Meter os pés pelas mãos

Neste sentido, as comissões de inquérito que se sucedem são o campo ideal para a cultura da desvalorização do acontecido.

O Governo socialista tem uma técnica particular para tentar ultrapassar problemas.

Primeiro a negação, depois a confusão, na essência o adiamento, o prolongamento no tempo.

Bastará alinhar vários acontecimentos e obter um modelo comum.

Alguns dos problemas causam incomodidade, motivam a revolta pública, são difíceis de aceitar.

Tanto que causam mossa, não se podem esquecer, são nódoas indisfarçáveis.

Outros, porventura a maioria, não. Tomam o caminho do desinteresse e do esquecimento.

Como num passe de mágica, o censurável torna-se uma nuvem.

A uma explicação absurda, segue-se outra explicação absurda.

No meio da floresta de enganos traça-se uma verdade oficial, uma narrativa repetida, uma cortina de fumo.

Um a um, os intervenientes começam longe desta narrativa, desenham cenários diferentes, mas com o tempo aproximam-se. Testam as reações, afinam a pontaria.

Fulano não respondeu porque ninguém lhe perguntou, sicrano nada sabe, beltrano disse mas não disse.

Neste sentido, as comissões de inquérito que se sucedem são o campo ideal para a cultura da desvalorização do acontecido.

 

Da parte dos participantes atropelam-se as perguntas, perdem valor com a repetição, causam cansaço a quem ouve e a quem vê.

Os intervenientes principais tentam passar pelo pingos da chuva.

E, assim, o que era fácil de identificar como um abuso ou um erro parece uma nebulosa.

O tempo todo que as oposições se consomem nesta esgotante atividade ajuda o Governo.

Elas perdem o foco naquilo que verdadeiramente interessa.

Não é preciso mais para fazer os portugueses entender a rábula do Governo.

Os portugueses não são estúpidos.

Querem é saber como vai ser a sua vida, como pode melhorar, como podem obter algumas vantagens, como podem pagar menos e receber mais.

Querem saber como o Estado pode ser melhor gerido e ser mais eficiente.

Algumas questões essenciais têm sido levantadas.

A traquibérnia que se preparava para fazer perder valor às pensões de reforma.

A denúncia da incapacidade de resolver os problemas da saúde.

A recusa em aceitar propostas de diminuição dos impostos.

A pressão permanente sobre a classe média que nem sequer pode ter como certa uma forma de obter algum rendimento suplementar com certificados de aforro.

A falta de previsão das consequências da procura de dívida pública por particulares.

Quem queira ser governo tem de fazer perceber os portugueses como pode ser e fazer diferente, no concreto, com exemplos claros.

Ao atual poder deve corresponder a habilidade argumentativa, o golpe. Basta que a eles recorram. Já toda a gente percebeu. São bons nisso. Ótimo.

Um exemplo paralelo sobressai na atuação de um cérebro da esquerda.

Foi denunciado por comportamentos estranhos que causaram surpresa e estupefação.

O que fez ele?

Não se limitou a negar, fez mais.

Na primeira tentativa identificou a direita com uma campanha vil e difamatória.

Não pertenciam a este as queixosas.

Saiu mal.

Um mês depois volta a imaginar outra defesa.

Que sim, que fez coisas que não devia, mas não aquelas.

E culpou a sociedade e as circunstâncias.

Nos anos 40, os seus, era permitido fazer o que agora se não admite. Cresceu e foi formado nesse caldo de cultura. É uma vítima.

Valerá a pena insistir na denúncia deste homem? 

Não. É deixá-lo inventar, como ao Governo, o que a inteligência se recusa a aceitar.

Tratemos do que interessa.