JMJ. Habemus planos

Depois de enormes divergências com o representante do Governo, José Sá Fernandes, as entidades envolvidas na organização da Jornada Mundial da Juventude conseguiram chegar a um consenso. Mas, pelo meio, foram várias as entidades que avançaram com os seus projetos.

A Jornada Mundial de Juventude vai acontecer com um ano de atraso, pois não fosse a covid-19 e teria sido realizada em 2022, tal como estava prevista. Portanto, utilizando uma palavra bengala, nos textos e na linguagem oral, as autoridades portuguesas deviam de ter tudo pronto há um ano, mas sucessivos desleixos fizeram com que a três semanas do início do grande acontecimento ainda se ande aos papéis no que diz respeito aos planos de Mobilidade, Segurança, Saúde e Proteção Civil.

Várias fontes ligadas à organização da JMJ apontam um culpado, que, por ter as costas largas ou por incompetência, é o representante do Governo, José Sá Fernandes. Pertencia ao antigo vereador da autarquia de Lisboa fazer os respetivos planos que seriam apresentados às restantes entidades envolvidas. Mas as polícias envolvidas, PSP, GNR, PJ, SIS, que, pelos vistos também é uma força policial, atendendo ao episódio do Ministério das Infraestruturas, forças militares, Proteção Civil, Igreja, Infraestruturas de Portugal, além das Câmaras envolvidas, estão furiosas com o responsável do Grupo Projeto nomeado pelo Governo e decidiram avançar com os seus planos estratégicos e operacionais, fazendo depois as alterações necessárias aquando da entrega do plano por parte de José Sá Fernandes – o que terá acontecido ontem.  

A história é ainda mais ‘picante’, pois quem tem a autoridade sobre todos os planos, estratégicos e operacionais, apresentados é o secretário-geral do Sistema de Segurança Interna (SSI), o embaixador Vizeu Pinheiro. Na posse de todos os planos das entidades envolvidas, o embaixador fará a coordenação estratégica, havendo depois a ‘delegação’ de responsabilidades na parte operacional e na dimensão tática.  Contactado pelo Nascer do SOL sobre as críticas que se fazem ouvir,  nomeadamente das divergências com o SSI, José Sá Fernandes foi perentório. «Não sei o que está a dizer, até porque estou aqui reunido com o SSI e não é esse o espírito». De facto, ontem, houve uma reunião e chegou-se, finalmente, a um acordo, pois as divergências foram muitas, envolvendo inclusivamente as Infraestruturas de Portugal, também parte integrante da JMJ. «Pode escrever sem qualquer problema, as divergências foram ultrapassadas ontem e os planos estão concluídos», afirmou ao Nascer do SOL fonte ligada ao processo.

Recorde-se, que aquando da criação do grupo nomeado pelo Governo, foram publicadas em Diário da República as suas competências. «Estabelecer que o Grupo de Projeto tem por missão acompanhar e facilitar, em termos operacionais, a concretização da JMJ 2023, bem como coordenar, gerir e executar as tarefas necessárias ao cumprimento das responsabilidades e compromissos assumidos pelo Governo no contexto da JMJ 2023, designadamente os relacionados com os planos da saúde, da segurança e da mobilidade, bem como a organização dos eventos ‘Centro de reconciliação’ e ‘Feira das vocações’, a distribuição de água, a disponibilização de bens e serviços multimédia e instalações sanitárias para o recinto central e, ainda, a aquisição de outros equipamentos necessários à organização dos eventos», lê-se na Resolução do Conselho de Ministros de 22 de outubro de 2022.

O ministro da Administração Interna, há duas semanas, em entrevista ao nosso jornal, esclarecia: «Porque é uma Jornada que se prevê que venha a ter o maior movimento de sempre no país, e porque convoca vários Ministérios, desde Administração Interna, Justiça, Defesa Nacional, Adjuntos e Assuntos Parlamentares, é que se entendeu colocar sob a supervisão do Sistema de Segurança Interna, neste caso do secretário-geral, funções de coordenação estratégica. O plano de segurança tem três níveis: o de coordenação estratégica que estará no SSI, com uma sala de coordenação estratégica, onde estão todas as forças e serviços representados. E depois tem a dimensão operacional e a dimensão tática. Na operacional e tática é onde entram as forças de segurança. São planos em que cada força das forças de segurança e também de proteção civil estão já nas mãos do SSI, que é quem tem a responsabilidade da coordenação de todos os planos e de os colocar numa perspetiva estratégica e global». Parece que juntar a equipa de Sá Fernandes com a de Vizeu Pinheiro e restantes entidades envolvidas é que não foi nada fácil…

Falta de simulacros

Os atrasos registados na apresentação dos planos já não permite que se façam simulacros das hipotéticas situações que venham a ocorrer. «Já não vamos poder fazer testes, pois faltam horas para tudo começar. É inconcebível que o plano só tenha sido apresentado ontem. As Polícias avançaram com o seu trabalho e só no fim é que se juntou tudo. Estamos a falar do caos organizado», segundo uma fonte envolvida na organização. 

Mas coloquemos imagens no texto para se perceber melhor do que se está a falar. Onde ficarão os cerca de 1700 autocarros que deverão chegar de Espanha e do resto da Europa, havendo até o receio de que sejam mais? Para se ter uma ideia, se esses 1700 autocarros ficassem em fila indiana o fim seria 20 quilómetros depois do primeiro. Que transportes estarão a funcionar? Quais as zonas que ficarão interditas ao público? Como irão funcionar os comboios e os barcos, já que os peregrinos não vão estar só em Lisboa, havendo ações da JMJ em toda a Grande Lisboa? Como chegam lá? Como regressam? E se houver um surto como estão preparados os hospitais para o enfrentar? Há cirurgiões de serviço para o caso de ser preciso operar um número inusitado de doentes? E as fronteiras? Como vão ser controladas e o que se fará aos peregrinos ‘suspeitos’? E, no caso de grandes incêndios no interior do país, ou fora de Lisboa, que seja preciso deslocar bombeiros de todo o país? Quem ficará a assegurar a Proteção Civil na capital?

Estas e muitas outras questões deveriam ter sido acauteladas com antecedência, algo que não aconteceu.

Mas, do que já se sabe, parece que Lisboa não vai ficar intransitável como se previa. O eixo mais castigado será o que vai do Saldanha aos Restauradores, com particular incidência nos dias 1, 3 e 4. No primeiro são previstos 200 mil peregrinos, no dia 2 não haverá grandes cerimónias em Lisboa, e só depois com a presença do Papa a 3 e 4 é que o centro da capital verá a sua população aumentar exponencialmente. Já no dia 5 e 6 tudo se mudará para o Parque Tejo, onde se poderá chegar ao milhão e meio de peregrinos (ou mais) na missa de dia 6 (ver págs. 8-9).