Suecos. Uma febre vinda do frio

Benfica e Sporting estão a apostar em jogadores nórdicos. As primeiras grandes contratações de escandinavos foram para clubes italianos.

Suecos. Também dinamarqueses e noruegueses, mas sobretudo suecos. Um mercado reencontrado pelos clubes portugueses e que, entre nós, começou a ser explorado aquando da chegada de Sven-Göran Eriksson ao Benfica. Nesse tempo, um empresário (também) sueco criou raízes em Portugal: chamava-se Börje Lanz.

Para já são os adeptos do Sporting que estão encantados com o seu sueco: Viktor Einar Gyökeres. O nome não é particularmente sueco mas também não estranhemos. O moço tem raízes húngaras e começou a carreira num daqueles clubes que parecem ter sido inventados de propósito para nos encherem a língua de cãibras – Brommapojkarna. Entrou como um furacão na primeira jornada do campeonato cá do sítio marcando dois golos ao Vizela. Dele, os leões esperam um céu cheio de estrelas.

Desde muito cedo que o calcio atraiu jogadores estrangeiros. Um fenómeno que se deveu ao dinheiro que algumas das grandes famílias italianas (Agnelli, Moratti) começaram a investir nos clubes das suas preferências. O mês de janeiro de 1948 teve um peso especial nessa relação que ficou para a história do jogo inventado pelos ingleses: Gunnar Nordhal assinou contrato com o Milan e passou a ser o primeiro sueco a jogar em Itália. Vinha com fama de grande esfomeado por golos. E trazia o rastilho que provocaria um BUM! bastante significativo. No Hörnefors atingira a marca impressionante de 149 golos em 172 jogos. Filho de uma família de operários nunca soubera verdadeiramente o que era dinheiro, nem mesmo quando passou para o bem mais conhecido IFK Gotemburgo. Em Milão houve muito boa gente que franziu o nariz a esta aposta com algo de misteriosa. Mas caiu no goto da imprensa e no dia em que assinou contrato a Gazzetta dello Sport publicava uma reportagem sobre o homem que marcava golos até de olhos fechados.

Em 1948 ainda se suportavam os custos enormes de uma guerra sanguinária que devastou a Europa. Havia muitas coisas bem mais importantes do que futebol mas também era verdade que os aficionados estavam mais sedentos do que nunca depois de terem passado anos a fio sem bola a sério. Por isso, Nordhal não era um absoluto desconhecido. Era internacional pela seleção da Suécia e, ainda por cima, da que foi muito provavelmente a melhor seleção sueca de sempre – ganharia nesse ano a medalha de ouro no Torneio Olímpico de Futebol disputado em Londres. Ah! E não há como um inglês para julgar, do alto da sua enorme sabedoria futebolística, quem está ou não está na corrida para ser um dos escolhidos, tal e qual como no tempo das Escrituras.

A prenda!

Gunnar Nordhal foi uma prenda. Sim, isso mesmo, uma oferta que deveria sinalizar a paz entre a Juventus e o Milan. E foi Gianni Agnelli, o poderoso fundador da FIAT e dono da equipa de Turim, que foi a Estocolmo de propósito para comprar um jogador digno de ser oferecido ao Milan, clube ao qual Agnelli uns meses antes roubara um dinamarquês de futebol poderoso chamado Johannes Plöger. Enfim, cavalheirismo de um tempo que não volta mais. Se esquecermos, vá lá, que Plöger fora desviado na estação de caminho de ferro de Turim quando viajava numa carruagem que deveria deixá-lo em Milão para firmar contrato com o Milan. Os dirigentes da Juve limitaram-se a metê-lo num carro e rumaram a Turim.

Agnelli deve ter-se arrependido muitas vezes porque Plöger não passou disso mesmo: de Johannes Plöger. E Nordhal foi Nordhal. Os adeptos receberam-no em delírio. «Era um grande homem para lá de um grande jogador», disse dele Gigi Riva, outro dos eleitos. Rapidamente começou a fazer golos em barda: 18 nos primeiros 17 jogos. «Mama mia! Ma che pompiere!». Assim ficou alcunhado: o Bombeiro. Liedholm era Il Barone. E a porta do calcio passou a estar escancarada para os nórdicos, principalmente suecos: o Milan não tardou a juntar os três avançados da seleção sueca, somando Gren e Liedholm a Nordhal. Ficaram para sempre conhecidos por GRE-NO-LI. A febre sueca era de tal forma infecciosa que a Atalanta decidiu contratar dois – Bertil e Nut. Não se sabia grande coisa sobre os novatos. Apenas que eram irmãos de Nordhal. E, por causa disso, tinham estatuto para serem mais dois dos suecos a participarem na Série A num total de 79 ao longo das décadas.

Mas Agnelli não ficaria com as mãos a abanar de suecos. Em 1956 assinou, finalmente, contrato com um: Kurt Roland Hamrin, mais conhecido por Kurre. Infelizmente para Hamrin e para a Juve o casamento não deu certo. Ficou reduzido a 23 jogos e oito golos. Ninguém duvidava da sua qualidade mas foi preciso sair para a Fiorentina para que essa qualidade viesse à superfície. Depois de uma breve passagem pelo Pádova instalou-se nas margens do Arno e vestiu a camisola viola por 289 vezes, registando 150 golos. Em 1967 foi desafiado pelo Milan e não resistiu ao chamado. Não fossem os milaneses tão fortemente ligados aos jogadores vindos da Suécia. Ficou dois anos. Apenas 9 golos em 32 jogos. Nada de muito entusiasmante, mas os adeptos que tinham vivido a glória do GRE-NO-LI já não tinham pachorra para falhanços. Ainda assim, se na Fiorentina venceu a Taça das Taças (1961), no Milan venceu outra vez a Taça das Taças (1968) e a Taça dos Campeões Europeus (1969). Ninguém podia reclamar da fiabilidade sueca.