Não tem um ar sisudo, do género espião, gosta de rir, e sabe do que fala. O homem que coordena as forças de segurança, incluindo os militares, que estão na operação Jornada Mundial da Juventude usa a sua experiência diplomática para contornar algumas questões mais delicadas. Aqui fica a entrevista a correr de 58 minutos do secretário-geral do Sistema de Segurança e Informação (SSI).
Dos seus antecessores no SSI, um saiu dizendo que se sentia um polícia desarmado, o segundo disse que havia muitos pontos críticos e uma multiplicidade de atores e tutelas, sobreposição de competências materiais e territoriais e prevalência da violência reativa sobre a violência proativa ou preventiva. A última saiu criticando o SEF. O que lhe ocorre dizer sobre estes comentários dos seus antecessores?
Acho que é como a União Europeia, que vai progredindo e aprofundando em função das sucessivas crises de crescimento. O SSI tem vindo a crescer e a consolidar-se enquanto, digamos, mecanismo de coordenação. Nunca foi um mecanismo com um mandato vertical, com tutela vertical. Quando foi criado falava-se no super-polícia, etc., o Sistema de Segurança Interna é um sistema de sistemas. Quer isto dizer que a função principal é transversal, que passa por garantir que todas as forças e serviços de segurança cooperam no respeito e nas atribuições e competências de cada um. Mais, é articular também as forças e serviços de segurança com as Forças Armadas, com o Sistema de Informações da República, com a Emergência da Proteção Civil, com o INEM, com o SIRESP, etc. Essa é a função principal. E é por isso que na JMJ é criado aqui um sistema de segurança interna, a sala de Coordenação e Controle Estratégico. É onde todos se encontram e onde todos estão de acordo em cooperar no respeito das suas competências. Nós temos tido no Sistema de Segurança Interna uma evolução. Acho que os comentários dos meus antecessores foram feitos num determinado tempo de crescimento do SSI. O que posso dizer agora é que está no SSI um Ponto Único de Contacto (PUC) para a cooperação policial internacional, que tem um gabinete nacional da Interpol, tem uma unidade nacional da Europol.
Que provocou uma grande polémica por ter ficado debaixo da alçada do SSI.
Devo dizer que esta localização resulta de recomendações do sistema Schengen. E a sede desta cooperação é aqui no sistema de Segurança Interna porquê? Precisamente porque os órgãos de polícia criminal e as forças de segurança têm várias tutelas ministeriais. Por exemplo, a Polícia Judiciária, que é a polícia de investigação por excelência, a tutela é o Ministério da Justiça, o SEF, a GNR e a PSP – também são ambas polícias criminais –, a tutela é o MAI, a Autoridade Tributária, a tutela é o Ministério das Finanças, a Polícia Marítima, a tutela é o Ministério da Defesa Nacional, a ASAE, que também é um órgão criminal, a tutela é do Ministério da Economia. Qual é a vantagem de estar no SSI? É que todos eles se reveem no espaço comum, isto é uma espécie de casa comum da cooperação e articulação, com a diferença de que o secretário-geral do SSI depende do primeiro-ministro do ponto de vista estratégico, mas a função dele está legalmente limitada. Antes de mais, o secretário-geral só é nomeado após audição prévia na primeira Comissão dos Direitos, Liberdades e Garantias, portanto, a primeira Comissão da Assembleia da República. Eu não tenho a tutela da Polícia Judiciária, isso é a ministra da Justiça. O que posso dizer é que a minha função é garantir que o Plano Coordenador, que é uma resolução do Conselho de Ministros, que define as funções e as áreas de responsabilidade territorial de cada força e serviço de segurança, e que esse plano coordenador é respeitado. Uma vez disse numa entrevista que sou das pessoas mais monitorizadas do país. E, trabalhando com todas estas forças aqui, quer no Ponto Único de Contacto para cooperação policial internacional, Gabinete SIRENE, que é o Gabinete de Informações Complementares, Schengen, informações de passageiros, etc., se eu der um passo errado, garanto que todos eles soam os alarmes. A Europol e a Interpol são órgãos também internacionais, são agências de cooperação policial e de investigação criminal. Mas têm uma componente de prevenção e cooperação policial. Então, onde é que haveriam de ficar? Houve uma altura em que ouvi dizer que deviam ficar na PGR, mas a PGR vai agora fazer prevenção policial? A Interpol tem dezenas de entidades que são de natureza do Estado. A Polícia Judiciária tem só o Ministério da tutela. Portanto, eu tenho que trabalhar com órgãos de polícia criminal que têm tutelas ministeriais diferentes. Diria que são importantes as crises de crescimento, como a União Europeia. E, como dizia Jacques Delors, a bicicleta tem que estar em andamento. E nesta bicicleta o que sinto é que está a ganhar velocidade, está a ganhar utilidade. Quando foi a minha tomada de posse, há perto de dois anos, disse: ‘O secretário-geral tem que ter uma função simples, tem que ser um valor acrescentado para cada força e serviço de segurança, através de uma maior cooperação e articulação entre as forças. Incluindo segurança e sinergias’.
