Sanches Osório: “A Europa não manda nada na guerra”

Sanches Osório defende uma solução diplomática para a guerra, porque o conflito só serve os interesses dos Estados Unidos e da China.

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por Raquel Abecasis

Como está a ver a guerra na Ucrânia?

Acho que este é um problema entre os Estados Unidos e a China.

Mas não foi a China que invadiu a Ucrânia…

Este é uma história complicada. Sei que aquela região ucraniana historicamente foi sempre complexa, aquela região é o coração do mundo. É um problema complicado e tenso e não podemos, como defendem aqui os nossos comentadores, achar que vamos todos cilindrar a Rússia. Houve um general, cito o nome dele, o João Pinto Ramalho, que disse que isto só se resolve com a Rússia derrotada. Então, se é isso, temos que pensar em mandar os nossos filhos e os nossos netos para combater na Ucrânia. E o que estas pessoas defendem é que se deve defender a Ucrânia até ao último ucraniano. 

Mas que solução é que acha que se devia encontrar? 

Uma solução diplomática? Tem que ser, tem que ser…

Mas se a Ucrânia não tiver uma posição de força, faz-se a vontade à Rússia?

Os americanos vieram à Europa para conseguir derrotar o Hitler. Visto dos Estados Unidos da América, a Europa não interessa coisa nenhuma. Como se vê, não fossem os Estados Unidos e a Europa não sei o que seria. Se não fosse o general De Gaulle, a França tinha deixado de existir. Portanto, existe a consideração que os americanos têm pela Europa, que é nenhuma. Já agora, por que é que o general De Gaulle não queria a Inglaterra na Comunidade Europeia? Por que é que o general De Gaulle quis que a França tivesse a arma nuclear? Porque dizia que a Inglaterra era um porta-aviões dos Estados Unidos. Que tem a política externa dos Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial. Agora, nós temos isso, nós permitimos. Nós somos zero no meio desta coisa toda. E o que determina o evoluir dos acontecimentos não são as ideias políticas, não são chefes mais ou menos carismáticos. É preciso resolver…

Mas, mesmo sendo os Estados Unidos a conduzirem a situação, não é essa a estratégia que nos serve?

Não, não nos serve. E não, não serve a Europa.

A Europa, também ainda não percebeu que já não é uma Europa hegemónica no mundo? 

Não, ainda não percebeu, e ainda não percebeu isso porque o grande pilar dessa hegemonia da Europa era a França.

E a França já perdeu essa hegemonia?

Sim, e como é que a perdeu? Assume-se que a França e a Alemanha são os grandes pilares neste mundo europeu. E são. Mas estão zangados. E porquê?  Por uma coisa simplicíssima, a Alemanha vai refazer o seu exército, aumentando as suas forças armadas. Encomendou o material a quem? Aos Estados Unidos. Quem é o principal fabricante de material de guerra na Europa? A França. Por isso, a França ficou zangada. A Nova Zelândia e a Austrália tinham encomendado submarinos à França. De repente, desistiram dessa encomenda e encomendaram aos Estados Unidos. Nós temos que pensar que as fábricas que fazem as munições são fábricas privadas. Portanto, não pode o Estado, não tendo uma economia de guerra, dizer que se compra àqueles senhores. Por isso, isto é um negócio de interesses. Se recebem encomendas, exigem um sinal, porque se não pagarem e depois não quiserem, onde é que vou vender as munições? Portanto, quem faz as munições e tem as encomendas, é quem vai fazer munições para a Ucrânia. Portanto, do lado de cá temos um problema. Enquanto a Rússia fabrica para as suas tropas. Ao mesmo tempo que a Ucrânia está dependente dos estados de espírito e de eleições desta gente toda. Funcionará tudo assim? Não sei.

Mas os acontecimentos dos últimos dias na Rússia mostram que do lado russo as coisas também não estão tão sólidas assim?

Pois, vamos ver. Agora, acho curioso que a Sra. Metzola tenha vindo ao nosso Parlamento e atacado o PCP, porque o PC defende o Kremlin e mandou a Paula Santos fazer um discurso no Parlamento Ucraniano. Teve sorte que o PC foi bem educado, porque podia ter respondido: porque é que a senhora não vai fazer esse discurso à Duma. Nós estamos metidos numa grande complicação e não estamos a saber resolvê-la.