O desperdício do PS e a demagogia do Chega

Este é um Governo que não tem presente que os setores público e privado são complementares e ambos fundamentais. Querer afirmar a dimensão do Estado, não pela qualidade e pela competência, mas sim pela eliminação ou constrangimentos causados a quem no setor privado consiga melhor, não é inteligente e só pode dar maus resultados.

por Nuno Melo

O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) poderia ser uma ferramenta privilegiada, para que o governo assegurasse reformas estruturais assentes em investimentos estratégicos, que trariam muito mais competitividade à economia portuguesa no futuro. Infelizmente, revela-se todos os dias uma oportunidade perdida.

Direcionado essencialmente para a dimensão pública, o pacote (inicial) de 16.644 mil milhões de euros (13.944 mil milhões em subvenções e 2.700 mil milhões em empréstimos), começou por ser vítima dos preconceitos ideológicos de quem no PS não teve a lucidez de perceber que o setor privado é o principal motor da economia, pela riqueza que cria e os empregos que gera. E agora, comprovada a medíocre execução próxima de apenas 15% e a tipologia dos maiores beneficiários em concreto, o desperdício por incompetência mostra-se digno de caso de estudo.

Divulgada a lista dos contemplados, ficou a saber-se que de 2.5 mil milhões de euros já atribuídos, mais de 70% foram dirigidos para os chamados grandes beneficiários (1 ou mais milhões de euros), sendo que nos primeiros 33 destes há apenas 3 empresas, uma das quais envolvida com o Banco de Fomento e tudo o resto é setor público alargado. Também o PRR acaba assim refém da sanha preconceituosa que transforma dependências em votos.

Este é um Governo que não tem presente que os setores público e privado são complementares e ambos fundamentais. Querer afirmar a dimensão do Estado, não pela qualidade e pela competência, mas sim pela eliminação ou constrangimentos causados a quem no setor privado consiga melhor, não é inteligente e só pode dar maus resultados.

Para disfarçar a incapacidade própria, o PS no Governo quis resolver os problemas na Saúde, na Educação e na Habitação, atirando ideologia para cima do SNS, da escola pública e do mercado de arrendamento, agravando em muito o cenário. António Costa extinguiu parcerias público-privadas transformando hospitais bem geridos em fracassos, acabou com contratos de associação que davam aos mais pobres oportunidades agora só acessíveis aos ricos nas escolas e impôs arrendamentos compulsivos a proprietários da classe média dignos do regime venezuelano. Neste contexto, a solução disparatada que também impôs para a utilização dos milhões do PRR e o desperdício dos fundos, quase soa a coerência.

No contraponto e para ajudar à festa, ficou a saber-se que André Ventura, que diz ser contra a subsidiodependência, depois de já ter proposto um subsídio de 125€ para todos os portugueses, ricos e pobres, durante todos os meses de 2023, assegurando com isso – se o absurdo fosse aprovado – um rombo maior nas finanças públicas do que todo o orçamento do SNS, veio agora defender que o PRR seja transformado em ajudas ao pagamento de rendas, ultrapassando António Costa pela esquerda.

Para o Chega, recursos dos contribuintes que foram atribuídos por uma vez sem exemplo, num pressuposto de utilização em investimentos para incremento da economia, devem ser reconvertidos em subsídios.

Em vez da possibilidade da utilização do PRR em múltiplos modelos que poderiam permitir a construção ou reabilitação de habitações, que aumentando a oferta, encarariam ao menos o fenómeno de um ponto de vista estrutural e potenciariam a redução do valor das rendas, a solução do Chega, só a pensar em votos, passa afinal pela demagogia do rateio em favor dos arrendatários, porventura até à utilização do último cêntimo, ficando tudo na mesma depois.

Defendendo outra vez uma coisa e o seu contrário, André Ventura reforça a vacuidade de um populismo incapaz de protagonizar mínimos do esforço reformista de que Portugal precisa.

Evidentemente, um partido assim também não é alternativa verdadeira a coisa nenhuma.