Pode a monarquia constitucional resistir?

Na Espanha de 2023, como em Portugal em 2015, o correto e saudável era que os vencedores governassem e as oposições se dedicassem ao escrutínio leal e permanente das políticas aplicadas pois isso é tão útil como o exercício do poder em beneficio dos cidadãos.

Impedir que o vencedor ganhe perturba a democracia», afirmou o líder do PP espanhol durante a recente campanha eleitoral.

Nuñez Feijóo parece ter previsto o que efetivamente veio a acontecer ou seja uma vitória clara mas não suficiente para conseguir uma investidura tranquila.

A vitória do PP, incontestável na prova dos números, é contestada pelo PSOE de Pedro Sánchez que manifesta o direito de ser investido como primeiro-ministro de Espanha.

Com a democracia espanhola praticamente dividida ao meio entre aquilo que se convencionou chamar ‘direita e esquerda’, embora em cada um dos blocos se alojem partidos de ideologia contraditória, a situação não parece ser fácil.

A obsessão de Pedro Sánchez em manter um poder que, por decisão maioritária efetivamente perdeu, não tem paralelo na história da democracia do país e só poderá ser concretizada com o apoio de pequenos partidos de base regional que albergam assassinos da extinta ETA ou independentistas declarados que se referem depreciativamente aos restantes cidadãos da nação como ‘os espanhóis’.

Neste caso o preço a pagar será demasiadamente pesado e não deixará de ter reflexos negativos na unidade da Espanha e na credibilidade da monarquia constitucional que é o seu cimento.

Este perigo foi compreendido por alguns dos mais importantes líderes históricos do PSOE (com Filipe Gonzalez à cabeça) que se tem desdobrado em afirmações, procurando incutir algum bom senso no espírito e na consciência dos atuais mandantes partidários.

 

É curioso como estes arranjinhos de base ética muito discutível, mas inegavelmente prejudiciais para o futuro das democracias ibéricas, parece estarem a ser a regra da vida política na Península.

Em Portugal, em 2015, o partido de António Costa, transformou, através da chamada ‘geringonça’, uma derrota clara e, dadas as circunstâncias, humilhante, numa conquista de poder que já dura há oito anos, com consequências nefastas para o desenvolvimento económico e social do país.

 

Em Espanha não será (se for) a ‘geringonça’ (pois a soma do PSOE com o Sumar não chega) mas uma coisa muito pior que os analistas políticos já apelidam de Governo Frankenstein pois irá ‘pescar’ aos setores mais podres da política espanhola, com custos elevados, os deputados necessários para manter o poder e o controlo das instituições.

Lá como cá, o espaço que ainda existe entre ‘democracia liberal’ e autocracia fica, com estas soluções, cada vez menor, o que é um alerta para os cidadãos conscientes e um aviso claro para o futuro da própria União Europeia.

Dirão os ingénuos que isto é a democracia a funcionar; afirmarão os preocupados e os informados que se sabe sempre como estas espertezas começam mas nunca se alcança como efetivamente terminam.

Na Espanha de 2023, como em Portugal em 2015, o correto e saudável era que os vencedores governassem e as oposições se dedicassem ao escrutínio leal e permanente das políticas aplicadas pois isso é tão útil como o exercício do poder em beneficio dos cidadãos.

Envolvidos nas eleições do país vizinho (quantos minutos dedicam as TVs espanholas às eleições portuguesas?) quase não se discutiram dois dos acontecimentos mais relevantes da política portuguesa das últimas semanas: o Estado da Nação e a reunião do Conselho de Estado.

 

Da sessão parlamentar sobre o Estado da Nação não saiu qualquer resposta para as dúvidas que os portugueses mantém e, nomeadamente, não foi definido qualquer rumo consequente e coerente para o futuro do país.

Soube-se, à margem, que o PRR (a bazuca que ia salvar os portugueses) não estará a correr bem e o melhor será a colagem à Espanha no pedido de prorrogação do prazo limite (2026) para a aplicação deste instrumento de política económica.

O Governo torturou os números, vangloriou-se com a estabilidade política (é um fim em si mesmo?) e, claro, impôs a sua narrativa.

A oposição porque não sabe, não tem, não pode ou não a deixam (o papel da Comunicação Social é determinante) foi incapaz de desmontar essa narrativa e de apresentar uma alternativa compreensível.

Sintomática da inutilidade desse debate, é a afirmação do primeiro-ministro (PM) «não quero ouvir», fugindo assim das perguntas incómodas dos jornalistas.

Dificilmente se poderia tratar o Parlamento, logo a democracia, de uma forma mais arrogante e perniciosa.

Mas a reunião do Conselho de Estado, que começou atrasado e acabou antecipado (porque António Costa tinha de ir ao futebol) foi ainda pior pois não houve comunicado, decorreu com escasso debate e não mereceu a honra do contraditório do PM.

 

Depois de tanta parra (Marcelo Rebelo de Sousa falou em fim de ciclo), tão pouca uva (António Costa ignorou) e o que ficou foi só a clara humilhação feita ao PR, aos cidadãos que ainda acreditam nas instituições e aos membros independentes do Conselho que não tiveram coragem para abandonar tão estranho evento.

Neste período também nada se soube do resultado da diligência que os eurodeputados socialistas (comandados por Pedro Marques) terão feito junto de Christine Lagarde, sobre a política monetária europeia. Será que os joelhos da Senhora ficaram a tremer perante a ameaça de tão ilustres figuras?

Entretanto a Reserva Federal Americana anunciou um novo aumento das suas taxas de juro diretoras. Há mesmo dias de azar!