Sendo das pessoas mais monitorizadas do país, não faz chamadas pessoais onde comete inconfidências ou diz palavrões, até por ter o telemóvel vigiado?
Está vigiado no sentido de acompanhado, por acaso tenho uma relação excelente com todos os dirigentes policiais.
Mas acredita ou não que o seu telefone pode estar sob escuta?
Não tenho grandes preocupações porque as minhas comunicações são todas elas de natureza operacional e funcional. Devo dizer que tenho da parte do diretor nacional da PJ a melhor das relações, não só a relação pessoal de amizade, que nos acompanha já há muito tempo, mas com todos eles, o Magina da Silva, da PSP, o João Santos Correia, da GNR, o Fernando Silva, diretor do SEF, e seus antecessores temos uma relação muito fácil, de contacto direto. Quando vim para estas funções…
Não consegue dizer que o telemóvel não está sob escuta.
A privacidade é sempre um ponto essencial nas comunicações, não tenho razões para suspeitar que o meu telefone esteja sob escuta.
Dizem-me que fez um pequeno milagre ao conseguir juntar a PSP e a GNR. É um homem que passou por vários cargos nos diferentes governos do PSD e do PS. Sempre foi uma figura mais ou menos consensual. Aliás, na sua nomeação até José Manuel Pureza o elogiou. O PCP não foi à cerimónia, mas o Bloco elogiou-o.
Acho que foi depois da audição parlamentar [risos].
Mas em relação ao milagre de juntar a PSP e a GNR?
A articulação entre PSP e GNR tem vindo a aumentar e a aprofundar-se, mas não é só a PSP e a GNR. Temos tido também uma excelente articulação na Polícia Judiciária, no SEF, na Polícia Marítima. Não digo que não haja problemas aqui e acoli, quando há essas dificuldades eu sou ativado de imediato e essas são as minhas funções. A propósito dos meus antecessores, e tenho uma grande admiração por todos eles, mas penso que o tempo que estamos a viver no SSI já é um tempo diferente, qualitativamente diferente. Não só porque temos o Ponto Único de Contato para a Cooperação Policial Internacional completo, com as várias dimensões, de Schengen às CCPAs de cooperação policial aduaneira – que é o nosso mecanismo de cooperação transfronteiriça com a Espanha, com a Guarda Civil e agora a Polícia Nacional. Temos aqui também um dos mecanismos, e isso devo aos meus antecessores, onde se tem vindo a aprofundar os mecanismos das equipas mistas de prevenção da criminalidade. Não tenho falado muito nelas, mas são mecanismos em que os comandantes distritais, incluindo os serviços de informações e também os diretores dos Serviços Prisionais, abordam, através de uma agenda que é preparada pelo SSI, com os dados criminais do distrito, que depois podem ser detalhados: do distrito vai para os concelhos, dos conselhos municipais vai até ao nível de junta. E eles discutem regularmente, com base nos dados que nós concentramos e consolidamos, a evolução da criminalidade. Não temos dado publicidade a esse mecanismos, mas funciona muito bem. Voltando ao sistema, o sistema tem também a UCAT, que foi criada pelo Luís Neves [diretor da PJ], a Unidade de Coordenação Antiterrorismo. Temos aqui várias dimensões: a UCAT, o PUC para a cooperação policial, com outras dimensões, e vamos ter aqui [na sede do SSI] também a Unidade de Coordenação de Fronteiras e Estrangeiros, além da Unidade de Infraestruturas Críticas, que está agora em desenvolvimento, de validação dos planos operacionais de segurança, das equipas de estruturas críticas, que até agora eram apenas energia e transportes. Vamos ter todas as outras valências de infraestruturas críticas que decorrem da última diretiva europeia. O sistema está em evolução, em crescimento. Passámos de dois andares e meio para todo o edifício e isto é também, digamos, um sinal