Cada um com a sua Agenda…!

Este assumir de uma posição política por parte de Mário Centeno realmente não surpreende a quem andava um pouco mais atento. Desde há semanas que as hostes socialistas andavam já em turbulência, pela constatação de que aquele que desde há muito se apontava com o óbvio candidato às Presidenciais, Augusto Santos Silva, aparenta ser um…

Por Manuel Boto, Economista

Estamos em setembro e felizmente que o tempo está bem mais fresco nestes dias, inclusive chovendo no ‘meu’ Alentejo. A seca era (é) um desespero de quase todos, sobretudo para os que vivem da agricultura. Poucos poços têm água e, a agravar a situação, por toda a parte vão proliferando os olivais intensivos que ’bebem’ muita da que resta. Mas, para já, estas pingas de chuva vão animando os rostos tisnados de quem está habituado às incertezas da meteorologia.

Com o tempo mais fresco, acreditava eu que a rentrée política tivesse menos surpresas que a meteorologia, fosse mais cerebral, talvez até mais pacífica do que se registava nos finais de julho, quando se iniciou a debandada dos políticos para as suas (merecidas) férias. Mas, logo pelos sinais que saíram do Pontal e do Chão de Lagoa (Madeira), festas anuais do maior partido da PSD, e pelas reações do PS aos discursos proferidos, percecionei que o que por aí vinha seria um crispar de relações, que hoje me parecem sem retorno, porque se somam às naturais divergências políticas, enormes tensões pessoais.

Bastou esperar por esta semana e tivemos logo dois acontecimentos de particular relevo. Um artigo de Mário Centeno, a tecer considerandos políticos que claramente exorbitam as suas funções profissionais, mais a mais escritos enquanto Governador do Banco de Portugal (BdP), dado que o elaborou em papel timbrado dessa Instituição. Vamos lá passar por cima da enorme confusão que fica gerada sobre quais as visões do próprio BdP sobre a Economia nacional e vamo-nos cingir ao essencial: quem serve quem? É Mário Centeno a servir com os seus (indiscutíveis) conhecimentos o Banco de Portugal ou este a servir de trampolim para as ambições pessoais do day after do seu governador?
É indiscutível que o Banco de Portugal, por definição, é uma entidade independente do Governo, mas ao lermos este artigo, na prática será mesmo assim? Outra pergunta surge: qual a pista em que de facto Mário Centeno corre: a de governador do BdP ou a de putativo candidato a Presidente da República em 2026? 

Este assumir de uma posição política por parte de Mário Centeno realmente não surpreende a quem andava um pouco mais atento. Desde há semanas que as hostes socialistas andavam já em turbulência, pela constatação de que aquele que desde há muito se apontava com o óbvio candidato às Presidenciais, Augusto Santos Silva, aparenta ser um flop nas sondagens que o PS terá interiorizado. Assim, começou a emergir em círculos socialistas a figura de Centeno como potencial candidato, confirmando este artigo a pouca vontade que ele terá em ser reconduzido na função de governador do BdP. 

Aguardemos os desenvolvimentos, seguramente nada entediantes, até porque Marques Mendes (LMM) igualmente anunciou idêntica intenção, entre frases dignas de um advogado cauteloso, ressalvando a sua candidatura como resultado de um interesse nacional. A ala laranja que andava concentrada no tema da descida dos impostos, sobretudo referindo-se ao IRS e não ao IRC (que do ponto de vista económico teria interesse nacional redobrado), entrou em looping, pelo timing que considera inadequado para as presidenciais, dado que, a curto prazo, o importante é derrotar o PS nas eleições da Madeira e nas Europeias. Mas LMM antecipou-se de forma nada inocente e esteve longe de cometer uma imprudência, apenas colocando o tema em cima da mesa pela incapacidade de a esfera PSD/IL/CDS gerar um óbvio candidato à sucessão de Marcelo (estando Gouveia e Melo à espreita, escudado no seu indiscutível prestígio pessoal e na insatisfação popular perante os políticos).

O outro tema escaldante da semana foi o Conselho de Estado de 5 de setembro e o ambiente gélido em que terá ocorrido, muito por culpa de António Costa. Relembremos que no Conselho anterior de 21 de julho, Costa saiu mais cedo como se um jogo de futebol feminino fosse mais importante que qualquer Conselho de Estado, sobretudo quando tinha umas 36h para chegar à Nova Zelândia, local do jogo. 

Desconhecendo completamente como correu esse Conselho de Estado de julho, acredito que as críticas sobre as políticas governamentais tenham sido contundentes e as posições posteriores de Marcelo, sobretudo no veto à Lei da Habitação, em nada ajudaram. O que é certo é que, segundo o que li, António Costa entrou mudo e saiu calado neste Conselho de há dias, o que, a ser verdade, demonstra uma enorme indiferença, a roçar a hostilidade, perante os restantes Conselheiros, mas sobretudo perante o Presidente Marcelo, o que nada augura de bom.

Não sei se Costa estará excessivamente nervoso perante o novo discurso de Montenegro a ganhar a convicção de poder ser real alternativa ou se o problema resulta de constatar a inépcia de muitos dos seus elementos ministeriais que objetivamente prejudicam a imagem coletiva deste Governo. Não estando os tempos fáceis, com greves à vista em setores nucleares como a Educação, Saúde e Justiça, todos reivindicando legitimamente melhores condições salariais a alguém que sustenta que acabou com a austeridade quando a tem aplicado de forma tão contundente, talvez até objetivamente mais tenaz do que Passos Coelho, a vida perspetiva-se como muito difícil para o Primeiro-ministro que precisa de inovar na cativação do eleitorado, até porque já não tem o apoio público do Presidente Marcelo para o ajudar a tirar ‘coelhos da cartola’.

P.S. – escassas semanas depois de ser anunciado que alguns países tinham cortado com as transmissões de futebol do campeonato português, eis que rebenta uma ‘bronca’ no Dragão que toda a imprensa internacional glosa e reproduz como se, desportivamente, fôssemos um país do 3º Mundo. O problema deste futebol nacional é que o somos mesmo e demasiados comportamentos passam impunes, perante a passividade culposa da Liga e da Federação. Um país que tem tão bons jogadores e treinadores, bem merecia melhor, principalmente melhores dirigentes!