Multidões e paixões!

As críticas sobejaram, sem surpresa, a começar nalguma comunicação social de há muito minada por um esquerdismo doentio, incapaz sequer de perceber que este Papa tem a visão mais progressista de que há memória em qualquer pontificado.

Por Manuel Boto, Economista

1. As Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ) foram um sucesso! Não há outra forma de fazer um rescaldo, dada a evidência da dimensão deste evento que teve o seu ponto alto no Campo da Graça (Parque Expo), com cerca de 1,5 milhões de peregrinos e da indiscutível excelência da organização que propiciou enormes alegrias a tantos jovens e menos jovens que, vivendo apaixonadamente estas JMJ, jamais esquecerão estes dias.

Como habitualmente, em Portugal, há sempre uns ‘velhos do Restelo’, sempre prontos a zurzir em tudo o que possa ser inovador. As críticas sobejaram, sem surpresa, a começar nalguma comunicação social de há muito minada por um esquerdismo doentio, incapaz sequer de perceber que este Papa tem a visão mais progressista de que há memória em qualquer pontificado. Para além disso, nos meses que antecederam as JMJ, houve uns quantos que tudo criticaram, desde os gastos sumptuosos, jamais considerados como investimento, até ao facto de um Estado laico apoiar um evento religioso. 

Sem surpresa, as lutas políticas surgiram, com naturalidade, a dar colorido às divergências, focadas muitas delas em demasiados ajustes diretos como consequência da incapacidade de planear atempadamente diversos concursos públicos. Também nos dias que antecederam a sua realização, muitos questionavam como tudo se terminaria a tempo, enquanto se anunciavam greves em diversos setores, cada qual aproveitando o evento para ‘puxar a brasa à sua sardinha’.

Depois, durante o evento, ao início, ainda longe de vislumbrarem a dimensão do que estaria para acontecer, uns quantos progressistas, convictamente laicos, verberavam o que viam, atónitos e sem compreenderem como tantos se movimentavam em torno de um ideal, ainda por cima religioso, porque ‘os seus estudos não deram para tanto’, formatados como estão a ideias preconcebidas.

E, de repente, tudo se conjugou para fazer destas JMJ um evento memorável, apenas possível pela dimensão, grandeza humana e generosidade humanitária deste Papa Francisco. Os seus discursos inclusivos, a sua humildade e jovialidade contagiante, deixaram um legado que perdurará na nossa memória, tenhamos nós a capacidade de o compreender e assimilar a(s) sua(s) palavra(s) e a sua visão de uma Igreja para o futuro, incentivando os jovens a liderarem os processos de mudança, sem receios nem medos, porque a Igreja «é de todos, todos, todos!».

2.O futebol profissional está de regresso. Um espetáculo de multidões e paixões, na 1ª divisão com as mesmas 18 equipas, sempre com os mesmos candidatos à vitória (Benfica e Porto, este ano com o Sporting à espreita), um candidato a candidato (Braga) e todos os restantes a lutarem ou pela Europa ou para não descerem de divisão. Nada muda!

Mais importante do que melhorar o espetáculo para aliciar novos patrocinadores e incrementar receitas, é manter os equilíbrios de poder, com as tentativas de influência sobre as arbitragens, antes, durante ou depois dos jogos, tentar dominar os Conselhos de Disciplina ou de Justiça, para ‘não sermos prejudicados’, discutir penalties e simulações até à exaustão, com a conivência de uma certa comunicação social a ‘abrir alas’ a todos os dislates que os nossos dirigentes se esforçarão por inventar.

Paulatinamente, vamos descendo nos rankings da Europa, sobretudo desde que apareceu uma Liga Conferência em que os nossos clubes abaixo do 4º lugar demonstram a sua pequenez europeia e dão cabo dos esforços dos grandes (inicialmente o Porto e mais recentemente também o Benfica) que conseguiram, por méritos desportivos, colocarem 2 clubes na Champions. Voltámos a ter apenas 1 e sabe-se lá por quanto tempo isto ficará assim, com todos os efeitos nefastos nas guerrilhas internas a que este ano iremos assistir.

Alguém pensar em reduzir o número dos clubes é sacrilégio! A quem importa que Portugal tenha um PIB per capita dos mais baixos na Europa? Temos é que ter um dos campeonatos maiores porque sim, porque demonstra, para umas quantas cabeças iluminadas, a grandeza do nosso futebol, mesmo que muitos dos clubes ditos profissionais tenham enormes dificuldades de cumprir pontualmente as suas obrigações com os jogadores. Escasseiam as receitas, o patrocínio nas camisolas já teve melhores dias, continua a ser a televisão a salvar a tesouraria de demasiados clubes pela falta de dimensão das massas associativas, como se verifica pelo vazio das bancadas.

Agora discute-se a centralização dos direitos desportivos e, como era de esperar, os grandes barafustam porque gerando 70% das receitas (ou mais) não querem ser prejudicados. Para que isto aconteça e sem ter acesso privilegiado a números, garantidamente que o ‘bolo’ atual teria de mais do que duplicar. Eu sei que existirá a convicção de que isso vai acontecer, até por acesso a novas plataformas de difusão dos jogos, mas será que sem mudanças estruturais na organização e incremento real da competitividade, isso será viável? Acham mesmo que num jogo entre o clube X e o Y (fora dos 4 maiores) alguém vai pagar para ver espetáculos de qualidade inferior?

Lamento, mas não há outra forma de o dizer: há clubes a mais na 1.ª divisão (como na 2.ª divisão)! Ou seja, as ligas profissionais albergam clubes ‘semiprofissionais’, quando não mesmo ‘amadores’. Mas, como ninguém quer mudar, presumo que na Federação e na Liga Profissional se considera que este futebol nacional, como ele está estruturado, tem futuro. Ou então, sabem que se tentarem mexer em algo que implique a redução dos clubes, a única certeza que têm é que serão destituídos, pelo que o melhor, mesmo, é conviver com a realidade deste chocante desequilíbrio.

P.S. – Uma palavra final para o day after das JMJ, com um episódio bem demonstrativo do ambiente político. Costa agradeceu (justamente) o evento à Igreja com um almoço restrito, mas em que poderia (deveria) ter a grandeza de convidar os autarcas de Lisboa e Loures que acolheram as JMJ. No entanto, para estes, bastou um agradecimento verbal (se calhar, por considerar que Moedas, seu adversário político, já tinha tido suficiente palco). Voltámos à realidade!