Os egos dos líderes também têm juros!

O futuro de Lagarde desconheço, mas tem um mandato iniciado em 2019 por 8 anos, não renovável. Não deixará saudades seguramente e o provável é que com 71 anos na altura, vá para a reforma. Mas Costa, quase a fazer 62 anos, ainda tem ‘muita estrada para andar’. Em 2024 tem as eleições europeias e…

1. Tivemos uma semana bem animada com Lagarde em Portugal e com Costa na Madeira, cada um à sua maneira a fazer ‘provas de vida’. Lagarde, enquanto presidente do BCE e numa reunião ‘entre peers’, a disparar em todas as direções, para justificar a continuidade da subida das taxas de juro e Costa, numa reunião partidária, a reafirmar a continuidade até 2026 como primeiro-ministro enquanto se autoproclama ‘garante de estabilidade’. Dois líderes, duas histórias, ambas com enorme ‘ego’.

Lagarde nem se preocupa com eleições e tem afirmações como ‘um elefante em loja de porcelana’. As suas declarações inferem uma enorme insensibilidade social como (i) subir salários só contribui para a inflação ou (ii) os apoios governamentais à população têm de diminuir, sem deixar de dar um remoque às empresas ao referir que têm de moderar os lucros. No entanto, quando a inflação há muito dava sinais de persistir, Lagarde continuava a afirmar que era passageira, tendo uma inércia culposa para o agravamento da mesma, enquanto a FED já atuava agravando as taxas de juros. Agora, quando a FED acaba de anunciar (14 junho) que mantém os juros, Lagarde insiste em aumentar as taxas em julho…

Costa, do alto da sua maioria absoluta que lhe caiu nos braços da forma mais inesperada, reivindica ser garante de estabilidade, deliberadamente tentando roubar ao Presidente Marcelo a sua grande ‘bandeira’. Falar é mesmo fácil, sobretudo quando, por manifesta ausência de liderança, tem largamente contribuído para uma série de ‘casos e casinhos’ que nos têm entretido durante estes 15 meses (desde que tomou posse) do XXIII Governo Constitucional e o colocam como coautor da instabilidade sentida neste tempo.

O futuro de Lagarde desconheço, mas tem um mandato iniciado em 2019 por 8 anos, não renovável. Não deixará saudades seguramente e o provável é que com 71 anos na altura, vá para a reforma. Mas Costa, quase a fazer 62 anos, ainda tem ‘muita estrada para andar’. Em 2024 tem as eleições europeias e com a atual opacidade da oposição, a probabilidade do PS ser o partido mais votado até será bem alta. 

Ir em 2024 para presidente do Conselho Europeu seria a certeza de eleições antecipadas (Presidente Marcelo dixit) e tornaria bem alta a probabilidade de entregar o Governo à direita expectante por este cenário. Daí não surpreender ter afirmado que está para ficar até 2026 («habituem-se!»), mas a política é como o futebol, ‘o que hoje é verdade, amanhã é mentira’. A realidade é que deixa transparecer diversos sinais de saturação com esta política nacional, para a qual contribui com a sua visível falta de ambição, sem grandes causas nacionais que não sejam o PRR (’já posso ir ao banco?’), porque no resto estamos conversados.

Infelizmente para Portugal, não se gerou qualquer expectativa que esta maioria absoluta ainda venha a ser benéfica para o país. Passada a pandemia, a economia reanimou, sobretudo com base nas exportações (com tecnologias e turismo à cabeça), sempre com a iniciativa privada a liderar e com a inflação a propiciar receitas fiscais inesperadas que geram folgas para a dupla Costa/Medina continuar a desenvolver a única política que verdadeiramente sabem fazer, ou seja, redistribuir apoios sociais, o que sendo de louvar, é demasiado curto. 

A habitação é uma miragem porque a opção de a resolver pela construção de casas sociais como política de fundo ficou essencialmente vertida no PRR que regista atrasos significativos, a Saúde está como todos sabemos, a Justiça e Educação a sofrerem ‘tratos de polé’ e Costa sem saber como resolver, espartilhado pelo dogma das contas certas por um lado e pela impreparação de muitos de quem nomeia para o Governo, pelo outro (também por escassez de alternativas disponíveis, sublinhe-se). 

Ir para a Europa seria para Costa um “voltar a viver”, porque por estas bandas já se percebeu que pouco ou nada mais tem para acrescentar e sabe perfeitamente que por muito boa que seja a comunicação governamental, os portugueses serão bem capazes de se saturar. Por um lado ao constatarem que dificilmente sairemos da ‘cepa torta’ e por outro a sentirem ‘o cinto a apertar’, rodeados por greves por todos os lados (Educação, Justiça, Transportes, Saúde),. Então, se o PSD sair da letargia atual, com Montenegro a ‘agarrar’ grandes causas como bandeira e com respostas bem diretas às frustrações dos portugueses, a mudança até poderá ser já nas eleições europeias de junho de 2024.

 

2. Voltemos aos juros, cujas subidas têm impactos significativos na despesa, dada a colossal dívida pública portuguesa. Assim, só os incautos podem ser surpreendidos pelas previsões do Ministério das Finanças que atiram o custo em 2023 para 5,9 MM euros, refletindo uma considerável subida face a 2022 (4,7 MM euros). A consubstanciar estas projeções refiro que os valores reais deste 1.º trimestre de 2023 foram de 1,4 MM euros (22,1% acima de 2022!).

Se olharmos para 2024, o Ministério das Finanças aponta para cenários preocupantes, com juros na ordem dos 7,3 MM euros e será sempre a subir até 2027 onde se atingirá os 8,5 MM euros. Não há volta a dar: temos de baixar a dívida pública nominal (280 MM euros em abril de 2023) e não apenas em percentagem do PIB, que o ministro Medina calcula em 110% no final de 2023 (113,8% em 2022).

O tempo dos juros baixos acabou e o Governo desperdiçou a oportunidade de baixar a dívida, porque nestes 8 anos as prioridades foram outras. Como já vimos, a realidade mudou e o peso do seu custo só vai aumentar, pelo que teremos de ter a coragem de aproveitar, mesmo que seja em parte, os excedentes que a inflação proporciona para a diminuir, porque, a continuar-se assim, o precipício fica ‘já ali’.

 

P.S. – Galamba já sentia a falta do protagonismo e nada melhor do regressar à ribalta opinando e reiterando sobre a excessiva distância de Santarém como local para o novo aeroporto. Depois de PNS ter decidido que Montijo seria provisoriamente a nova localização e que o futuro seria Alcochete (despacho revogado por Costa em 24 horas!), veio Galamba ultrapassar a “desaparecida” Comissão que anda há meses a estudar diversas soluções. Porque ‘não se calam?’.