Os resultados muito pouco promissores de Augusto Santos Silva nas várias sondagens já realizadas sobre putativos candidatos às presidenciais de 2026 está a fazer crescer a convicção entre dirigentes e militantes socialistas de que o partido tem de pensar quanto antes num nome alternativo. Que já existe: o antigo ministro das Finanças de António Costa que se tornou o primeiro depois de Salazar a conseguir superavit orçamental e que é atualmente governador do Banco de Portugal.
A ideia surgiu depois de Mário Centeno ter deixado implícita a possibilidade de abraçar novos desafios, sendo que o governador do banco central já comunicou ao primeiro-ministro – e o ministro das Finanças, Fernando Medina, também já o sabe – que não pretende cumprir mais nenhum mandato no Banco de Portugal.
E tem vindo a ganhar apoios dentro do partido e, sobretudo, entre os seus dirigentes nacionais. Nem todos pelos mesmos motivos, mas todos partindo da constatação de que o partido não pode ficar mais uma vez refém de um candidato perdedor.
De facto, Augusto Santos Silva não descola nas sondagens. Nem mesmo depois de o presidente da Assembleia da República ter vindo a público afirmar a sua disponibilidade para assumir os combates que o partido entender – expressamente admitindo a candidatura às eleições para a sucessão de Marcelo Rebelo de Sousa em Belém – conseguiu subir nas intenções de voto. No Largo do Rato comenta-se que o problema maior de Santos Silva é que, ao contrário do que inicialmente os socialistas julgavam, o seu nome não congrega toda a esquerda e muito menos mobiliza o eleitorado do centro. O que faz com que as hipóteses de uma vitória sejam muito remotas. Sobretudo se o candidato da direita for alguém que com capacidade de penetração no eleitorado de centro-esquerda, como é o caso do almirante Gouveia e Melo.
Para os socialistas, se Paulo Portas é dado como fora da corrida presidencial e Marques Mendes parece ser o adversário desejado – até porque consideram que o facto de o comentador e antigo líder do PSD ter aparecido ao lado de Luís Montenegro no comício da rentrée social-democrata no Pontal o cola demasiado aos ‘laranjinhas’ e à sua atual direção –, o candidato mais temido é mesmo o chefe do Estado Maior da Armada que coordenou com sucesso o processo de vacinação contra a covid-19 durante a pandemia.
Os indicadores na posse dos homens do Largo do Rato revelam que um confronto entre Augusto Santos Silva e Gouveia e Melo é claramente favorável ao almirante, que consegue conquistar eleitorado tradicionalmente socialista, enquanto o presidente da AR tem uma evidente incapacidade de conquistar o ‘centrão’.
E é exatamente por isso que o nome de Mário Centeno tem vindo a reunir cada vez mais apoiantes.
No PS, é unânime que o governador do Banco de Portugal é considerado o não militante socialista de quem os socialistas mais gostam.
Por outro lado, o facto de Centeno ser considerado o pai das contas certas em Governos do PS, alterando um histórico claramente desfavorável ao partido, faz com que o seu nome tenha uma aceitação no centro e no centro-direita que Santos Silva não tem.
Mário Centeno é mesmo considerado o nome mais consensual para uma eventual substituição de António Costa como primeiro-ministro (mas não, obviamente, como líder do partido, uma vez que é independente) num cenário em que o secretário-geral optasse por sair de S. Bento (por exemplo, para ocupar um alto cargo na União Europeia) e o Presidente Marcelo considerasse não existirem condições para a realização de eleições antecipadas.
Em Belém, esta hipótese não é sequer admitida para os próximos tempos (nomeadamente para 2024), uma vez que António Costa já disse que não pretende trocar Lisboa por Bruxelas e cumprirá o seu mandato até 2026.
E se o nome de Centeno é, de facto, apontado como o nome mais indicado para substituir Costa como primeiro-ministro para um período de transição numa qualquer eventualidade futura, há quem no PS chame a atenção para o facto de o partido ter maioria absoluta e, sendo assim, jamais aceitar a indicação de um independente para chefiar o Governo – mesmo tratando-se de um ex-ministro de Estado e das Finanças do atual líder.
Nesse caso, referem, as tropas de Pedro Nuno Santos mobilizar-se-iam de imediato para impedir um ‘assalto ao poder’ que consideram ilegítimo e inaceitável.
Mas ainda que afastem Mário Centeno como reserva de António Costa no caso de S. Bento, mesmo entre os seguidores do mais do que anunciado candidato a secretário-geral do partido há quem veja no governador a melhor alternativa ao nome de Augusto Santos Silva. Desde logo, porque o presidente da AR nunca esteve alinhado com o líder da ala socialista mais à esquerda; depois, porque Pedro Nuno Santos é um assumido defensor de que o PS tem de apresentar um candidato presidencial com potencial ganhador, o que as sondagens até agora realizadas claramente desaconselham que Santos Silva o possa vir a ser.
Consenso no Largo do Rato
A questão de o PS apresentar um candidato com possibilidades de chegar a Belém e acabar com a malapata histórica de não acertar com a estratégia para as presidenciais é, aliás, consensual no partido.
Se Mário Soares e Jorge Sampaio chegaram à Presidência por iniciativa própria e levando o PS a reboque, já todas as outras escolhas do PS nas eleições para a chefia do Estado revelaram-se desastrosas e dividiram os socialistas: mesmo quando José Sócrates resolveu voltar a recandidatar o ‘Velho Leão’ (Mário Soares), desconsiderando outro ‘histórico’, Manuel Alegre, que mesmo assim foi a jogo, acabando ambos por ficar muito aquém do candidato da direita, na altura, Cavaco Silva; ou quando Sampaio da Nóvoa e Maria de Belém dividiram as águas abrindo caminho para o passeio de Marcelo Rebelo de Sousa na sua primeira eleição; ou mesmo nas últimas eleições, em que, não obstante o ‘casamento perfeito’ entre os inquilinos de S. Bento e Belém, ainda assim houve socialistas a defender o apoio do partido a uma candidata marginal e sem qualquer hipótese de sequer beliscar a mais do que certa reeleição do histórico comentador e antigo líder social-democrata, Ana Gomes.
António Costa já disse que não será candidato às presidenciais de 2026. E às legislativas desse ano logo se verá – sendo que essa reflexão, se tudo correr sem sobressaltos até lá, só a terá de fazer quando já souber com quem terá de eventualmente coabitar caso seja recandidato a primeiro-ministro e volta a ser reeleito. Nesse caso, se Santos Silva não tem hipóteses, Centeno poderá ser mesmo a sua melhor solução.