve com comissões que só querem tomar medidas para poupar água. Poupar já as pessoas poupam e podem ainda poupar mais se os perímetros de rega forem eficientes, se a condução da água for feita a céu aberto e se tiver fugas, porque estão velhos, gasta-se mais do que é necessário».
E apela a que haja uma modernização. «No âmbito do PRR, Espanha vai utilizar 25 mil milhões de euros na gestão eficiente da água, dos quais cinco mil milhões são só para a agricultura e para o regadio. E nós fazemos a barragem do Pisão que custa 300 milhões de euros. Foi a única coisa que Portugal teve visão. Já é conhecida a falta de peso político da ministra da Agricultura, mas aqui o Governo tomou outras opções e não quis de alguma forma investir na resiliência da água. Esse é que é o problema», revelou ao nosso jornal.
Mas admite que as medidas que irão ser anunciadas serão semelhantes às avançadas em anos anteriores. «Este ano podia, como França ou Espanha fizeram, pedir também uma reserva agrícola que foi criada a nível europeu para arranjar alguma verba. Mas não tem sido esse o entendimento do Governo português face ao setor agrícola. Isso é que é grave».