físico das competências que têm vindo a ser atribuídas ao SSI, muito em resultado das necessidades operacionais das forças de serviço e segurança. Hoje em dia, a maior parte dos desafios que temos são na esfera da prevenção policial, da cooperação policial, da prevenção criminal, da repressão criminal, muitas vezes os desafios são híbridos, isto é, implicam a cooperação de muitas entidades. Quando falamos de, por exemplo, branqueamento de capitais, são várias entidades que têm de estar envolvidas. Falamos dos gangues, são acompanhados territorialmente por várias forças, o desenho, a caracterização, a Polícia Judiciária tem também já isto muito bem estudado. Nós trabalhamos com as forças aqui, cada uma no respeito das suas atribuições e competências, mas o que o SSI permite é precisamente ter uma visão mais panorâmica, mais recortada, que permita a cada força atuar depois nos seus campos próprios.
Calculo que seja das pessoas mais bem informadas do país. Se coordena tudo…
Tenho a coordenação.
É o verdadeiro superpolícia.
Não tenho as funções executivas, não interfiro em segredo de Justiça, nem no segredo de Estado.
Mas responde perante quem?
Perante o primeiro-ministro, mas nestas funções tenho um certo grau de autonomia, porque me articulo diretamente com o ministro da Administração Interna, com a ministra da Justiça, e agora com a ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, que também tem a coordenação da JMJ, mas também há as questões de imigração e asilo. Outro dos meus interlocutores frequentes é o general Duarte Costa, que é o presidente da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil. Falo com ele muito regularmente. Mas articulamo-nos com outros sistemas, incluindo ainda o Grupo Projeto de Sá Fernandes. Aqui temos a coordenação da ministra Ana Catarina Mendes, as autarquias, as polícias municipais.
É um homem muito bem informado. Estava suficientemente informado para não ter sido surpreendido com as declarações do sheikh Munir, que disse que há uma radicalização nalgumas supostas mesquitas clandestinas.
Essas matérias têm sido acompanhadas sobretudo por entidades que têm essa área das informações, o SIS e a PJ. O que tenho é, obviamente, a garantia de que todas as entidades cooperam entre elas, umas para ajudar os sistemas de informações ou os serviços de informações a produzir as informações, outras para o desenvolvimento da investigação e inquéritos criminais. Não me pronuncio sobre as questões concretas que não são da minha competência. Quando diz que sou uma pessoa bem informada, sou informado naquilo que diz respeito ao funcionamento do sistema, isto é, aquilo que está sob investigação criminal e sob segredo de Justiça, a PJ e a PSP e a GNR não só não partilham como não devem partilhar comigo.
Mas as afirmações do sheik Munir não estão em segredo de Justiça.
Temos aqui a Unidade de Coordenação Antiterrorista e nessa unidade são discutidas todas as fontes de informação, todas as informações que chegam a nível nacional e as que nos chegam a nível internacional. O valor da UCAP é aquilo que traz o SIS, o SIED, a PJ, que tem competências especiais e exclusivas no combate ao terrorismo, é preciso não esquecer. Depois tem os outros órgãos de polícia criminal que dão muita informação, que agora vai passar a ser transmitida via GNR, PSP e Polícia Marítima. Todos eles têm mecanismo de cooperação internacional. O SIED tem dezenas de parceiros. O SIS tem centenas de parceiros internacionais. Uns são mais de natureza europeia…
Como embaixador tem esse talento de dar a volta ao bilhar grande sem responder à pergunta que é sobre as declarações do sheik Munir, que assumiu que há movimentos preocupantes e com discurso de ódio.
