Economia cresce mas há riscos que tiram o fôlego

A OCDE tem boas previsões para Portugal mas é preciso ter em conta todos os riscos que podem comprometer esse caminho de crescimento. Especialistas ouvidos pelo Nascer do SOL analisam os mais recentes dados.

O crescimento real do produto interno bruto (PIB) português deverá atingir os 2,5% este ano e 1,5% no próximo. Estas são as mais recentes previsões destacadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) no Economic Outlook. E justifica que o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) «deve aumentar significativamente o investimento público, embora haja riscos de atrasos na implementação», acrescentando ainda que o «fortalecimento da procura externa vai apoiar as exportações, principalmente de serviços».

Para o economista do Banco Carregosa, Paulo Rosa, não há dúvidas que «a dinâmica positiva do setor turismo e o aumento da população empregada, já muito perto dos cinco milhões de trabalhadores, mantêm a resiliência da economia portuguesa, tendo permitido revisões em alta do crescimento do PIB real para 2023 por diversas instituições nacionais e internacionais». 

Opinião que é partilhada por Carla Maia Santos, Head of Sales da Forste ao detalhar que «o emprego continua historicamente alto em Portugal, contribuindo para manter algum poder de compra da população, apesar da inflação». A especialista diz ainda que o investimento público, em particular o PRR, «é outro fator que tem contribuído para o crescimento interno, conjuntamente com o dinamismo do turismo, com o fim da pandemia de covid-19 e o aumento das exportações». 

No entanto, se este crescimento se mantém ou não, é incerto. Paulo Rosa é da opinião de que a inflação «e sobretudo a crescente subida dos juros pelo BCE deterioram gradualmente o rendimento disponível das famílias, colocando em causa as atuais perspetivas otimistas para o crescimento do PIB português este ano».

Um crescimento que, na opinião de Carla Maia Santos deverá continuar «uma vez que se espera que a inflação reduza em 2024 e assim também espero que o BCE avance com um travão nas subidas de juro, dinamizando a economia da União Europeia e de Portugal, em particular».

A verdade é que as previsões da OCDE para a inflação são de 5,7% em 2023 e de 3,3% em 2024, o que vai levar a uma redução do poder de compra dos agentes económicos e «pesará no crescimento do consumo». Poderão estes fatores prejudicar os crescimento? 

A especialista da Forste diz que se esta redução acontecer, «poderemos ver o BCE a manter  ou mesmo a reduzir as taxas de juro, ajudando a dinamizar a economia e o consumo para 2024».

Já Vítor Madeira, analista da XTB também é da opinião de que estes dados poderão prejudicar o crescimento «caso os rendimentos não consigam acompanhar a inflação e as taxas médias de poupança por agregado familiar continuem a deteriorar-se, então é expectável que o crescimento possa ser comprometido».

Zona euro melhor em 2024

Para a zona euro, a OCDE espera que a economia cresça 0,9% este ano e 1,5% em 2024 e a taxa de inflação caia para 5,8% este ano para 3,2% no próximo ano.  Ainda assim, Paulo Rosa é da opinião de que Portugal se destaca «impulsionado sobretudo pelo turismo e pelo gradual aumento da população empregada». No entanto, diz que «não são apenas as exportações de serviços, nomeadamente o turismo, que têm suportado o PIB», mas também «as exportações de bens registaram uma melhoria no primeiro trimestre».

Já Carla Maia Santos relembra que para Portugal o crescimento previsto para este ano é de 2,5% ao passo que para o conjunto da União Europeia o crescimento não passa dos 0,9%. «Aqui sim, Portugal destaca-se pela positiva. O emprego historicamente alto, o investimento público e as exportações são fatores que justificam esta diferença positiva para Portugal». Mas, a verdade é que a OCDE espera que Portugal venha a desacelerar o seu crescimento para 1,5%, em 2024, enquanto que, para a EU, espera um crescimento para os 1,5%. «Aqui Portugal destaca-se pela negativa, mostrando uma redução do crescimento». E diz que a justificar esta quebra «temos as consequências duma inflação alta continuada, que faz com que as poupanças/fundos de tesouraria usados nos pagamentos dos empréstimos mais caros, tanto nas empresas como nas famílias, justificados pelo aumento das taxas de juro, estejam a ser delapidados. Se não forem compensados pelo aumento dos salários ou dos rendimentos, poderemos ver mais empresas e famílias em ‘mau estado’, contribuindo para um desacelerar do crescimento».

Sobre este assunto, Vítor Madeira diz que Portugal pode destacar-se da zona Euro mas «temos  que ter noção que Portugal tem sofrido de atraso em relação aos ciclos económicos globais, logo não significa que este crescimento seja prolongado e consistente, mas sim ainda estarmos numa fase diferente de ciclo económico em relação aos outros parceiros europeus». Para além disso, diz o analista, «caso as economias dos nossos parceiros continuem a arrefecer, Portugal, evidentemente sofrerá na pele esse abrandamento».

Recorde-se que a OCDE alertou também que, apesar de a dívida pública ter caído abaixo do nível de 2019, continua a ser a terceira mais alto da União Europeia. Assim, recomenda que «gastos mais eficientes e um quadro orçamental fortalecido são necessários para ajudar a enfrentar as crescentes pressões decorrentes do envelhecimento da população e das fortes necessidades de investimento».

A organização prevê que o rácio da dívida pública na ótica de Maastricht se fixe nos 106,2% do PIB em 2023 e 102,9% em 2024.

Sobre as previsões da OCDE, o Governo diz que «os últimos anos têm mostrado que conseguimos sempre dar a volta. (…) Os números [económicos], até agora, estão a mostrar que temos tido a grande capacidade de ultrapassar sempre os desafios que temos enfrentado, naturalmente, com foco e mobilização de recursos, como temos feito», disse a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho