“Mês de Regressos”

por Nélson Mateus e Alice Vieira

Querida avó,

A primeira semana de Setembro foi bem chuvosa. É o mês em que, inevitavelmente, volto às memórias de infância. Mês das vindimas, que me faz voltar ao cheiro da terra molhada e às folhas caídas das parreiras, que pisava enquanto corria pelos campos sempre que visitava os meus avós maternos.

É o mês de regresso às aulas (ao não ter filhos não é um mês de despesas acrescidas), que me faz regressar às memórias de infância, à escola primária, naqueles anos onde a democracia começava a gatinhar. 

Não será, certamente, o mês em que encerramos as nossas memórias de verão, de férias e viagens.

A Bola NIVEA, por exemplo, foi um ícone para várias gerações. Durante décadas, a famosa bola gigante, presente em várias praias de Portugal, foi o ponto de encontro de famílias e amigos. Agora nada disso acontece.

Os vendedores de Bolas de Berlim, nas praias, parecem uma praga e estão a tornar-se insuportáveis. Agora, para além de apregoarem “Olha a Bolinhaaaaa”, andam todos de sineta na mão, imagina. Deixamos o ruído do trânsito da cidade, para ir apanhar com o ruído, insuportável, dos vendedores na praia.

Temos um país lindíssimo, cheio de contrastes culturais, gastronómicos e linguísticos que merece ser visitado ao longo do ano.

Ainda me recordo de quando viajávamos de mapa (de papel) na mão. No final das férias, depois de muito uso, os mapas já estavam tão gastos que, frequentemente, as regiões separavam-se umas das outras. Já para não falar das terras que ficavam nas “dobras dos mapas” e desapareciam. Muitas vezes, eram precisamente o nosso destino.

Agora, com o GPS, a nossa vida está muito mais facilitada.

Embora, no meu caso, isso não seja para ser levado à letra. Mesmo com GPS, Waze e afins, sou menino para me perder.

Quem sai aos seus… verdade querida avó?

Bjs

 

Querido neto,                                                                               

Setembro começou com grandes enxurradas de norte a sul do país. Como não podia deixar de ser, a chuva já começou a fazer estragos. Tanto em Portugal como em Espanha.

Na tua carta falas de diversas memórias de verão, comuns a todos nós. No entanto, quero partilhar contigo uma história, que não sendo uma memória de verão, vais gostar certamente.

A minha amiga Teresa tinha acabado de se divorciar.

Da primeira vez que o filho, pequeno, tinha passado um fim de semana com o pai, quando ela o foi buscar quis saber tudo o que se tinha passado, com quem tinham estado, o que comera, com quem tinha brincado…

Mas logo que ela começa a fazer perguntas, o miúdo não a deixou falar muito e disse:

«Do que eu gostei mais foi da senhora do pai».

Ela ia caindo para o lado.

Ligou logo para o ex-marido.

«Parece impossível! Ainda nos divorciámos há tão poucos dias e já tens outra mulher lá em casa?!».

«O quê? Outra mulher lá em casa? Mas tu estás maluca? Não tenho nenhuma mulher lá em casa, sabes bem que vivo sozinho! Quem te disse esse disparate?».

«Sabes bem que não é disparate nenhum e quem mo disse foi o nosso filho. E até acrescentou que tinha gostado muito dela». «Gostei muito da senhora do pai», foi exatamente isto que ele disse.

O ex-marido perdeu a cabeça.

«Então vamos com ele no carro dar uma volta para ver o que ele diz».

E foram. Meteram-se os dois com o miúdo no carro e decidiram ir dar uma volta até à aldeia onde ambos tinham nascido e onde já não iam há muito tempo.

Então o ex-marido ligou o GPS para ver qual seria o melhor caminho – e logo o miúdo lá atrás a bater as palmas de contente:

«A senhora do pai! Olha a senhora do pai!!».

Até hoje a minha amiga Teresa não esquece a vergonha por que passou…

Por falar em GPS, ainda te podia contar outra história que vivi com o nosso amigo Carlos Alberto Moniz. Mas fica para a próxima.

Bjs