Esses movimentos são, como disse, acompanhados pelas entidades competentes. E aquilo que tenho de garantir é que a informação, e essas preocupações, circulam por quem tem de circular. E devo dizer que da parte da UCAP não tenho a menor dificuldade em afirmar isto: a cooperação tem sido excelente. Quando há declarações destas, alertas, que podem não ser só do sheik Munir, podem até ser pessoas particulares, essas informações chegam à UCAT. Tenho dito que uma das preocupações como secretário-geral – e apresentando a opinião de todas as forças de segurança – é, de fato, o discurso de ódio, incitamento à violência, polarização extrema, que se veste de várias formas, essas temos que acompanhar e, sobretudo, acompanhar porque há um efeito multiplicador que não existia antes, que são os efeitos da pandemia, da saúde mental. Vejo muita violência que dispara por tudo e por nada. Aquilo que era antigamente, muitas vezes, uma discussão que depois envolvia uma agressão física de punhos, agora, muitas vezes, o que salta é uma faca, uma arma branca, e nalguns casos salta uma pistola. E isso preocupa a PSP, a GNR, a PJ, preocupa todos. Nessa parte também dou voz a essa preocupação, que é uma preocupação comum. Temos de estar atentos a isso, quer na escala do terrorismo, quer na escala dos extremismos violentos, quer na escala do que são os movimentos antissistema, tudo o que é antissistema, os movimentos conspiracionistas, tudo isso tem hoje uma capacidade de mobilização que não tinha antigamente.
A mim garantem-me, e estamos a falar a 25 de julho, que, neste momento, o seu grande problema em relação à JMJ é precisamente isso que acabou de dizer. A provável realização de manifestações de pessoas antissistema a nível europeu. Temem que eles se vão colar ao chão, vão estar em Belém, nos Jerónimos, e por aí fora, nos locais onde o Papa estará. Garantem-me que não é tanto o terrorismo que vos preocupa, que estará mais ou menos controlado…
Acho que é sobretudo as questões que falou.
Fala-se que podem bloquear a Ponte Vasco da Gama.
Toda esta gama de preocupações de ameaças está a ser estudada e trabalhada. As manifestações, greves, etc.
Não estou a falar das manifestações de setores profissionais portugueses. Estou a falar de pessoas que vêm de fora, que são antissistema, contra a Igreja. Aliás, penso que isso se passou em Cracóvia, nas JMJ.
Por isso é que nós temos acompanhado de forma muito estreita…
Mas há esse receio?
Todos os receios que são definidos pelas forças e serviços de segurança – e particularmente pelo SIS, a quem compete fazer a avaliação da ameaça – são avaliados e depois também é analisado o grau de risco, feito de forma estática e dinâmica pelos serviços competentes. Daí a importância de termos criado aqui o Centro de Coordenação e Controlo Estratégico, que também tem o Centro de Cooperação Policial. A vantagem do sistema é que cruzamos tudo o que chega da intelligence, do sistema de informações com aquilo que vem da cooperação policial da Europol. Nós vamos ter aqui uma unidade móvel da Europol, e da Interpol, o que chega dos nossos parceiros, para além da Europol e Interpol, tudo o que chega na cooperação que cada força e serviço tem pelos seus parceiros na Europa, na América Latina, em África. E nessas preocupações são obviamente contempladas o terrorismo islâmico, o terrorismo de matriz ideológica extrema, etc. Essas preocupações referem-se aos movimentos antissistema violentos, um ativismo disruptivo.
Mas neste momento, qual é a maior preocupação? É o terrorismo islâmico, ou os movimentos antissistema?
Penso que é como disse, um nível intermédio. Estamos a olhar para todos eles e temos os sistemas de radares ligados.
Mas essas manifestações radicais, até por causa da pedofilia na Igreja…
Todas elas são acompanhadas. Quando há informação de que pode haver uma dificuldade ou um problema ou uma disrupção grave, nós atuamos.
Mas, supostamente, os cidadãos que se teme que venham fazer as tais manifestações contra o Papa e contra a Igreja, além dos radicais ambientalistas, estão no espaço Schengen e não precisam de autorização especial para entrar em Portugal.
A vantagem da reposição do controlo de fronteiras é precisamente para apertar um bocadinho a malha.
Imagine que sou francês e sou contra o clima. Ninguém me vai mandar parar na fronteira.
No sistema de fronteiras, no sistema terrestre e marítimo, o que há é uma verificação documental, que não é sistemática, mas é seletiva e direcionada. O que é que isto significa? Em função da análise do risco, das informações de que há certos riscos, tomamos as decisões.
Por exemplo, os coletes amarelos estão nessa lista?
Os serviços cooperam muito bem nesse aspeto. E quando é preciso parar um automóvel que está previamente identificado, temos uma cooperação muito forte com Espanha, França e Itália, mandamos parar… Se alguém vem com maus propósitos e pensa que não pode ser parado está muito enganado. Se me pergunta se a malha é perfeita, perfeição só Deus. O que nós pusemos em marcha é o mecanismo de informação e de cooperação policial que junta intelligence, cooperação policial e, obviamente, as redes sociais estão a ser acompanhadas, incluindo aquelas que não são abertas.
Garantem-me que, pelas escutas intercetadas, eles querem despir-se, querem-se colar ao à porta dos Jerónimos, etc.
Devo dizer que temos tido muito boa informação, com o SIS à cabeça. A dor de cabeça principal quando se tem estas funções é sobretudo de preparação, preparação, preparação, prevenção e planeamento. E o que se chama a dor de cabeça do diplomata, que também é sempre planeamento, planeamento.
Disse numa entrevista ao DN que se os nossos serviços de segurança estão fragilizados, os serviços estrangeiros vêm cá fazer o trabalho. É ou não verdade que o sistema de Schengen, na última avaliação que fez a Portugal, diz que o SEF não está a cumprir as determinações europeias e que, provavelmente, vamos ter o Frontex, à semelhança do que acontece com a Grécia, onde polícias europeus ajudam no controlo fronteiriço?
Tenho, entre outras funções, a função de coordenador geral da avaliação Schengen a Portugal, e a avaliação de Schengen, de que fechámos agora o relatório, não conclui isso.
Não vamos ter Frontex, como a Grécia tem? Então os inspetores estão felicíssimos com o que está a passar com o SEF em Portugal?
Não, o que estou a dizer é que houve um processo de reestruturação do sistema de fronteiras e gestão integrada de fronteiras, que foi uma reestruturação que ocorreu na mesma altura em que estamos a fazer a avaliação. Havia também uma fase em que havia algumas incertezas quanto ao modelo que iria ser finalmente estabelecido. Mas o modelo, a partir do momento em que ficou claramente estabelecido, com as funções e as tarefas, entidades que iriam exercer as funções, penso que isso ficou… e foi por isso que também falámos aos avaliadores Schengen e demos o máximo de informação. Não vamos ter problemas em Portugal.
Não vamos ter o sistema Frontex?
Não vamos ter. Todos os países têm a Frontex no sentido que operam com fronteiras e cooperam entre si. Todos os Estados-Membros que fazem parte da Frontex têm cooperação ativa. Nós não vamos ter fronteiras em que tenha que vir a Frontex, enquanto guarda fronteiriça, a desempenhar funções que competem às autoridades nacionais. Isso não. Pelo contrário.
Mas o senhor embaixador é que disse que se os nossos serviços de segurança estiverem fragilizados, os serviços estrangeiros vêm cá fazer o trabalho.
Não, isso era noutro contexto, não era neste. Isso é no contexto que já disse há 20 anos, que era a propósito dos serviços de informações e a questão das interceções nas comunicações. É a questão da situação das comunicações, que os serviços de informações devem ter acesso, porque se não tem acesso às comunicações quando há uma suspeita séria de uma organização terrorista que se está a preparar, que está em desenvolvimento logístico… e o que eu disse já em 2003, e continuo a dizer, é que os serviços de informações têm que ter os meios adequados para desempenhar cabalmente as suas funções. E se um serviço de informações português não tem essa capacidade, o que acontece é que, como na política, não há vazios. Se uma entidade portuguesa não tem essa capacidade, vem para cá uma entidade estrangeira fazer. E, portanto, isso é que foi sempre a minha preocupação. E quando nós desenvolvemos o SIED e a restruturação do SIRP foi precisamente no desenvolvimento de capacidades, da modernização dos serviços, isso tem vindo a acontecer com o SIRP. Agora, na questão dos metadados defendi sempre com o envolvimento de magistrado, quando houver uma intersecção tem que haver um magistrado dedicado, como tem o sistema espanhol, o francês, o italiano, o inglês, como têm todos os países. Essa era a minha posição e continua a ser.
Faço-lhe a pergunta de outra forma. Um inspetor do SEF demorava seis a nove meses a ser formado. Um PSP e um GNR, com todo o respeito, levaram quatro semanas, e o que me dizem é que os homens de Schengen acham que eles não estão a fiscalizar e a atualizar os ficheiros de Schengen, até porque não têm experiência. Depois não há cabinas suficientes nos aeroportos, etc.
Quem está nas fronteiras é o SEF.
A PSP não está lá ainda?
Está lá, mas parece que o SEF deixou de existir e só está lá a GNR e a PSP, e não é verdade.
Os agentes conseguem introduzir os dados todos dos cidadãos fora do espaço Schengen que entram em Portugal?
A qualidade do controlo das fronteiras não desapareceu do dia para a noite. Quem está nas fronteiras são os quadros superiores do SEF, são os inspetores do SEF, que estão lá. O que eles estão a fazer é dar também formação on the spot. Houve uma formação na especialidade, que foi dada de acordo com o currículo obrigatório da Frontex, e já estão a passar dessa formação para uma mais especializada, e isso leva mais tempo. O que acontece é que eles estão a dar a formação também on the spot. É preciso também não esquecer que a PSP esteve em funções até 86, em parceria com a GNR. Há aqui uma espécie de retoma de funções. O SEF não desaparece. As pessoas do SEF não desapareceram, as qualidades e os talentos não desapareceram. O que está a acontecer é que os talentos e as qualidades vão ser passadas. Assim como nas zonas das fronteiras estão a passar informação na investigação criminal, etc. E aí até é mais engraçado, porque na prevenção e investigação criminal havia duas entidades que estavam a trabalhar sobre os mesmos temas, que era o SEF, na parte da imigração ilegal, na parte do tráfico de seres humanos e de crimes conexos com a imigração ilegal, e estava a PJ a fazer também essas investigações. E, já agora, foram tornadas públicas algumas dificuldades por parte do diretor nacional da PJ, não raras vezes veio dizer que faltava a cooperação da parte do SEF. A reestruturação do sistema de fronteiras ganhou dimensão e profundidade. Isto sabendo-se que o SEF está até ao dia 29 de outubro nas fronteiras. E que os inspetores do SEF irão estar a trabalhar nas fronteiras no próximo ano com os da GNR e da PSP.
Isso em 50% da capacidade.
Sim, mas agora ainda ficam a 100%, os 50 é no próximo ano. Mas atenção que a PSP já está nos aeroportos desde junho do ano passado. E a GNR está nas fronteiras terrestres e nas fronteiras marítimas há mais de um ano, com os colegas do SEF. Quando o sistema estiver já consolidado e operacional, vamos ter certamente também Schengen a fazer esta avaliação mais, digamos, em filigrana, ao sistema estruturado. O que posso dizer é uma coisa engraçada. A comissária europeia, e os responsáveis por Schengen, os diretores-gerais, etc., estão muito interessados no sistema comum português. O novo modelo de fronteiras concilia melhor os aspetos de segurança, de articulação de forças, com a separação das questões das fronteiras, a investigação criminal e a questão administrativa e de integração dos migrantes. É, neste momento, um modelo que está a ser acompanhado com interesse, quer pela Comissão Europeia, quer pelos parceiros europeus.
O que se diz é precisamente o contrário. Que não há controlo nenhum, que estão 50 pessoas numa casa em Lisboa e ninguém sabe quem são. O Martim Moniz está como está…
Quem tinha que falar sobre o assunto já se pronunciou. Há aí responsabilidades que não são unicamente dos serviços e forças de segurança.
Sim, também há as juntas de freguesia.
A verificação de documentação, testemunhos que aparecem que são pagos e que estão à porta das juntas de freguesia, etc. São capacidades que têm que se ver. E atenção, o SEF também está em funções até agora. Diria que nessas questões, pelo contrário, o novo sistema vai ajudar a verificar melhor, e nós temos também uma maior articulação com as autarquias, com a Segurança Social. O que nós temos vindo a fazer aqui no Sistema de Segurança Interna, e que temos vindo a pugnar e a incentivar, são áreas que até não são da nossa competência, estritamente falando, que é a articulação de todas as entidades do Estado. O SSI tem ajudado a cruzar informação e já se pode ver alguns resultados também no terreno. Já se começam a ver grandes operações a correr. Não digo que seja autoria do SSI, Deus me livre, estou só a dizer é que nós temos tido mecanismo de sensibilização e mobilização das várias entidades do Estado para estas questões.
Mudando de assunto, a informação que tenho é que os drones que foram comprados para a GNR e PSP não vão poder ser utilizados no Parque Tejo, pois estão na mesma frequência que a aviação comercial. Os drones que vão funcionar são aqueles que a Força Aérea alugou a uma empresa israelita.
Não tenho informação que aponte para esse cenário, até pelo contrário. A informação que tenho é que os equipamentos da PSP estão todos em ordem para funcionar e funcionam bem. Nós estamos a testar…
Então por que razão a Força Aérea teve de alugar drones para a JMJ?
Têm funções diferentes, no sentido que a Força Aérea é a autoridade aeronáutica nacional, tem que garantir o espaço de interdição aéreo. Acompanham a segurança dos grandes eventos através do espaço também de interdição aérea. Tem várias latitudes, longitudes, etc.
Mas os drones da FA vão estar no Parque Tejo e no Parque Eduardo VII.
Não só, a FA tem outros meios, que depois vão estar ligados aqui no Centro Coordenação e Controlo Estratégico. Nós vamos ter essa informação dos drones. Os drones da PSP e da GNR são drones de utilização para os comandos táticos, que lhes permitem ter o visionamento em sítios estratégicos. Esses drones estão lá todos.
Vai estar ao comando de coordenação e controlo estratégico. Vamos imaginar que é preciso mandar abater alguém. Quem dá a ordem? Como sabe, no caso do sequestro do BES de Campolide, houve uma discussão, pois era preciso ligar para o ministro, e por aí fora, até que o comando de Lisboa deu a ordem para abater o sequestrador.
As decisões são tomadas aqui no centro de coordenação.
É o senhor embaixador que as toma?
Se houver uma situação dessas, tem que ser tratado a nível tático e é por isso que há os comandos táticos, que, como eu disse, são comandos conjuntos. Tem várias entidades lá e essa liberdade de ação tática é fundamental. Uma questão de sequestro, o incidente policial tático grave, esse sobe aqui à minha coordenação. E se se houver um ato terrorista, e é para isso que existe um gabinete de crise, nós pomos em prática em o que diz a Lei de segurança Interna, que diz que o gabinete de crise toma a decisão, obviamente, perante a responsabilidade de informar o primeiro-ministro, que terá que informar o Presidente da República, mas as decisões são tomadas aqui com os comandantes, com o diretor-nacional da PSP, o comandante-nacional da GNR, com o diretor-nacional da PJ, com o diretor do SIS. E é por isso que andámos a testar sistemas. Isso está testado. Mas não tenho razões para acreditar que vamos ativar esse gabinete.
Teremos polícias de Espanha, Itália, França, Polónia e Canadá na JMJ. Vão estar fardados?
Tem a ver com os programas de cooperação. A PSP também vai lá fora quando há grandes jogos, a GNR também. Quando estava em Moscovo tive lá uns oficiais da PSP que andaram de cidade russa em cidade russa com o seu uniforme da PSP e os portugueses que estavam a participar dos jogos gostaram muito de os ver e de falar e saber como é que estava a segurança. É sobretudo um tipo de policiamento de proximidade, de comunicação, de visibilidade e acho que tem também um efeito muito positivo.
Qual a razão para não se saber quantos cidadãos, fora do espaço Schengen, foram proibidos de vir à JMJ?
Fizemos um comunicado quanto surgiu essa ideia de que havia muitos inscritos de uma determinada nacionalidade. Nós passámos essa informação dizendo que a Jornada tem várias fases. Entre aquilo que é o número de inscritos iniciais e aquilo que é o número final de inscritos faz uma diferença abissal. E, depois, para além dos países que carecem de um visto Schengen, e dentro desses há uns países que representam algumas áreas de preocupação, porque têm fenómenos, por exemplo, de terrorismo e outras questões que podem ser uma ameaça à segurança, esses têm depois de passar pelo crivo não só do visto Schengen, mas também pelo crivo de segurança. Costumo dizer que às vezes os balões que se incham, incham e depois quando nós vamos ver, não é a montanha que pariu um rato, a montanha pariu uma formiga. Isto é, não deixámos de fazer os inquéritos de segurança e o SEF não tem deixado de fazer essa função, juntamente com o UCAT.
Mas houve muita gente recusada?
Houve muita gente que não concluiu o processo ou que não deu as informações que eram solicitadas ou porque não apresentou a documentação que era necessária.
E porque vocês também estranharam virem muitas de zonas que não são católicas.
Nós estamos com os olhos abertos. Tudo o que se possa estranhar, nós atuamos.
Qual a razão para o protocolo da JMJ ter sido tão atrasado? Quem vai para o palco, etc.
Não tenho essa informação que estivesse atrasado. Não tenho informação nenhuma que exista algum tipo de preocupação. Sei quem está a fazer, temos a articulação com o protocolo de Estado, no caso do Papa. Devo dizer que aqui nós recebemos os gendarmes, Gendarmerie Vaticana, já cá vieram várias vezes, nós também fomos a Roma. Não tenho nenhuma indicação de preocupação quanto a esse respeito. O que posso dizer é que os voluntários passam pelo meu filtro e sobretudo os que vão estar mais perto do Papa, e posso garantir que o filtro foi uma malha apertada.
Há muitos que não se podem aproximar do palco, etc.
Nós não divulgamos as regras, mas a verdade é que dentro da tipologia de segurança nas proximidades são todas elas também estudadas.
Mas depois em Oeiras vão lá estar todos.
Também aí haverá uma atenção a quem estará mais perto e quem não estará.
Acha que o Papa o irá condecorar, à semelhança do que fez na última visita a Fátima, onde condecorou os principais responsáveis policiais e dos serviços de informação?
[risos] Eu vi as fotografias do encontro, sei que o Papa normalmente tem uma palavra a quem organiza. Ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, ao protocolo de Estado, à segurança, à equipa médica… Sei que o Papa tem essa tradição, mas condecoração não, não estou à espera. A única condecoração que gostaria de receber é ver que a Jornada decorreu como uma festa, em segurança, e ver o Papa partir. O Papa, e as entidades que aqui o recebem, os nossos responsáveis da Igreja, os membros do Governo, que saiam daqui a dizer que valeu a pena. Não só do ponto de vista do retorno económico [risos] mas valeu a pena pelo impacto que a Jornada teve na vida de tantos jovens, no impacto que teve nos portugueses, nos lisboetas e não só. Essa é melhor condecoração que posso receber. Estou a falar isto a sério, pois sou católico e recebi naturalmente esta responsabilidade com um sentimento… tenho dificuldade em descrever a palavra, uma responsabilidade a dobrar. Não só porque estou nestas funções, mas também porque gostaria muito que para a Igreja esta Jornada fosse também motivo de celebração, de encontro, de reconciliação. Por ter estado a trabalhar em Moscovo, estando nós a viver uma guerra aqui ao lado na Europa, acho muito importante este reencontro de experiências, de fé em torno daquilo que une os jovens. O Papa é uma força, é uma pessoa que está bem, foi operado há pouco tempo, com uma força extraordinária, e as pessoas pensavam que ele ia ter um programa reduzido, mas ele faz cinco dias de visita a Portugal, é a visita mais longa de um Papa a Portugal. Acho que isto diz muito, claro que é uma responsabilidade muito grande, saber que tudo vai correr bem, que todos os riscos e ameaças estão previstos e prevenidos se ocorrerem, mas é um gosto muito grande. A alegria, costumo dizer, de o diplomata ver o avião com as rodas no ar, a partir, mas com uma pessoa muito contente lá dentro e com os que estão cá a despedir-se igualmente satisfeitos. O trabalho principal eu acho que é este. A execução, obviamente, tem sempre a importância das forças táticas e a informação que circula dos comandos táticos para os comandos operacionais metropolitanos e para o comando é estrategicamente muito importante. Estamos aqui no terraço da águia, mas essa é a minha melhor satisfação. Essa é a minha melhor condecoração. Já tenho várias condecorações que me foram dadas, mas nunca olhei muito para as condecorações, esta é mesmo só ver chegar ao dia 6. E depois tirar uns dias de férias, se alguém permitir!